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STF determina a aplicação da lei da prescrição aos tribunais de contas

No âmbito federal a prescrição está regulamentada pela lei 9.873/99 estabelece o prazo de prescrição para o exercício de ação punitiva pela Administração Pública Federal, direta e indireta, e dá outras providências.

18/11/2021

(Imagem: Arte Migalhas)

Para quem não está habituado com o termo, segundo Pontes de Miranda, "a prescrição seria uma exceção que alguém tem contra o que não exerceu, durante um lapso de tempo fixado em norma, sua pretensão ou ação". Em outras palavras, para o exercício do direito à prescrição é necessária a existência de uma pretensão a um direito, o transcurso do tempo e a ação humana, isto é, a inação do titular de uma determinada situação jurídica ativa, posto que o direito não socorre quem adormece.

Pois bem, no âmbito federal a prescrição está regulamentada pela lei 9.873/99, e estabelece o prazo de prescrição para o exercício de ação punitiva pela Administração Pública Federal, direta e indireta, e dá outras providências.

A Suprema Corte, em decisões proferidas no MS 35.412/DF e no MS 32.201/DF, assentou a jurisprudência que aplica-se integralmente nos processos do Tribunal de Contas da União – TCU, o instituto da prescrição de que trata a lei 9.873/99, cujas ementas seguem:

Ementa: DIREITO ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. MULTAS APLICADAS PELO TCU. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA. EXAME DE LEGALIDADE.

  1. A prescrição da pretensão punitiva do TCU é regulada integralmente pela lei 9.873/99, seja em razão da interpretação correta e da aplicação direta desta lei, seja por analogia. STF. MS 32.201- DF. Relator: MIN. ROBERTO BARROSO. Primeira Turma. DJulg: 21/03/2017. (grifou-se);

E,

Ementa: AGRAVO REGIMENTAL EM MANDADO DE SEGURANÇA. PRETENSÃO PUNITIVA DO TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO. TOMADA DE CONTAS ESPECIAL. PRESCRIÇÃO. OBSERVÂNCIA DA LEI 9.873/99. SUBSISTÊNCIA DA DECISÃO AGRAVADA. AGRAVO A QUE SE NEGA PROVIMENTO.

  1. As razões do agravo regimental são inaptas para desconstituir os fundamentos da decisão agravada, que, por isso, se mantêm hígidos.
  2. Excetuados os ressarcimentos de valores perseguidos na esfera judicial decorrentes da ilegalidade de despesa ou da irregularidade de contas, a aplicabilidade de sanções administrativas pelo TCU sofrem os efeitos fulminantes da passagem de tempo, de acordo com os prazos previstos em lei.
  3. Agravo regimental a que se nega provimento. STF. Ag. Reg. em MS 35.512-DF. Relator: MIN. RICARDO LEWANDOWSKI. Segunda Turma. DJulg: 04/06/2019; 

Diante desses julgados do STF e considerando que as competências dos Tribunais de Contas estão estabelecidas na Seção Fiscalização Contábil, Financeira e Orçamentária da Constituição Federal, inclusive com o princípio da simetria que é exigido pelo art. 751, exigindo que as normas aplicadas ao TCU também se apliquem compulsoriamente aos Tribunais de Contas Estaduais, do Distrito Federal e dos Municípios. Como exemplo, cita-se a Súmula nº 01 do TCE-Alagoas, que aduz: o exercício da função sancionatória pelo Tribunal de Contas sujeita-se à prescrição, aplicando-se nesses casos, por analogia, a lei 9.873/99.

No artigo 1º, a lei 9.873/99 estabelece que prescreve em cinco anos a ação punitiva da Administração Pública Federal, direta e indireta, no exercício do poder de polícia, objetivando apurar infração à legislação em vigor, contados da data da prática do ato ou, no caso de infração permanente ou continuada, do dia em que tiver cessado.

Mas, o que mais interessa aos órgãos e entidades que constam no rol de jurisdicionados ao TCE-SP é a prescrição intercorrente, que está prevista no artigo 206-A do Código Civil e no artigo 924, inciso V, do Código de Processo Civil e, regulamentada pelo § 1º do artigo 1º da lei 9.873/99:

§ 1º Incide a prescrição no procedimento administrativo paralisado por mais de três anos, pendente de julgamento ou despacho, cujos autos serão arquivados de ofício ou mediante requerimento da parte interessada, sem prejuízo da apuração da responsabilidade funcional decorrente da paralisação, se for o caso.

Além da matéria já se encontrar sumulada por um Tribunal estadual de Contas, os julgados colacionados a seguir comprovam que o Poder Judiciário também vem aplicando a referida lei e deixando claro que a simples tramitação interna corporis no órgão não interrompe e nem suspende o prazo prescricional:

