É notório que o Processo Civil Romano serve de paradigma para o Direito Processual Brasileiro abarcando mais de doze séculos de evolução, cuja análise cuidadosa se transpassa na construção, expansão e decadência do poderoso Império Romano. Nessa perspectiva, o Direito Romano objetivava valorizar a lei em relação ao bem da vida, res in iudicium deducta. Por conseguinte, admitiam a indiscutibilidade ulterior de um bem reconhecido pelo juiz com suprema exigência de segurança jurídica. Finalmente, é necessário se contextualizar que para os Romanos a coisa julgada está intrinsecamente atrelada a autoridade Estatal, sem exceções.
Na contemporaneidade, especificamente no Direito Brasileiro, a coisa julgada descrita no NCPC pode ser considerada uma garantia constitucional dos direitos fundamentais na qual muitos doutrinadores a condicionam à inexistência de recursos para impugnação. Nesse contexto, quando há coisa julgada formal, por exemplo, a repercussão é interna no processo, mas quando há a coisa julgada material, a projeção externa-se erga omnes, com expectativa de se atingir o pico da segurança jurídica. Entretanto, a jurisprudência atual permite a percepção do processo único como um fenômeno interligado, cuja coisa julgada formal e a material formam um fenômeno sincrético. Nessa linha de pensamento, a coisa julgada não pode ser considerada um mero efeito de sentença, mas sim uma qualidade desta, permitindo ao leitor a diferenciação entre a eficácia da sentença e a imutabilidade de seus efeitos.
Para demonstrar os aspectos benéficos e práticos da coisa julgada material, deve-se interpretar a hermenêutica da efetividade de um processo com absoluta resolução de mérito na resolução de lides e paz social. Todavia, nem sempre há possibilidade desse tipo de julgamento, pois sentenças terminativas, finalizam os processos, sem julgamentos de mérito. Segundo o jurista Cândido Rangel Dinamarco, "não há garantia sequer, nem mesmo da coisa julgada, que conduza invariavelmente e de modo absoluto à resolução dos valores que elas representam". Explicando melhor, muitos julgados não se encerram com a sentença e podem ser repropostos com intuito de, posteriormente, atacar o mérito.
Outrossim, percebe-se que mesmo quando há coisa julgada material, há mecanismos sui generis de impugnação específica e excepcional para reverter injustiças processuais. Nesse diapasão, cita-se a ação rescisória, a ação anulatória e a ação declaratória de ineficácia ou querela nullitatis insabilis, cuja tratativa viabiliza relativizar a coisa julgada material. Nessa linha de discussão, deve-se fazer uma reflexão a respeito do embate entre a segurança jurídica adquirida com a sentença e a necessidade individual de justiça social assegurada constitucionalmente. Para exemplificar, especificamente, na ação de investigação de paternidade, quando a instrução probatória denota inverdade dos fatos e ocorre a sentença com trânsito em julgado, não há possibilidade de segurança jurídica, pois há interesse individual dos filhos e dos cônjuges na efetiva e justa resolução da lide. Nesse caso específico, há, de acordo com a doutrina, a possibilidade de se impugnar por meio de ação rescisória – fato que confirma a relativização da coisa julgada material. Destarte, quando há proteção de direitos individuais indisponíveis e possível erro no julgamento, protege-se os valores constitucionais em detrimento da segurança jurídica.
Diante do exposto, este artigo visa a instigar o leitor a respeito da dialética necessária ao juiz, diante de situações específicas ocorridas após o trânsito em julgado. Ou seja, o papel do Estado na resolução de lides processuais permite aplicar a lei ao caso concreto, sem contrariar direitos constitucionais. Nesse sentido, o Direito evolui com a história de cada povo e tenta se adaptar às novas demandas de cada época permitindo a reflexão de que a coisa julgada da atualidade sofrerá mutações ao longo dos anos ininterruptamente.