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Reiteração de atestados médicos e o dever do empregador

O empregador poderá somar os atestados, quando decorrentes da mesma doença e apresentados pelo empregado dentro do prazo de 60 dias, conforme artigo 75, § 4°, do RPS - decreto 3.048/99.

23/12/2021

(Imagem: Arte Migalhas)

O presente artigo aborda a reiteração de atestados médicos inferiores a 15 dias e o dever do empregador em pagar. Além disso, esclarece o marco para o encaminhamento do empregado ao INSS para requerimento de benefícios previdenciários e destaca a MP 664/14, – mini reforma previdenciária – convertida na Lei 13.135/15.  

É importante a análise dos incidentes que envolvem a reiteração de atestados médicos inferiores a 15 dias e suas consequências na linha de produção e departamento financeiro das empresas, em razão da ausência de funcionários.

A questão recai sobretudo no departamento de recursos humanos que, em regra, se preocupa apenas com aqueles atestados médicos superiores a 15 dias, desconsiderando o custo e demais consequências em manter um empregado na folha de pagamentos.

O objetivo é saber em qual momento o profissional de recursos humanos poderá encaminhar o empregado, com atestados médicos reiterados ao INSS, a fim de requerer um benefício previdenciário, bem como ter atestada sua capacidade ou incapacidade laborativa.

Para melhor entendimento e lucidez sobre o tema, destacamos a MP 664/14 – mini reforma previdenciária – e suas alterações no tempo. A medida foi convertida na Lei 13.135/15.

Assim, este artigo é um convite para um olhar mais atento aos atestados médicos reiterados, apresentados pelo empregado. Busca-se a redução de custos do empregador, por vezes desnecessários na folha de pagamentos. 

A Medida provisória 664/14 e o prazo para requerimento de auxilio doença

Ao final de 2014, a Presidente da República, Dilma Rousseff editou a Medida Provisória 664, de 30/12/14, uma das minirreformas previdenciárias.

O objetivo da MP 664/14 foi corrigir distorções e ajustar o Regime Geral de Previdência Social (RGPS). Além disso, promover o ajuste fiscal das contas públicas, modificando significativamente importantes benefícios do RGPS, por exemplo, pensão por morte, auxílio-doença, aposentadoria por invalidez e auxílio-reclusão. Também introduziu outras importantes modificações, que desde sua vigência tem afetado a vida de milhões de brasileiros.

Neste artigo, importa saber quais as alterações específicas, acerca do prazo para requerimento de auxilio doença.

A MP 664/14, originalmente, havia alterado o início do auxilio doença, com o seu requerimento a partir do 31º dia de afastamento. Ficaria a cargo da empresa, o pagamento do salário integral do empregado durante os 30 dias. Nessa hipótese, o prazo inicial do auxílio-doença a cargo da Previdência, seria a partir do 31º dia de afastamento. Somente a partir do 31º dia de afastamento, o empregador poderia encaminhar o empregado para o INSS, ocasião em que seria agendada a perícia médica para atestar a capacidade laborativa do segurado para percepção ou não do benefício.

Ocorre que, durante a conversão da MP 664/14 na Lei 13.135/15, não foi recepcionada a regra que estabelecia o pagamento dos primeiros 30 dias por conta da empresa. Em razão disso, voltou a vigência da regra antiga, do art. 60, § 3º, da Lei 8.213/91, que assim dispõe:

“§ 3º. Durante os primeiros quinze dias consecutivos ao do afastamento da atividade por motivo de doença, incumbirá à empresa pagar ao segurado empregado o seu salário integral. (Redação Dada pela Lei nº 9.876, de 26.11.99).”

Com isso, no cenário atual, a regra é que a empresa pagará o salário do empregado apenas nos primeiros 15 dias de atestado. À partir do 16º, ficará à cargo do INSS, de acordo com o art. 60, § 3º, da Lei 8.213/91.

Superado este ponto, remanescem três dúvidas frequentes entre os profissionais de recursos humanos e os próprios empregados segurados.