ADMINISTRATIVO. AUTO DE INFRAÇÃO. IBAMA. AUSÊNCIA DESPACHO OU JULGAMENTO POR MAIS DE TRÊS ANOS. PRESCRIÇÃO. LEI 9.873/99, ART. 1º, § 1º. REMESSA NECESSÁRIA E APELAÇÃO DESPROVIDAS. Tendo sido autuado por infração à legislação específica em 04/06/2002, a sentença, contra a qual se volta o IBAMA, destacou que "da data da apresentação da impugnação pelo Impetrante - 20/06/2002 (fl. 36/45) à data do despacho proferido (fl. 55) - 17/08/2005, decorreram-se mais de 03 anos". O legislador, ao enunciar que "incide a prescrição no procedimento administrativo paralisado por mais de três anos, pendente de julgamento ou despacho", prestigia o princípio da razoável duração do processo (CF/88, art. 5º, LXXVIII). Por "despacho" ou "julgamento", há de se reputar o ato oficial que implique verdadeiro impulsionamento do processo a fim de se chegar a uma solução (decisão) final. Não faz suas vezes simples certidão ou movimentação física dentro da repartição administrativa. Não tendo havido despacho ou decisão em três anos, de rigor reconhecer-se prescrita a pretensão punitiva da Administração, conforme disposto pelo art. 1º, § 1º, da lei 9.873/99. Apelação e remessa oficial desprovidas. (TRF1ª, AC 0025514-21.2009.4.01.3800/MG, rel. convocado juiz federal Evaldo de Oliveira Fernandes Filho, Quinta Turma, e-DJF1 de 20/4/2016 — (nossos destaques);

E,

"O ato de mero impulsionamento ou encaminhamento físico do processo administrativo de um setor para outro não tem o condão de interromper a prescrição intercorrente, pois não configura ato inequívoco que importe apuração do fato infracional.2" (grifou-se)

"O inciso II, do artigo 2º, da lei 9.873/99 fala em ato inequívoco que importe em apuração do fato, natureza que não pode ser atribuída a um mero despacho, sem qualquer cunho decisório." TRF 4ª Região, APELREEX 5012711-95.2013.404.7000, Quarta Turma, Relatora Vivian Josete P. Caminha, DJe. 09.12.2013; (grifou-se) 

E,

RECURSO INOMINADO. DETRAN/RS. OCORRÊNCIA DE PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE NO PROCESSO ADMINISTRATIVO. SENTENÇA MANTIDA. A prescrição intercorrente dos processos administrativos de trânsito vem disciplinada na Lei 9.873/1999, a qual é aplicada em razão de lacuna existente na Resolução 182/2005 do CONTRAN, pois esta previu expressamente somente os prazos para a prescrição punitiva e a executória. De acordo com o artigo 1º, § 1º, da lei 9.873/99, incide a prescrição no procedimento administrativo paralisado por mais de três anos, pendente de julgamento ou despacho, cujos autos serão arquivados de ofício ou mediante requerimento da parte interessada... Sendo assim, diante da ocorrência da prescrição intercorrente, os atos administrativos que tiveram origem no AIT impugnado devem ser igualmente anulados, bem como os seus efeitos. Assim, na forma do artigo 46 da lei 9.099/95 e em atenção aos critérios de celeridade, simplicidade, informalidade e economia processual elencados no artigo 2º da mesma lei, confirma-se a sentença em segunda instância, constando apenas da ata, com fundamentação sucinta e dispositivo, servindo de acórdão a súmula do julgamento. RECURSO DESPROVIDO. UNÂNIME.

(TJ-RS - Recurso Cível: 71009532607 RS, Relator: Mauro Caum Gonçalves, Data de Julgamento: 29/08/2020, Segunda Turma Recursal da Fazenda Pública, Data de Publicação: 03/09/2020)

E, ainda,

APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO ADMINISTRATIVO. PARALISAÇÃO DO PROCESSO ADMINISTRATIVO POR PRAZO SUPERIOR A 3 ANOS. PRESCRIÇÃO ADMINISTRATIVA CONFIGURADA. INTELIGÊNCIA DO ART. 1º, § 1º DA LEI 9.873/99. RECURSO PROVIDO. SENTENÇA REFORMADA. 1. Havendo permanecido o feito administrativo paralisado por período superior ao triênio de que trata o art. 1º, § 1º da Lei nº 9.873/99, mister o reconhecimento da prescrição administrativa intercorrente na espécie, contaminando a multa imposta pelo PROCON. 2. Sentença reformada para, reconhecendo a prescrição, anular a penalidade imposta pela Administração. (TJBA; APL: 00566088820098050001/BA; Relatora: Cynthia Maria Pina Resende; Quarta Câmara Cível; Data de Publicação: 22/01/2014).

Quanto aos Tribunais de Contas, não restam dúvidas quanto à sua natureza jurídica de órgão técnico-administrativo que atuam em auxílio ao Poder Legislativo no exercício do controle externo previsto no artigo 70, caput, da Carta da República.

Não se pode negar que essas decisões do STF chegam para trazer mais segurança jurídica aos órgãos e entidades jurisdicionadas ao TCE-SP, que, comumente, assistem julgamentos dessa Corte de Contas de processos autuados há mais de 5 (cinco) anos, chegando em alguns casos a 10/12 anos de tramitação interna, deixando os jurisdicionados em completa insegurança jurídica.

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1- O art. 75, caput, da Constituição da República contempla comando expresso de espelhamento obrigatório, nos Estados, no Distrito Federal e nos Municípios, do modelo nela estabelecido de controle externo da higidez contábil, financeira e orçamentária dos atos administrativos, sendo materialmente inconstitucional a norma de regência da organização ou funcionamento de Tribunal de Contas estadual divorciada do modelo federal de controle externo das contas públicas. [ADI 5.323, rel. min. Rosa Weber, j. 11-4-2019, P, DJE de 6-5-2019].

2- TRF 4ª Região, APELREEX 5026646-62.2014.404.7100, Quarta Turma, Relatora Vivian Josete Pantaleão Caminha. DJe. 29.02.2016.

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