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Imunidades tributárias das entidades religiosas na legislação pátria em face ao Direito Comparado dos países latino-americanos

O presente estudo pretende dissertar acerca das imunidades tributárias das entidades religiosas no ordenamento jurídico do Brasil.

23/8/2021

(Imagem: Arte Migalhas)

O Estado promove a arrecadação de recursos financeiros em forma de tributos, os tributos são receitas derivadas.

De acordo com a doutrina, bem como entendimento jurisprudencial, existem cinco espécies tributárias no Brasil, quais sejam: a) impostos; b) taxas; c) contribuições de melhoria; d) empréstimos compulsórios; e) contribuições especiais.

O dever de pagar o tributo independe da vontade do indivíduo, tendo em vista a compulsoriedade da prestação pecuniária.

As imunidades tributárias são limitações tributárias expressamente previstas na Constituição Federal, portanto, o Estado não recolhe o tributo relacionado a essas limitações. Tal imunidade tributária alcança a imunidade religiosa, a liberdade de crença e culto, salvaguardas constitucionais com o objetivo de se retirar quaisquer obstáculos econômicos para a realização de cultos religiosos.

A imunidade tributária em benefício dos templos religiosos é uma garantia constitucional estampada no art. 150, inciso VI, alínea "b" da Constituição da República de 1988, tal previsão abrange os templos de qualquer culto e as diversas formas de expressão de religiosidade.

Essa garantia constitucional coaduna com a ideia de um estado laico que possibilite a livre manifestação religiosa a fim de outorgar imunidades aos templos onde se realizem os respectivos cultos. A teoria adotada em tal garantia constitucional é a do Templo Entidade (teoria moderna), a qual enxerga o templo como uma entidade, seja de qualquer crença ideológica.

Ainda, importa dizer, que as imunidades tributárias têm o condão de serem garantias fundamentais ao contribuinte, bem como limitações constitucionais, ao poder de tributar, tendo uma dúplice natureza jurídica.

A concepção de uma imunidade alcança os diversos credos, inclusive aqueles movimentos religiosos que não têm predominância na sociedade brasileira, portanto, de todo e qualquer tipo.

Tal imunidade está elencada na atual Constituição Federativa brasileira, todavia este entendimento já recebeu diversas interpretações ao longo da história.

No Egito antigo do Faraó Akhenaton1, os templos e seus sacerdotes eram imunes às exações.

Na Idade Média também havia imunidade dos templos de qualquer culto, motivo de desentendimentos entre os papas e reis, já que seu objeto era limitar o poder real.2

Em relação ao Brasil, foi estipulado na Constituição de 1824 a cessação das imunidades, ocasião em que todos deveriam contribuir com as despesas de Estado.

No entanto, existiam diversas leis que concediam isenções às mitras e aos conventos. Durante o período republicano, até 1937, as religiões recebiam proteção de cobrança por meio de legislação ordinária.3

Com o advento da Organização das Nações Unidas, na Conferência de São Francisco, a liberdade de crença foi concebida como direito coletivo, sendo vedado a discriminação entre religiões.4

Ao passo que, no Brasil, em 1946, a imunidade das religiões recebeu um viés constitucional, não necessitando mais de proteção pelas legislações ordinárias.

Em 1948 a liberdade religiosa - elemento intrínseco à prática de qualquer culto - foi prevista na Declaração de Direitos, no art. 5°, VI.5

A Constituição Federal de 1988 consagrou a liberdade religiosa em seu artigo 5°, inciso VI, reforçando a proteção aos cultos e aos locais de sua realização.

Ademais, no artigo 19, I, da CR/88, resta proibido aos entes federativos intervirem na liberdade de crenças.6

Insta frisar, que tal imunidade tributária é uma garantia constitucional em forma de cláusula pétrea, não estando passível de ser suprimida por norma infraconstitucional, nem sequer por emenda constitucional.

Diante da garantia constitucional da imunidade dos templos de qualquer culto, intrinsecamente ligado à liberdade religiosa pode-se assegurar a efetiva garantia aos cidadãos a prática da religião que melhor lhe aprouver, até mesmo de livre iniciativa. Tal garantia trata-se de um direito fundamental, na melhor concepção de um Estado de Direito7, a liberdade religiosa é um direito humano de primeira geração, ou seja, não cabe ao estado intervir em sua prática, devendo, tão somente, assegurar-lá.8

O templo é o local onde são realizados os cultos, relacionados à atividade religiosa. Um local será considerado templo quando nele funcionarem as instalações e existirem as pertenças adequadas à finalidade religiosa ou, ainda, quando forem realizados cultos ou práticas religiosas.

Um templo não precisa ser obrigatoriamente uma entidade eclesiástica, bastando-se, tão somente, que seja um local de culto.