A primeira, é em relação ao prazo que a empresa possui, para encaminhar o funcionário ao INSS. Nessa hipótese, conforme mencionado no art. 60, § 3º, da Lei 8.213/91, é à partir do 16º dia, que a empresa deve encaminhar o empregado segurado ao INSS. Este é o mesmo entendimento exarado pela doutrina especializada:

“Para o segurado empregado, o auxílio-doença é devido a contar do 16º dia do afastamento da atividade e durante os quinze primeiros dias consecutivos ao afastamento da atividade, incumbira à empresa pagar o salário (art. 60, § 3º, da LB)”.1

A segunda dúvida, é por quanto tempo a empresa está obrigada a custear os vencimentos dos dias afastados, na hipótese em que o empregado apresenta atestados “picados”, mas que somados superam os 15 dias.

Nessa hipótese, aplica-se o artigo 75, §§ 4º e 5º do Decreto-Lei 3.048/992 e art. 276, §§ 3º e 4º da Instrução Normativa nº 45 de 6 de agosto de 2010, do INSS.3

O empregado que apresenta atestado inferior a 15 dias, não poderá ser encaminhado ao INSS, uma vez que não preencheu os requisitos do art. 60, § 3º, da Lei 8.213/91.  Contudo, se o funcionário apresentar novo atestado, no prazo de 60 dias, da mesma causa, os períodos de afastamento serão somados. Caso ultrapasse 15 dias, o empregador deverá encaminhá-lo ao INSS, para perícia médica, a fim de atestar a capacidade ou incapacidade laborativa.

Sendo atestada a incapacidade laborativa, o empregado segurado receberá o auxílio doença do órgão previdenciário. O empregador ficará desobrigado de tal encargo.  

Por exemplo: O empregado apresentou atestado de 10 dias, e retornou a suas atividades laborais no 11º dia. Após 30 dias de seu retorno, apresentou novo atestado de sete dias, da mesma doença.

No exemplo acima, o empregador pode somar os atestados apresentados, os quais totalizam 17 dias de afastamento em um período de 60 dias. Nesse caso, a empresa deve encaminhar o empregado ao INSS para perícia médica e requerimento de auxilio doença.

A terceira dúvida remanescente, é quanto a recusa do empregado a ser encaminhado para nova perícia médica no INSS e sua ausência ao posto de trabalho. Nesse caso, pode ser configurado o abandono de emprego por parte do empregado, em razão sua ausência injustificada, nos termos na Súmula 32 do TST:

Súmula nº 32 do TST: Presume-se o abandono de emprego se o trabalhador não retornar ao serviço no prazo de 30 (trinta) dias após a cessação do benefício previdenciário nem justificar o motivo de não o fazer.

Cabe, ainda, salientar que a hipótese mencionada anteriormente, também se aplica à empregada gestante. Nesse sentido, é o julgado da lavra da Desembargadora Claudia Cardoso de Souza:

RECURSO ORDINÁRIO RECORRENTE: UNIÃO DE LOJAS LEADER S.A   RECORRIDO: LUIZA MARTINS VON CEEHASUL RELATORA: DESEMBARGADORA CLAUDIA CARDOSO DE SOUZA.

EMENTA ESTABILIDADE PROVISÓRIA. GESTANTE. ATESTADOS MÉDICOS SUCESSIVOS. RECUSA EM SER ENCAMINHADA AO INSS. ABANDONO DE EMPREGO. 1) De acordo com o disposto no art. 75, § 4º e 5º do Decreto 3.048/99,  na hipótese do empregado segurado se afastar por período inferior a 15 dias, mas, dentro de um período de 60 dias, voltar a se afastar pelo mesmo motivo,  alcançando a soma dos atestados mais de 15 dias, terá o trabalhador direito ao benefício previdenciário a partir do 16º dia de afastamento, mesmo que descontínuo. 2) Se a trabalhadora gestante apresenta atestados intercalados e sucessivos pelo mesmo motivo, cuja soma dos dias de afastamento, dentro de 60 dias, ultrapassa 15 dias, o empregador poderá encaminhá-la ao INSS para perícia médica. 3) Se comprovada a recusa da reclamante em ser encaminhada ao INSS e o abandono de emprego, não prevalece a garantia de emprego assegurada no art. 10, I, do ADCT.4 (g.n)

