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A criminalização da violência psicológica contra a mulher e seus impactos no âmbito trabalhista

O presente artigo apresenta os possíveis impactos no âmbito trabalhista em relação ao artigo 147-B da lei 14.188 promulgada em julho de 2021 pelo Presidente da República, que criminalizou a violência psicológica contra a mulher.

15/12/2021

(Imagem: Arte Migalhas)

A violência psicológica contra a mulher não passou a existir, sempre esteve presente em nossa sociedade de cultura patriarcal. Vivenciar esse tipo de violência é um ciclo duradouro que gera impactos permanentes na saúde mental da mulher.

No entanto, esse tipo de violência não acontece somente no ambiente de trabalho, pode acontecer no âmbito doméstico que frequentemente é interligado com o delito de lesão corporal que acontece após, ou em conjunto, com a violência psicológica. 

Insta salientar, que foi de extrema relevância jurídica criar uma legislação específica para o crime de violência psicológica contra a mulher, tendo em vista que esse delito tem ocasionado grandes percentuais de vítimas mulheres. 

A violência psicológica contra a mulher pode ser percebida quando afeta no aniquilamento da subjetividade, gerando baixa autoestima, apatia, tristeza, culpa, vergonha, medo, depressão, ansiedade, síndrome de pânico, entre outros.1

A lei 14.188 de 2021 em seu artigo 147-B é muito clara em trazer a seguinte redação:

Causa dano emocional à mulher, que a prejudique e perturbe seu pleno desenvolvimento ou que vise a degradar ou a controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, chantagem, ridicularizarão, limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que cause prejuízo à saúde psicológica e autodeterminação.

Por razões óbvias, esse tipo penal surgiu para proteger a mulher de uma forma mais ampla e acessível. Sabe-se que a violência psicológica se inicia de uma forma lenta e silenciosa que pode incluir ameaças, humilhações, chantagens, cobranças de comportamentos, discriminações e até mesmo a exploração e críticas pelo desempenho no mercado de trabalho.

Por derradeiro, além das circunstâncias descritas alhures, há que se falar que o artigo 147-B da lei 14.188 de 2021 trouxe a criminalização da violência psicológica contra a mulher. Antes, caso a mulher fosse vítima desse crime dentro do ambiente de trabalho era caracterizado como delito de assédio moral que é punido na esfera trabalhista. Com a promulgação da lei de violência psicológica contra a mulher, o indivíduo que praticar esse delito sendo ele empregador ou colegas de trabalho poderá ser punido na esfera penal com reclusão de seis meses a dois anos e multa se a conduta não constituir crime mais grave.2

Ademais, no âmbito laboral é muito comum os empregados serem vítimas do crime de violência psicológica e a maior porcentagem de vítimas são mulheres. Acerca da violência psicológica no trabalho, Cândida Costa menciona o seguinte:

Os comportamentos de violência psicológica mais frequentes relacionam-se à: pressão exagerada para cumprir metas, supervisão constante e rígida, uso de estratégias de exposição constrangedora de resultados e comparação entre membros do mesmo grupo, competitividade para além da ética, avaliação de desempenho focada em resultados, sem valorizar os processos, ameaças de demissão constante, humilhações direcionados para o grupo de trabalhadores diante de resultados abaixo do esperado, forte hierarquia entre outras.3

Assim, nota-se que a violência psicológica prejudica a saúde mental causando consequências negativas a vida profissional e pessoal da vítima.

Nesse cotejo, a lei 14.188 foi um grande avanço para proteger a mulher tanto no âmbito doméstico como no âmbito trabalhista, ainda que vise sua proteção, poderá gerar impactos negativos para sua inserção no mercado de trabalho.

3. IMPACTOS NO MERCADO DE TRABALHO PARA A MULHER:

Ab initio, após a criminalização do delito de violência psicológica contra a mulher houve diversos rumores nas redes sociais sobre os impactos negativos que geraria na contratação do sexo feminino para o mercado de trabalho.

A mulher tem sido colocada em uma posição duvidosa, gerando no empregador dúvidas sobre a sua contração. Além disso, houve comentários de que a mulher poderia usar da lei de violência psicológica para se beneficiar dentro do mercado de trabalho, ou seja, utilizando-se do ônus da prova. O empregador pensa que como a mulher não tem incumbência de provar, ela poderia fazer uma alegação falsa. Antes de mais nada, é necessário saber que é quase impossível produzir prova negativa.

Imperioso destacar que a mulher é vista como vulnerável em razão do seu sexo feminino, tanto é que no mercado de trabalho a mulher enfrenta inúmeros desafios e são vítimas frequentemente de assédio moral e sexual.

