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O decreto nº 4.937 e o reajuste de preços de medicamentos

Em 29.12.2003, o Presidente da República expediu o Decreto nº 4.937, a fim de regulamentar a Lei nº 10.742, de 6.10.2003, bem como “para estabelecer os critérios de composição de fatores para o ajuste de preços de medicamentos.”

6/2/2004

O decreto nº 4.937 e o reajuste de preços de medicamentos

 

José Alexandre Buaiz Neto*

 

Em 29.12.2003, o Presidente da República expediu o Decreto nº 4.937, a fim de regulamentar a Lei nº 10.742, de 6.10.2003, bem como “para estabelecer os critérios de composição de fatores para o ajuste de preços de medicamentos.”

 

Como se sabe, a Lei nº 10.742 é o resultado da conversão, em Lei, da Medida Provisória nº 123, de 27.6.2003 (“MP nº 123”), que juntamente com o Decreto nº 4.766 e as Resoluções CMED nºs 1 e 2, todos de 27.6.2003, estabeleceu um novo “marco regulatório” para o Setor Farmacêutico .

 

Dentre as diversas alterações criadas, inclusive com a substituição da Câmara de Medicamentos – CAMED pela Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos – CMED, a MP nº 123 e a Lei nº 10.742 estabeleceram um “modelo de teto de preços” a fim de substituir a “fórmula paramétrica” para reajuste de preços de medicamentos, que vigorava até então com fundamento na Medida Provisória nº 2.063, 18.12.2000, posteriormente convertida na Lei nº 10.213, de 27.3.2001.

 

Nos termos da MP nº 123 e da Lei nº 10.742, o “modelo de teto de preços” deverá ser apurado com fundamento em três fatores: : (1) um “índice” para ajuste monetário; (2) “um fator de produtividade”; e (3) “um fator de ajuste de preços relativos intra-setor e entre setores” . Portanto, o Decreto nº 4.937 teria, por objetivo, esclarecer os critérios a serem utilizados para a composição de tais fatores.

 

No que diz respeito ao “índice” a ser aplicado para o reajuste de preços de medicamentos, o Decreto nº 4.937 apenas reitera, como não poderia deixar de ser, a aplicação do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo - IPCA, calculado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, conforme estipulado na MP nº 123 e na Lei nº 10.742. Como apontado à época da edição da MP nº 123 , não há na MP 123/03 ou no Decreto 4.766/03 qualquer justificativa para a escolha do IPCA como um dos três pilares do “modelo de teto de preços”.

 

Por sua vez, o Decreto nº 4.937 estabelece que o “fator de produtividade” que integra o “modelo de teto de preços” deverá ser apurado “a partir da estimativa de ganhos prospectivos de produtividade da indústria farmacêutica”, determinando, contudo, que tais “ganhos prospectivos de produtividade” serão definidos anualmente pelo Conselho de Ministros da CMED .

 

Desse modo, ao pretender definir o “fator de produtividade”, o Decreto nº 4.937 não o esclarece, mas apenas delega poderes ao Conselho de Ministros da CMED para tratar do tema. Permanece, assim, a preocupação sobre como deverá ser definido o “fator de produtividade”, que nos termos da Lei nº 10.742, é “o mecanismo que permite repassar aos consumidores, por meio dos preços de medicamentos, projeções de ganhos de produtividade das empresas produtoras de medicamentos.”

 

De forma semelhante, o Decreto nº 4.937 também trata do “fator de ajuste de preços relativos intra-setor e entre setores” sem esclarecer de forma definitiva como deverão ser apuradas as “parcelas de tal fator referente ao ajuste de preços relativos entre setores e intra-setor”. Como no caso do “fator de produtividade” a definição do “fator de ajuste de preços relativos intra-setor e entre setores” também é delegada ao Conselho de Ministros da CMED.

 

Especificamente no que tange à “parcela do fator de ajuste de preços relativos entre setores”, o Decreto nº 4.937 limita-se a reiterar o que já consta na Lei nº 10.742, ou seja, de que tal parcela só se aplicará ao reajuste de preços de medicamentos “se os custos a que se refere o citado dispositivo legal não tiverem sido recuperados pelo cômputo da variação do IPCA.” Por sua vez, em relação à “parcela do fator de ajuste de preços relativos intra-setor”, o Decreto nº 4.937 apenas indica que ela será aferida “com base no poder de mercado em cada mercado relevante do setor farmacêutico”, sem estipular parâmetros para a definição de tais “mercados relevantes”.

 

Mais uma vez reiterando o que já consta da Lei nº 10.742, o Decreto nº 4.937 registra que o primeiro reajuste de medicamentos com fundamento no novo “modelo de teto de preços” será aplicado em 31.3.2004 e tomará por base (i) “o preço fabricante do medicamento em 31.8.2003”; e (ii) “o IPCA acumulado no período de setembro de 2003, cuja publicação se deu em outubro de 2003, até fevereiro de 2004”.

 

Como se percebe, o Decreto nº 4.937 ateve-se à definição dos fatores a serem considerados para o cálculo do reajuste de medicamentos a ser aplicado com base no “modelo de teto de preços” previsto na MP nº 123, e na Lei nº 10.742.

 

Assim, o Decreto nº 4.937 delegou, ao Conselho de Ministros da CMED, o poder de definir tais fatores e estipular critérios a serem utilizados para o cálculo dos reajustes a serem aplicados. Resta a expectativa de que o Conselho de Ministros, em face da relevância do congelamento, ou controle, de preços de medicamentos, e da possibilidade de serem aplicadas sanções pelo descumprimento das normas referentes aos ajustes de preços de medicamentos , venha a esclarecer tais critérios, inclusive com a participação do setor econômico envolvido.

 

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* Advogado do escritório Pinheiro Neto Advogados

 

*Este artigo foi redigido meramente para fins de informação e debate, não devendo ser considerado uma opinião legal para qualquer operação ou negócio específico.

 

© 2004. Direitos Autorais reservados a PINHEIRO NETO ADVOGADOS.

 

 

 

 

 

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