Além disso, é importante destacar que o empregado segurado não poderá ser dispensado no período em que estiver gozando o auxílio-doença previdenciário. Assim, assevera Sergio Pinto Martins: “O empregado não poderá ser dispensado pelo fato de estar gozando de seguro-doença ou auxílio-enfermidade”.5

Portanto, conforme explicado, em caso de atestados intercalados ou sucessivos, deverão ser somados os períodos até completar quinze dias, dentro de um período de 60 dias. O segurado passará a ter direito ao auxílio doença, a partir do 16º dia de afastamento. Caberá ao empregador remunerar apenas os 15 primeiros dias de afastamento. É de responsabilidade da Previdência Social a remuneração a partir do 16° dia de atestado.

O empregador poderá somar os atestados, quando decorrentes da mesma doença e apresentados pelo empregado dentro do prazo de 60 dias, conforme artigo 75, § 4°, do RPS - Decreto 3.048/99.

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1 LAZZARI, João Batista, Prática processual previdenciária: administrativa e judicial. 13.ed. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2020, p. 545. 

2 Art. 75. (...) § 4º Se o segurado empregado, por motivo de incapacidade, afastar-se do trabalho durante o período de quinze dias, retornar à atividade no décimo sexto dia e voltar a se afastar no prazo de sessenta dias, contado da data de seu retorno, em decorrência do mesmo motivo que gerou a incapacidade, este fará jus ao auxílio por incapacidade temporária a partir da data do novo afastamento.  § 5º Na hipótese prevista no § 4º, se o retorno à atividade tiver ocorrido antes do período de quinze dias do afastamento, o segurado fará jus ao auxílio por incapacidade temporária a partir do dia seguinte ao que completar aquele período.  

3 Art. 276. (...) § 3º Se o segurado empregado, por motivo de doença, afastar-se do trabalho durante quinze dias, retornando à atividade no décimo sexto dia, e se dela voltar a se afastar dentro de sessenta dias desse retorno, em decorrência da mesma doença, fará jus ao auxílio doença a partir da data do novo afastamento. § 4º Na hipótese do § 3º deste artigo, se o retorno à atividade tiver ocorrido antes de quinze dias do afastamento, o segurado fará jus ao auxílio-doença a partir do dia seguinte ao que completar os quinze dias de afastamento, somados os períodos de afastamento intercalados.

4 TRT 17ª, 2ª Turma, Recurso Ordinário nº 0001734-16.2016.5.17.0005, Des. Rel. CLAUDIA CARDOSO DE SOUZA, j. 29.06.2017, Dje. 12.07.2017.

5 MARTINS, Sergio Pinto, Comentários à CLT, 21.ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2018, p.562.

_____________               

LAZZARI, João Batista, Prática processual previdenciária: administrativa e judicial. 13º ed. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2020. 

MARTINS, Sergio Pinto, Comentários à CLT, 21.ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2018.

PONTES, JUSSARA DA SILVA, A nova roupagem da previdência social: com a Lei nº 13.135/15. Editora: DIALÉTICA, 2020, p.128.

https://www.ampai.com.br/post/2020/07/24/atestado-medico-quando-devo-encaminhar-o-funcionario-ao-inss

https://davisroz.jusbrasil.com.br/artigos/345027971/a-regra-geral-para-atestados-intercalados-ou-sucessivos

http://www.guiatrabalhista.com.br/guia/atestado_medico.htm

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José Ailton Garcia
Advogado, Doutor em Direito Processual Civil, Professor Convidado na Pós-Graduação da PUC SP, do Mackenzie e da Escola Superior da Advocacia ESA OAB. Autor de diversas obras jurídicas.

Raimunda Alves dos Santos
Advogada. Sócia Proprietária no escritório Alves advocacia. Especialista em Direito Processual Civil pela Escola Paulista de Direito. Atuante ativa na advocacia trabalhista.

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