Salienta-se que a violência psicológica afeta mais da metade da população, incluindo com maior percentual as mulheres, o que deixa claro a importância de uma lei que pudesse as proteger tanto no âmbito trabalhista como doméstico.4

Atualmente, o mercado de trabalho tem sentido os impactos da pandemia da Covid-19 que gerou muito desemprego. O que causa espanto é o fato de ter gerado um impacto maior para as mulheres, a sua inserção no mercado de trabalho que já era difícil antes da pandemia, agora só está tendo mais complicações. Motivo pelo qual, o empregador deve interpretar a lei de violência psicológica contra mulher como uma proteção ao sexo feminino, tendo em vista que só para ingressar na empresa é uma grande dificuldade e quando é contratada é vítima de diversos crimes incluindo assédio sexual, que prejudica integralmente sua vida profissional e pessoal.5

A respeito das consequências do assédio moral, assédio sexual e até mesmo do novo tipo penal da violência psicológica contra a mulher, Aluska Suyanne menciona:

A coação tende a desenvolver na vítima um desequilíbrio emocional, ocasionado crises de ansiedade e atitudes defensivas que, por vezes, passam a ser vistas como paranoicas. Diante desta rejeição violenta, sentida, mas verbalmente negada, o sujeito passivo tenta, inutilmente, explicar-se. Em meio à pressão, o seu rendimento profissional começar a cair, a sua autoestima desaparece. O empregado, em regra, tarda em acreditar que é vítima de assédio moral, chegando a duvidar se não deu causa àquela situação. Por vezes, suporta a dor em silêncio por necessitar do emprego, mas a submissão diária ocasiona o esgotamento de suas energias psíquicas, o que vem a gerar uma sensação de impotência e fracasso.6

Por óbvio, não se nega, que o empregador deseja um empregado que não falte de serviço e que não precise de licença, mesmo previsto esses direitos em lei muitos cumprem sem gostar. Se a mulher não for vítima de assédios e violência psicológica, a tendência é ela não precisar se ausentar do trabalho, pois vítimas desses delitos costumam desenvolver quadros de depressão, síndrome do pânico e pensamentos suicidas que necessitará de um tratamento contínuo.7

É de fundamental importância que o empregador receba a lei de violência psicológica dentro de sua empresa com portas abertas, para proteger as mulheres ali presentes e preservar a sua saúde mental.

___________

BRASIL. [Constituição (1988)]. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília, DF: Presidência da República, [2021]. Disponível aqui. Acesso em: 14 out. 2021.

BRASIL. Lei  14.188, de 28 de julho de 2021. Disponível aqui.

COSTA, Cândida da. Humilhação e violência psicológica de trabalhadores. 2013, São Luís, disponível aqui. Acesso em: 18 mar. 2021).

DOS SANTOS, Douglas Ribeiro. Violência psicológica agora é crime. Migalhas, 01 ago. 2021. Disponível aqui. Acesso em: 12 out. 2021.

CHAVES, Gabriela. Mulheres são mais afetadas na pandemia com desemprego e acúmulo de tarefas. Disponível aqui.

MACÊDO, Ana Lívia. Violência doméstica e familiar afeta saúde mental da mulher. UFPB, 29 set. 2020. Disponível aqui. Acesso em: 12 out. 2021.

SILVA, Aluska Suyanne Marques da. Assédio Moral no ambiente de trabalho. Orbis: Revista Científica, v. 2, n.1. Disponível aqui. Acesso em: 14 set. 2021).

_________

1 MACÊDO, Ana Lívia (apud Hildevânia Macêdo). Violência doméstica e familiar afeta saúde mental da mulher. UFPB, 29 set. 2020. Disponível aqui. Acesso em: 12 out. 2021.

2 BRASIL. Lei 14.188, de 28 de julho de 2021. Disponível aqui.

3 COSTA, Cândida da. Humilhação e violência psicológica de trabalhadores. 2013, São Luís, disponível aqui.Acesso em: 18 mar. 2021.

4 CÂMARA, Bárbara. 2020. Pesquisa revela predomínio de violência psicológica contra mulheres. Disponível aqui.

5 CHAVES, Gabriela. 2020. Mulheres são mais afetadas na pandemia com desemprego e acúmulo de tarefas. Disponível aqui.

6 SILVA, Aluska Suyanne Marques da. Assédio Moral no ambiente de trabalho. Orbis: Revista Científica, v. 2, n.1. Disponível aqui. Acesso em: 14 set. 2021.

7 CASTRO, Paula Drummond; BERGAMINI, Cristiane. 2017. Violência psicológica tem difícil diagnóstico e causa danos graves. Disponível aqui.

Isabela Ketry de Andrade Magalhães
Graduanda de Direito no Centro Universitário UNA de Betim/MG e atualmente estagiária no IPREMB (Instituto de Previdência Social do Município de Betim).

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