Migalhas de Peso

Responsabilidade civil e penal do notário e do tabelião

Este artigo contempla a tese sobre a responsabilidade do Estado e do tabelião em casos pontuais de erros ou omissões. Além disso, contextualiza a independência entre as esferas civil e penal quanto á repercussão e e aos efeitos passivos do delegatório.

3/1/2022

O notarial e o tabelião exercem funções de aconselhamento jurídico e previnem lides, com efeitos de suma importância para a sociedade. Nessa linha de discussão, ao desempenhar inúmeros atos delegados pelo Estado, podem ocorrer erros ou omissões, com repercussões para o usuário do Cartório, havendo portanto necessidade de responsabilização. Por conseguinte, muitos juristas começaram a questionar sobre qual o tipo de responsabilidade deveria ser dado ao tabelião e ao Estado como fiscalizador do serviço público. Nesse sentido, há duas linhas de pensamento a serem delimitadas: o Estado ser responsável integralmente ou subsidiariamente, sendo que  o Tabelião seria responsável regressivamente ou a responsabilidade ser objetiva e integral do cartorário.

Segundo a Constituição Federal de 1988, tanto no Artigo 37 quanto no artigo 236 a responsabilidade dos notários é subjetiva mediante a comprovação de culpa ou dolo. Inicialmente, a celeuma pode ser pautada no  ônus probatório e no polo passivos dos responsáveis. De acordo com o ministro do STF Barroso, tanto o Estado como o tabelião devem responder objetivamente, sendo que este deve responder subsidiariamente e não solidariamente. Nesse diapasão, muitos tópicos de Direito Notarial entram em pauta e tornam a discussão acalorada a respeito de ser o Cartório uma empresa privada ou delegatório de função pública. Se partir do fato que o notário é um empresário, deve responder pelos erros de seus  funcionários e prepostos objetivamente. Entretanto, se promover o ideal constitucional de delegação Estatal, com função pública envolvida, infere-se que o Estado tem o dever de fiscalizar e a omissão é responsabilidade deste.

Outrossim, o TJ/SC, impetrou recurso extraordinário 842846, com repercussão geral, para tentar dirimir os danos causados pelo erro de um notário em uma certidão de óbito. Nesse ângulo, houve a requisição pelo Estado de ação regressiva contra o agente notarial, sob pena de improbidade. Destarte, diante de muitas divergências entre os ministros do STF, foi priorizada a estatalidade dos serviços notariais e registrais e a consequente necessidade de auxílio e fiscalização pelo Estado. Finalmente, a tese firmada por jurisprudência foi “o Estado responde objetivamente pelos atos dos tabeliães e registradores oficiais, que no exercício de suas funções causem danos a terceiros, assentando o dever de regresso contra o responsável, no caso de dolo ou culpa, sob pena de improbidade administrativa."

Ademais, analisando deontologicamente, deve-se acrescentar que o tabelião tem o dever de probidade e ética de seus atos podendo ser responsabilizado civil e penalmente em casos específicos. Nesse contexto, pode responder nessas duas esferas em conjunto ou individualmente. Quando responde civilmente, há perda patrimonial e o efeito é de cunho privado atingindo individualmente. Todavia, quando responde na esfera penal, o bem jurídico tutelado é a moralidade pública - fato que repercute na sociedade como um todo. Em consequência disso, poderá haver perda da delegação em ambos os casos, depois de contraditório e ampla defesa efetivos. Um fato histórico curioso, que pode acrescentar, é que, na Antiga Roma, a ação ou omissão é precedida das duas responsabilidades em conjunto, sem distinção.

Diante do exposto, faz-se mister explanar que tanto o Estado quanto o tabelião exercem funções notórias de planejamento e execução de serviços úteis em prol da sociedade. Quando ocorre um erro, omissão ou negligência, deve haver um justo processo administrativo para averiguar a complexa e difícil responsabilidade passiva. Portanto, mesmo com tantas leis vigentes e a promulgação da própria Carta Magna protegendo a sociedade individual e coletivamente, há muito a se discutir sobre direitos, deveres e responsabilidades dessa atividade notarial.

Joseane de Menezes Condé
Discente de Direito Unimep Piracicaba, cursa aula de redação há 2 anos e é formada em Medicina Veterinária pela Universidade Federal de Minas Gerais. Escreve para o Jornal Gazeta Piracicaba .

Veja mais no portal
cadastre-se, comente, saiba mais

Artigos Mais Lidos

Coisa julgada, obiter dictum e boa-fé: Um diálogo indispensável

23/12/2024

Inteligência artificial e direitos autorais: O que diz o PL 2.338/23 aprovado pelo Senado?

23/12/2024

Macunaíma, ministro do Brasil

23/12/2024

PLP 108/24 - ITCMD - Tributação da distribuição desproporcional de dividendos

21/12/2024

Novas regras para o programa de integridade no âmbito da lei de licitações

21/12/2024