Com a criação das Constituições, surgiu o controle de constitucionalidade, com intuito de arrefecer incompatibilidade de leis infraconstitucionais e tratados, cuja tratativa material demonstrava-se ineficaz em relação à segurança jurídica e à legalidade lato sensu. Nesse sentido, com a promulgação de Constituições rígidas e ortodoxas, iniciaram-se questionamentos a respeito da necessidade de flexibilização da inconstitucionalidade, diante dos desafios constantes para manter a dignidade da pessoa humana, instituída na Declaração de Direitos Humanos. Por conseguinte, estabeleceu-se a inconstitucionalidade progressiva ou a declaração da constitucionalidade em trânsito, com intuito de sustentar normas questionadas dentro do ordenamento jurídico, diante de circunstâncias fáticas sui generis e temporárias. Nessa linha de raciocínio, a questão a ser debatida é o grau de temporalidade de tal medida flexibilizada e sua compatibilização com a segurança jurídica descrita na Carta Magna.
De acordo com o ministro do STF Gilmar Mendes, “torna-se evidente a necessidade da mudança, pois que a nossa Corte Suprema deu um passo significativo rumo à flexibilização das técnicas de decisão no juízo de controle de constitucionalidade, introduzindo, ao lado da declaração de inconstitucionalidade, o reconhecimento de um estado imperfeito, insuficiente para justificar a declaração de ilegitimidade da lei”. Nesse ângulo, entende-se que órgãos como a Defensoria Pública, por exemplo, possuem uma estrutura deficitária em relação à atuação do órgão acusador Ministério Público. Portanto, utilizando-se da tese da norma ainda constitucional, permitiu-se a instituição provisória do prazo em dobro, para os defensores públicos, até que fossem desconstituídos os prejuízos sociais incompatíveis com a isonomia constitucional. Resta descrever que, uma vez cumprida a condição suspensiva de inconstitucionalidade normativa, a lei passa a padecer de vício de inconstitucionalidade, ou seja, há uma transição da constitucionalidade plena para a inconstitucionalidade absoluta, quebrando as barreiras da Constituição ortodoxa e inflexível.
Todavia, para os condizentes com a doutrina do jurista austríaco Hans Kelsin, há grandes questionamentos em relação à segurança jurídica e à supremacia da Constituição, pois é notória a indeterminação em relação a temporalidade da suspensão de tais dispositivos legais, inviabilizando a eficiência nos processos do Judiciário. Para exemplificar esta discussão, pode-se citar o ingresso de tabeliães e notários, permitido por meio de medidas liminares e não por concurso de provas e títulos – fato que coloca em xeque a necessidade de se colocar pessoas nos cartórios, sem se atender aos requisitos constitucionais de ingresso. Nesse sentido, a flexibilização da constitucionalidade, visando a continuidade dos serviços públicos, pode ter causado transtornos para muitas pessoas que se tornaram aptas a adentrar nos Cartórios, por concurso em contraposição aos outros delegatários. Nessa linha de pensamento, após a promulgação da Constituição Federal de 1988, muitas questões ainda estão sub judice e ainda não foram totalmente resolvidas, mesmo com toda a jurisprudência positivada, permitindo ao leitor inferir a necessidade de rediscussão desse ideal de controle de constitucionalidade.
Para finalizar, percebe-se que o tema da inconstitucionalidade progressiva revela certa deficiência na atividade legiferante, diante da evolução cronológica dos fatos jurídicos, permitindo-se concluir que os fatos sociais estão em constantes mutações. Nesse diapasão, pode se questionar o alcance efetivo da declaração da constitucionalidade em trânsito para a inconstitucionalidade absoluta, perpetuando um ciclo de eliminação de normas parcialmente inconstitucionais. Outrossim, é cediço que toda essa discussão nos remete ao apelo aos poderes públicos para evitar a inconstitucionalidade de normas promovendo uma flexibilização, ainda que temporária de leis, com finalidade precípua de manter serviços e atos públicos em prol da sociedade.