Migalhas de Peso

A nova lei de Recuperação Judicial e Falências

Seus efeitos no âmbito empresarial brasileiro.

22/11/2021

(Imagem: Arte Migalhas)

Entrou em vigor em janeiro de 2021 a lei 14.112/20, que trouxe inúmeras mudanças em relação a lei 11.101/05, ambas tratando da Recuperação Judicial e Falência de empresas.

A lei 14.112/20, que reformou a Lei de Falências foi sancionada pelo presidente no dia 24 de dezembro de 2020 e o projeto que impulsionou a reforma da lei teve início em 2016, e a gestão do projeto teve início com a criação de um grupo de trabalho pelo ministério da Fazenda.

O então projeto de lei foi sendo amadurecido depois por um outro grupo de trabalho, denominado como Grupo Permanente para o Aprimoramento da Insolvência (GPAI), já formado na gestão atual do ministério da Economia, quando o ministro Paulo Guedes foi escolhido para fazer uma revisão e atualização do trabalho anterior, e o deputado Hugo Leal foi escolhido como líder político dessa reforma, conduzindo o projeto dentro das casas do Congresso Nacional, até que no final de 2020 chegou-se a aprovação da versão final da lei, que em 23 de janeiro de  2021 entrou em vigor.

As mudanças e inovações inseridas pela nova lei modificaram significativamente o processo de recuperação judicial e falência.

Sobre as principais mudanças que a alteração da lei trouxe, estas se encontram nos artigos 20A a 20D:

Lei 11.101/05

Art. 20-A. A conciliação e a mediação deverão ser incentivadas em qualquer grau de jurisdição, inclusive no âmbito de recursos em segundo grau de jurisdição e nos Tribunais Superiores, e não implicarão a suspensão dos prazos previstos nesta lei, salvo se houver consenso entre as partes em sentido contrário ou determinação judicial.

Esses trazem um estímulo às negociações extra judiciais, mediação e conciliação, que vão ocorrer nos Centros Judiciários de Cidadania ou em câmaras privadas de negociação e mediação, tendo o Judiciário um toque leve na reestruturação das empresas em Recuperação Judicial, fazendo com que esse procedimento se torne mais acessível e mais célere.

Essa é uma das principais novidades trazidas pela reforma. Esses artigos produzem no direito brasileiro algo que já é tendência mundial, que é a criação de mecanismos de pré-insolvência.

Os mecanismos de pré-insolvência seriam os mecanismos menos burocráticos e mais acessíveis para que as empresas tentem se reestruturar sem a necessidade de ajuizar pedido de recuperação judicial.

Embora a Recuperação Judicial seja um meio eficaz para a reestruturação de muitas empresas, também é um meio muito burocrático e caro, portanto pouco acessível à maioria das empresas nos Brasil, sendo que esse mecanismo da pré-insolvência aborda justamente essa problemática.

Nessa esteira, necessário salientar que o poder Judiciário interfere em apenas dois momentos. O primeiro seria suspendendo as execuções contra os devedores para que eles tenham um espaço de respiro e possam negociar com os credores no prazo de 60 dias, e no segundo momento homologando os acordos feitos entre os devedores e credores.

Sobre os efeitos práticos desses artigos, esses mecanismos de pré-insolvência acabam virando um caminho obrigatório até a Recuperação Judicial chegar ao judiciário. Segundo o ministro do STJ, Moura Ribeiro, a melhor forma de solução da lide é através da composição das partes, devendo ser o Judiciário o caminho alternativo a ser seguido.

Além disso, para o ministro, esses mecanismos servem também para evitar a publicidade, permitindo que o empresário continue exercendo sua atividade sem a circulação de informação desse pré período de recuperação judicial. O dano de imagem é muito menor, senão nulo, para aquela empresa que está utilizando esses mecanismos de pré-insolvência.

Outra importante mudança foi em relação as atribuições do administrador judicial, que com certeza ganhou mais importância depois da alteração da lei.

O administrador judicial ganhou tem mais relevância agora porque a reforma impõe em todos os agentes do processo de Recuperação Judicial e Falência uma conduta mais comprometida em relação aos resultados pretendidos do sistema de recuperação e insolvência.

Quando falamos em recuperação e insolvência, os objetivos do sistema pela utilização dessas duas ferramentas são os mesmos: a preservação dos benefícios econômicos e sociais que decorrem da atividade empresarial, ou seja, a geração de empregos, produtos, serviços, geração de tributos e circulação de riquezas.

Sendo assim, o administrador judicial deve ser agente indutor do atingimento das finalidades da recuperação judicial e da falência, razão pela qual constam na Recuperação Judicial novas atribuições ao administrador, todas elas relacionadas à celeridade do processo, garantias de negociações e negociações de boa-fé, assim é criado um ambiente mais favorável para que a empresa que está em recuperação judicial continue funcionando, e a empresa que está em processo de falência tenha seus artigos remanejados o mais rápido possível.

O administrador judicial passa então a ser uma figura mais importante porque passa a ser o fiador dos bons resultados do processo.

Por fim, um outro destaque da nova lei é o financiamento da empresa em recuperação judicial inspirada no modelo norte americano:

Art. 69-A da lei 11.101/05. Durante a recuperação judicial, nos termos dos arts. 66 e 67 desta lei, o juiz poderá, depois de ouvido o Comitê de Credores, autorizar a celebração de contratos de financiamento com o devedor, garantidos pela oneração ou pela alienação fiduciária de bens e direitos, seus ou de terceiros, pertencentes ao ativo não circulante, para financiar as suas atividades e as despesas de reestruturação ou de preservação do valor de ativos.

O sistema brasileiro não oferecia oportunidade de financiamento às empresas em recuperação judicial, não permitindo assim a entrada de "novo capital" para possível reestruturação da empresa.

Inspirados pelo modelo americano (Deep Financing) foi criado então um financiamento próprio para as empresas em recuperação judicial, que é bem- vindo e bem visto pelo mercado financeiro, por ser um financiamento de baixo risco para o credor interessado, na medida em que o credor que realiza o empréstimo será o primeiro a receber o crédito caso a Recuperação Judicial falhe.

Desse modo, está sendo criado um novo mercado de financiamento no Brasil que pode ser muito promissor, trazendo muitos benefícios econômicos e sociais.

Inclusive essa mudança na lei foi motivo de destaque no último relatório de junho de 2021, emitido pelo Banco Mundial, que reconheceu os avanços da legislação brasileira, destacando principalmente a criação desse financiamento inspirado no modelo norte americano

Essas são as principais mudanças introduzidas pela lei 14.112/20. As alterações visam a transparência, flexibilidade e celeridade no processo de recuperação, visto que são de grande importância, principalmente no atual cenário econômico que o Brasil se encontra, tendo em vista a pandemia do coronavírus.

Maria Luiza Esteves
Colaboradora em Gonçalves e Bruno Sociedade de Advogados- GBSA, graduanda em Direito pela Universidade Presbiteriana Mackenzie.

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