Migalhas de Peso

Por que não começar pela OAB?

A polarização política vivenciada no Brasil tem se espalhado por todos os setores representativos e eletivos do país.

27/10/2021

(Imagem: Arte Migalhas)

O texto aqui reproduzido não tem por objetivo debater governo ou pessoas, em qualquer nível, muito menos é prestação de contas de alguém que está finalizando mais um mandato ou fazer mea-culpa pelas falhas verificadas, ao longo de 5 gestões. Apesar de receber convites, não disputarei eleições este ano.Isso apequenaria a discussão e não serviria como reflexão.

Não é isso!

O objetivo dos escritos, humildemente, é devolver aos amigos que leram minha última publicação algumas inquietações de um cidadão com 22 anos de uma escolha profissional, casualmente ligada ao Direito e, cuja experiência política, por consequência, se deu em seu órgão de classe. 

A polarização política vivenciada no Brasil tem se espalhado por todos os setores representativos e eletivos do país. Passa pelos pleitos dos mais altos cargos, se reflete por órgãos de classe e chega a disputas de condomínios, até ligas de menores expressões. Tal constatação assombra os ponderados e faz com que muitos assistam aos absurdos praticados lado a lado, em todos esses cenários, atônitos, aguardando a famosa terceira via, que utopicamente fizesse tudo diferente, mas que talvez nunca seja concretizada, justamente por não haver quem tenha a coragem de fazer tudo diferente.

Os cargos almejados são distintos, mas a engenharia é a mesma. E nesse jogo, quanto mais baixo se desce nos cargos, mais vaidades e confusões paradoxalmente se verificam. É o amadorismo, que alimenta as frivolidades.

Em todos os cenários, guardadas as proporções para cada entidade, copia-se tudo que de pior se verifica em campanhas políticas eleitorais e se aprofundam cada vez mais as práticas mais canhestras nos mini reinados, de cada pequeno feudo.

Os que chegam com novas ideias, quando se deparam com a realidade da busca pelo eleitor, logo percebem que para vencer e ter a tal governabilidade, precisam entrar no tal sistema. 

Os experiente avisam logo aos novatos (desavisados), você é romântico demais! Assim você não chega em lugar nenhum! Romper a ordem é muito complicado. Você tem de carregar o piano e bajular. Dar ideias aos que estão na ponta e esperar a sua vez chegar. Para sentar na janelinha e ganhar o jogo, fazendo algo realmente novo, tem de seguir as regras e assim vão enquadrando os que sonham com o ápice da pirâmide de cada mundinho escolhido. A realidade é que não se chega ao fim do jogo! Sempre haverá uma nova fase e quem está na política busca sempre um novo desafio.

Por isso, todos seguem tendo a certeza de que são os mais "limpinhos" criticando os ocupantes dos mais altos cargos eletivos e se esquecem que copiam o mesmo formato, até para seus condomínios. O cargo de liderança normalmente é o de presidente e por isso singular. So há um! Talvez este seja o motivo de seduzir ainda mais. Quem tem a batuta comanda. Manda e desmanda. Não consulta, realiza e depois valida, se for "democrático." É chamado de excelência e se diferencia dos reles mortais, que neste cortejo de tolas vaidades sonha em ser um dia ungido e retirado da multidão, para fazer exatamente tudo igual ao seu antecessor. Passado seu mandato ou mandatos, colocar a foto na parede da galeria dos que ficaram para história como os que se diferenciaram dos comuns.

Tudo isso tem um custo, mas tem um prêmio. Certamente que a dedicação aos interesses do próximo não são sempre o fim a ser perseguido. Tais prêmios devem mover as reuniões de alianças, viagens intermináveis de campanha, investimentos milionários nos processos eleitorais, bajulações e declarações de amor e fidelidade incondicionais ao interesse do seu eleitor. 

Não é interesse deste artigo enveredar-se nesta seara, mas promover a discussão sobre a mudança de perspectiva. Se todos concordamos que esse sistema replicado em todos os recantos e instituições do país já cansaram, há muito, quem tem mais o que fazer e  não aguenta mais corrupção, seja em que nível for, por que não fazermos diferente?

Por que não começar pela OAB? 

A OAB é a experiência mais próxima que tenho da política e como advogado que sou, me pergunto sempre por que não fazermos diferente, já que temos por dever dar voz a sociedade diante das autoridades? Imaginem como seria bom começarmos uma mudança e vermos tudo isso ser replicado para outros órgãos e instituições? Nem que fosse por vaidade!

Algumas sugestões, para tentar contribuir e não somente criticar podem ser apontadas para os que estão na ponta da lança e que podem decidir: Eleições diretas e virtuais para todos os cargos e instâncias da OAB; De uma só vez, acabaríamos com a existência de chapas polarizadas e situação e oposição seriam extintas. Seriam eleitos os mais votados (proporcional e majoritariamente) e assim a vontade da maioria prevaleceria; seria adotado um teto privado para campanha, que se resumisse ao necessário à veiculação das ideias; seriam abolidos comitês, festas e vantagens; seriam abolidas as reeleições para qualquer cargo ou função diretivo; somente ideias e propostas poderiam ser veiculadas como plataformas políticas, estimulando debates propositivos; os cargos de presidente seriam substituídos por um colegiado representativo da classe, que permitisse a cada um dos dirigentes máximos continuar a desempenhar suas funções sem ter de parar 3 anos de suas vidas particulares, em benefício dos inscritos; veículos e regalias seriam extintos e todas as decisões importantes, que concentrassem poder, teriam de ser distribuídas pelos votantes habilitados.

Assim muita sola de sapato, saliva e recursos seriam poupados e os reais interesses democráticos poderiam ser alcançados. Claro que toda mudança nessa linha requer mudanças estruturais, inclusive de legislações e prazos. Também não se sabe se funcionariam na prática ou se surgiriam novos problemas não enfrentados. Contudo, ao menos a discussão sobre o sistema e processo deve ser enfrentada. As dificuldades não podem servir de acomodação, pois seguir num sistema de excelências, polaridade e regalias altamente seletivo e excludente não pode ser o que representa a vontade da maioria.

Aliás, durante muito tempo, as pessoas entregaram aos outros os rumos das instituições por comodismo, indiferença ou desinteresse e deu no que deu.

Não existe mudança sem trabalho de todos! Desistir da política não pode ser uma opção para quem vive em sociedade. O engajamento na comunidade deve ser feito pelos que são corretos e honestos. Afinal, se o bem é comum, o trabalho e fiscalização também têm de ser. Do contrário, aparecerão sempre os predestinados, vocacionados e altruístas, que cuidarão de tudo e farão da política, seja em que setor for, meio de vida de famílias e gerações, mas exigirão sua parte, quase sempre maior do que é devido. 

Antonio Tide Tenório A. M. Godoi
Advogado Criminalista, Procurador do Município de Olinda/PE e Conselheiro Seccional da OAB/PE.

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