Seguindo a tendência social de maior reprovação às infrações ambientais, sobretudo em meio ao atual contexto de instabilidade climática, os tribunais brasileiros têm dispensado tratamento mais rigoroso aos acusados pela prática de crimes ambientais.
Nesse sentido, a título exemplificativo, a aplicação do princípio da insignificância encontra resistência nos tribunais em matéria criminal ambiental, em que pese a existência de julgados em direção contrária do STJ1. Do mesmo modo, também vem sendo dispensada a comprovação do dano efetivo à saúde dos jurisdicionados, bastando a mera potencialidade lesiva para o início da persecução penal, entendimento ao qual vem se filiando, por sua vez, aquela Corte Superior2. Finalmente, o STJ também tem precedentes no sentido de que a prova concludente da existência de dano ambiental não constitui requisito para que presente a justa causa apta a possibilitar o trâmite de ação penal ambiental3.
Assim sendo, também por essas razões, a defesa nos crimes ambientais é desafiadora, na medida em que as ações penais são instruídas com provas documentais pré-constituídas, produzidas unilateralmente pelos próprios órgãos estatais. De modo ilustrativo, é possível citar os laudos periciais elaborados pelos Institutos de Criminalística ou as atuações decorrentes das vistorias realizadas pelos agentes de fiscalização. Como os atos administrativos são dotados de presunção de legalidade e veracidade, na prática, caberá ao próprio acusado comprovar a inexistência de autoria ou materialidade, em que pese a garantia constitucional da presunção de inocência.
No caso de crimes cometidos por pessoas jurídicas, também é comum a inclusão, no polo passivo, de todas as pessoas físicas constantes no quadro societário da companhia, sem a análise da efetiva participação ou do poder fático de gestão do acusado no respectivo departamento da empresa, pleiteando-se a responsabilização de maneira objetiva, unicamente pela posição social ocupada no empreendimento.
Somado a isso, as práticas ambientais ilícitas são pouco evidentes, sobretudo para o empresário, avesso a certas formalidades, ante a baixa harmonia regulatória com o dinamismo da atividade empresarial. Por essa razão, uma eventual imputação pode surpreendê-lo, considerando as dificuldades de representação de certas proibições, como, por exemplo, a emissão de ruídos sonoros em patamares superiores aos permitidos ou o lançamento de certas substâncias químicas nos processos empregados na atividade produtiva. Na verdade, salvo nos casos de reiteração infracional administrativa, figurar como réu em um processo criminal ambiental, em razão de práticas realizadas no contexto de uma atividade econômica lícita, não é uma hipótese representada pelo empreendedor.
Em meio a esse cenário, considerando-se o exíguo espaço para o oferecimento de resistência efetiva em um processo criminal, a atuação preventiva, de modo a monitorar os riscos e adequar as práticas às regras normativas em matéria ambiental, é a solução mais eficiente para evitar imputações por crimes nessa seara, sendo recomendável a estruturação de programas de integridade. Com efeito, a atuação interdisciplinar de um departamento incumbido de adequar as práticas da empresa às normas ambientais vigentes pode evitar a sujeição do empreendimento ao pagamento de multas administrativas, bem como blindá-los dos gravosos danos reputacionais decorrentes de um processo penal, especialmente com a crescente exigência mercadológica de adequação aos padrões ESG (Environmental, social and governance).
Além disso, para equilibrar as forças na construção da hipótese acusatória, afigura-se extremamente útil a tomada de uma posição defensiva logo após a ciência da existência de processo administrativo, de modo a viabilizar a produção de provas pelo próprio autuado, garantindo-se uma melhor compreensão da realidade dos fatos e, eventualmente, minimizando a sanha punitiva estatal.
----------
1 "[...] Esta Corte admite a aplicação do referido postulado aos crimes ambientais, desde que a lesão seja irrelevante, a ponto de não afetar de maneira expressiva o equilíbrio ecológico, hipótese caracterizada na espécie." (STJ, AgRg no HC 519.696/SC, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 21/11/2019, DJe 28/11/2019)
2 "[...] O delito previsto na primeira parte do artigo 54 da lei 9.605/98 possui natureza formal, sendo suficiente a potencialidade de dano à saúde humana para configuração da conduta delitiva, não se exigindo, portanto, a realização de perícia." (STJ, EREsp 1.417.279/SC, Rel. Ministro JOEL ILAN PACIORNIK, TERCEIRA SEÇÃO, DJe 20/04/2018).
3 STJ, AgRg no RMS 63567/MS, Rel. Min REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 10/08/2021, DJe 16/08/2021.