Foi publicado em 19/10/21 o decreto 10.839, que regulamenta, no Brasil, os processos administrativos da investigação de existência de subsídios e a aplicação de medidas compensatórias. Também foi revogada a regulamentação anterior1.
Como regra de transição, o novo Decreto define que as investigações e revisões de subsídios e medidas compensatórias que tenham sido protocoladas até o dia 19 de outubro continuarão a ser regidos pela normativa anterior.
Note-se que este novo Decreto estava em negociação há oito anos e o seu objetivo é atualizar e fortalecer o mecanismo de investigação contra subsídios estrangeiros a exportações que afetam a indústria brasileira. Após 26 anos em vigor, o antigo Decreto estava defasado e pouco alinhado com a prática consolidada de investigações de defesa comercial da Subsecretaria de Defesa Comercial e Interesse Público (SDCOM)2, em quem serão concentrados a investigação e as principais decisões relativas ao processo administrativo para imposição de direitos compensatórios, quando se demonstrar que as exportações estrangeiras subsidiadas causam dano à indústria nacional3.
O decreto 10.829/21 atualiza normas procedimentos já utilizados na prática pela SDCOM e detalha conceitos de subsídios com base na jurisprudência construída pela Organização Mundial do Comércio (OMC), relativa às investigações de medida compensatórias. Neste sentido, o Decreto detalha com mais clareza os passos procedimentais e os requisitos a serem cumpridos pela indústria brasileira que pretende se ver protegida contra subsídios nos países exportadores4.
Da mesma forma, o Governo Federal assevera que, com o novo Decreto, haverá maior celeridade e segurança jurídica ao processo investigação de subsídios e medidas compensatórias, reduzindo os prazos de análise das petições e das investigações5. De toda forma, o novo Decreto estabelece também a possibilidade de não-aplicação da medida, como prerrogativa da Câmara de Comércio Exterior (CAMEX), quando constatada motivação de interesse público6. A exceção de interesse público tem sido objeto de críticas constantes da indústria brasileira, mas também será aplicada nos casos de direitos compensatórios.
De toda forma, o novo Decreto poderá facilitar as investigações de subsídios ao melhor delimitar o processo avaliativo da investigação e aproximá-lo à prática da investigação de dumping. O novo Decreto moderniza também a relevância internacional das medidas compensatórias, ao indicar a possibilidade de suspensão de concessões em razão de retaliações autorizadas pela OMC7.
A nova regulamentação, portanto, pode modificar o cenário das medidas compensatórias no Brasil. Recorde-se que, atualmente, há apenas três medidas compensatórias em vigor no Brasil, em comparação às 141 medidas antidumping em vigor. No mundo, a frequência na aplicação de medidas compensatórias pelos membros da OMC tem aumentado, chegando ao pico de 35 medidas aplicadas em no ano de 2019. As medidas pós-pandemia, com estratégias de incentivos às indústrias nacionais e relocalização industrial podem gerar movimentos contra os quais a defesa da indústria brasileira será um imperativo.
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1 Decreto 1.751, de 19 de dezembro de 1995.
2 Atualmente a Subsecretaria de Defesa Comercial e Interesse Público da Secretaria de Comércio Exterior da Secretaria Especial de Comércio Exterior e Assuntos Internacionais do Ministério da Economia.
3 Dec. 10829/21: “Art. 2º As medidas compensatórias poderão ser aplicadas quando a importação de produtos objeto de concessão direta ou indireta de subsídios causar dano à indústria doméstica”.
4 Compare-se, neste sentido, que o novo Decreto é composto por 194 artigos, contra os 88 artigos do Dec. 1751.
5 De acordo com Amanda Athayde, Subsecretária de Defesa Comercial, “a expectativa é que os trâmites sejam encurtados em até um terço”. https://valor.globo.com/brasil/noticia/2021/10/20/decreto-deve-facilitar-reparacao-para-empresa-afetada-por-subsidio.ghtml
6 Art. 4º Em circunstâncias excepcionais, em razão de interesse público, a Câmara de Comércio Exterior poderá: I - suspender a exigibilidade de direito compensatório definitivo ou de compromisso em vigor; II - não aplicar medidas compensatórias provisórias; ou III - homologar compromisso ou aplicar direito compensatório definitivo em valor diferente do recomendado, respeitado o disposto no § 4º do art. 63 e no caput do art. 74.
7 Art. 191. O disposto neste Decreto poderá deixar de ser observado, no todo ou em parte, por decisão da Câmara de Comércio Exterior, em casos em que a República Federativa do Brasil tenha sido autorizada pelo Órgão de Solução de Controvérsias da Organização Mundial do Comércio a suspender concessões ou outras obrigações dos Acordos da Organização Mundial do Comércio.