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Citação preferencialmente eletrônica: Avanço necessário ou atribuição de ônus impossível à parte?

O que não se pode admitir é a alteração da lei de forma prejudicial às partes, atribuindo ônus impossível de ser cumprido, apenas para garantir a manutenção do cadastro atualizado da base de dados dos Tribunais, o que parece ser o caso.

24/9/2021

(Imagem: Arte Migalhas)

No  último dia  26 de agosto deste ano foi convertida em Lei a Medida Provisória de 1.040/21, que trouxe importante modificação do Código de Processo Civil: a citação. A mudança atinge os artigos 238, 246, 247, mas o destaque fica no artigo 246, que estabelece como preferencial a citação por meio eletrônico, com o envio aos endereços  eletrônicos indicados pelo citando no banco de dados do Cadastro Nacional do Poder  Judiciário.  

A possibilidade de citação por meio eletrônico já era prevista no Código de  Processo Civil. No entanto, a partir de agora, a citação, por regra, será feita nesta modalidade, no prazo de até dois dias após a decisão que a determinar, o famoso “cite-se”.  Tal alteração segue um movimento natural dos Tribunais que vinham, desde 2020,  exigindo o cadastramento de empresas públicas e privadas para o recebimento de citação  eletrônica. Um exemplo é o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro que, com exceção das microempresas e empresas de pequeno porte, já vinha realizando a citação por meio eletrônico.  

No entanto, a alteração da lei 14.195/21 unifica a questão, determinando que esta será a modalidade de citação utilizada em regra em todos os Tribunais. A citação  tradicional, por meio da expedição de carta ou mandado, somente será permitida caso não haja a confirmação do recebimento da citação eletrônica no prazo de até três dias úteis.  

Neste ponto temos a polêmica da alteração: cabe ao réu apresentar a justa causa para a ausência de confirmação do recebimento da citação eletrônica, sob pena de ser  reconhecido ato atentatório à dignidade da justiça, com a incidência de multa de até 5% do  valor da causa.  

A alteração confere, portanto, ao Réu a comprovação de justa motivação para a utilização dos meios tradicionais de citação. Claramente se trata de uma prova negativa, que não pode ser atribuída ao réu, tampouco sob pena de reconhecimento de ato atentatório à dignidade da justiça e imposição de multa. 

É evidente que a citação eletrônica é um avanço do procedimento e reflete o tempo em que estamos vivendo. A modernização foi acelerada pela pandemia, que de fato exigiu mudanças substanciais e necessárias para a “razoável duração do  processo”, estabelecida no inciso LXXVIII, do artigo 5º da Constituição Federal. 

O que não se pode admitir é a alteração da lei de forma prejudicial às partes,  atribuindo ônus impossível de ser cumprido, apenas para garantir a manutenção do cadastro  atualizado da base de dados dos Tribunais, o que parece ser o caso.  

Thais Pessini
Sócia do FAS Advogados - Focaccia, Amaral e Lamonica Advogados.

Marina Rocha Farias
Sócia do FAS Advogados - Focaccia, Amaral e Lamonica Advogados.

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