Sendo assim, sua imunidade independe de qualquer entidade eclesiástica ou atividade filantrópica, já que o fundamento por trás da exclusão tributária é a liberdade religiosa9.

Analisando de forma perfunctória outros países do eixo da américa-latina como Argentina, Paraguai, Uruguai, Chile, Colômbia e Venezuela - dada às similitudes brasileiras com estes países -, constata-se:

Na Argentina, não há imunidade tributária. Apesar de haver um vínculo direto, via texto constitucional, com a religião Católica, não traduz isso com qualquer benefício de ordem tributária.10

Já na Constituição da República do Paraguai depreendemos uma laicidade plena do Estado, não havendo qualquer previsão de imunidade11.

Semelhante a legislação brasileira, o Uruguai outorga aos cultos religiosos imunidade tributária.12

Lado outro, na Constituição chilena quanto à imunidade tributária; não há tal previsão.13

Já na Constituição da Colômbia, apesar da previsão da liberdade de culto religioso, também não há qualquer menção à imunidade tributária.14

Porventura, a Venezuela traz como traço distintivo das demais a previsão de garantia de liberdade para a prática da religião e culto, dando a impressão clara de entendê-las como sendo institutos distintos. No entanto, não concede imunidade tributária15.

Ao cabo do presente estudo, explicitou-se como o benefício das imunidades tributárias foi incorporado na legislação nacional em face das entidades religiosas, no alcance de se proteger a prática de quaisquer cultos ou crenças, a chamada liberdade religiosa.

Dissertou ainda, sobre qual foi a teoria adotada pela legislação vigente para conceituação do que seria considerada cultos e templos religiosos.

Por fim, foi elaborado um comparativo entre o Brasil e os outros Estados-Nação que compõem o eixo continental latino-americano, disto, depreendeu-se que, tal imunização tem amparo legal somente no Brasil e no Uruguai, perfazendo-se às exceções à regra.

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1 Faraó da XVIII dinastia do Egito que reinou por dezessete anos e morreu em 1336 ou 1334 a.C.

2 SCHOUERI, L. E. Direito Tributário. São Paulo: Saraiva 2011; p.384.

3 TORRES, R. L. TRATADO DE DIREITO CONSTITUCIONAL, FINANCEIRO E TRIBUTÁRIO. Os Direitos Humanos e a Tributação: RENOVAR 2005. p.250.

4 SCHOUERI, L. E. Direito Tributário. São Paulo: Saraiva 2011.p.385.

5 SCHOUERI, L. E. Direito Tributário. São Paulo: Saraiva 2011.p.250.

6 SCHOUERI, L. E. Direito Tributário. São Paulo: Saraiva 2011.p.387.

7 Uma situação jurídica, ou um sistema institucional, no qual cada um e todos são submetidos ao império do direito.

8 SCHOUERI, L. E. Direito Tributário. São Paulo: Saraiva 2011.p.384

9 SCAFF, F. F. Constitucionalismo, tributação e direitos humanos. Rio de Janeiro: Renovar 2007.p.100.

10 Constituição Argentina - Artigo 2º. "El Gobierno federal sostiene el culto católico apostólico romano".

11 Constituição Paraguaia. Art. 181. "La igualda es la base del tributo. Ningún impuesto tendrá carácter confiscatório. Su creacinón y su vigência atenderán a la capacidad contributiva de los habitantes y a las condiciones generales de la economia del país".

12 Constituição Uruguaia. Art. 4º. "Todos los cultos religiosos son libres en el Uruguay. El Estado no sostiene religión alguna. Reconece a la Iglesia Católica el domínio de todos los templos que hayan sido total o parcialmente construidos con fondos del Erario Nacional, exceptuándose sólo las capillas destinadas al servicio de asilos, hospitales, cárceres u otros establecimientos públicos. Declara, asimismo, exentos de toda clase de impuestos a los templos consagrados al culto de las diversas religiones".

13 Constituição Chilena. Art. 19. Parágrafo 2º. "La Constitución asegura a todas las personas la igualdad ante la ley. En Chile non hay persona ni grupo privilegiados. En Chile no hay esclavos y el que pise su territorio queda libre. Hombres y mujeres son iguales ante la ley.

14 Constituição Colombiana. Art. 19. "Se garantiza la libertad de cultos. Toda persona tiene derecho a professar libremente su religión y a difundirla en forma individual o colectiva.

15 Constituição Venezuelana. Art. 59. "El Estado garantizará la libertad de religión y de culto.". Art. 133. Toda persona tiene el deber de coadyuvar a los gastos públicos mediante el pago de impuestos, tasas y contribuciones  que establezca la ley.

Paulo Cosmo Jr.
Possui graduação em bacharelado em Direito - LAEL VARELLA EDUCACAO E CULTURA LTDA (2020).

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