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As alterações no art. 11 da lei 8.429/92: o ponto de equilíbrio

A fim de preservar a probidade administrativa, respeitando as garantias constitucionais do contraditório e ampla defesa, além do princípio da segurança jurídica, é necessário se chegar a um ponto de equilíbrio.

18/8/2021

(Imagem: Arte Migalhas)

O art.11 da lei 8.429/92 sempre foi um dos pontos de maiores divergências quando tratamos das sanções em razão da prática de atos de improbidade administrativa tendo em vista a vagueza ínsita a sua descrição.

Nesse sentido, a configuração da prática de ato de improbidade administrativa pela violação de princípios traz alguns questionamentos, isso porque, se por um lado há princípios de cunho eminentemente objetiva que implicam uma fácil percepção de sua violação, a exemplo do princípio da legalidade, existem outros, como o princípio da moralidade objetiva que trazem um elevado cunho valorativo em razão de sua subjetividade, o que torna mais árdua a tarefa da caracterização de sua violação quando não vier acompanhada da prática de uma outra conduta também configurada como ímproba.

Dessa forma, muitos autores classificam o art. 11 da lei 8.429/92 como um soldado de reserva, tendo em vista que somente será aplicado na inexistência de uma outra conduta classificada como ato de improbidade administrativa, previstas nos arts. 9º e 10 do diploma legal acima mencionado.

De igual modo, Carlos Ari Sundfeld1 sustenta que a utilização dos princípios como método de interpretação no direito administrativo são bastante esclarecedoras, mostrando-se contrariamente à utilização exacerba dos princípios na referida atividade, especialmente quando aparecem de forma genérica e imprecisa nos textos legais, afirmando que o motivo histórico que justifica tal comportamento está ligado à dificuldade prática do legislador constituinte de elaborar redações mais precisas quando se refere a temas delicados, em razão da ausência de consenso político para a elaboração de definições mais precisas.2

Na mesma linha, e ainda sobre o mesmo tema, o autor afirma que a vagueza do texto trazido no caput do art. 11 da lei 8.429/92, que no momento de sua publicação não foi preocupação dos legisladores, uma vez que transparecia reportar-se a um texto inócuo, no entanto, com o transcorrer do tempo, foi constatado o contrário, tendo em vista que o referido dispositivo passou a ser muito utilizado pelo Ministério Público, especialmente nas situações em que não há fundamentos para um pleito condenatório, baseado nos arts. 9º e 10 do diploma legal em comento.3

Assim, é possível observar que, de fato, havia necessidade de alterações no art. 11 da lei 8.429/92, uma vez que dada sua vagueza poderia vir a resultar na violação das garantias constitucionais do contraditório e ampla defesa, além de trazer instabilidade para as relações.

Nessa direção, a redação do art.11 trazida pelo PL 2505/21 transforma em taxativas as hipóteses de configuração de ato de improbidade administrativa em razão da violação a princípios. No entanto, tal opção do legislador, apesar de tratar de uma opção política, pode não refletir a melhor solução para a celeuma anteriormente exposta, isso porque, o estabelecimento de hipóteses taxativas irá impedir que condutas igualmente ímprobas e passíveis de uma caracterização objetiva acerca da violação de um princípio administrativo sejam punidas como ato de improbidade administrativa.

Dessa forma, a fim de preservar a probidade administrativa, respeitando as garantias constitucionais do contraditório e ampla defesa, além do princípio da segurança jurídica, é necessário se chegar a um ponto de equilíbrio, permitindo-se a possibilidade da configuração de atos de improbidade administrativa por violação a princípios não restritas às previstas no art. 11 do PL 2505/21, desde que sejam criados parâmetros objetivos para sua caracterização.

______________

1 SUNDFELD, Carlos Ari. Direito administrativo para céticos. 2.ed. 2. Tiragem. São Paulo: Malheiros, 2017.

2 “Afinal, para vários assuntos espinhosos a linguagem da Constituição é extra, enquanto o significado do direito à vida nem o legislador conseguir precisar totalmente. E qual a dificuldade? A falta de consenso e de apoio político para textos mais extados com certeza tem algo a ver com isso.” (SUNDFELD, 2017, p. 213).

3 “Esse texto, aparentemente inócuo para inibir comportamentos, por conta da extrema vagueza do que estava se considerando ilícito, acabou servindo, no decorrer dos anos, como fundamento de maior parte das ações de improbidade administrativa propostas pela corporação contra agentes públicos sempre divulgadas amplamente pela imprensa, em busca de apoio da opinião pública. Como forma de aumentar seu poder, a corporação lançou-se em um grande esforço de construção de sentido sobre o texto normativo quase sem conteúdo.”(SUNDFELD, 2017, p. 214).

Acácia Regina Soares de Sá
Juíza de Direito Substituta do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios. Especialista em Função Social do Direito pela Universidade do Sul de Santa Catarina - UNISUL. Mestre em Políticas Públicas e Direito pelo Centro Universitário de Brasília - UNICEUB. Coordenadora do Grupo Temático de Direito Público do Centro de Inteligência Artificial do TJDFT. Integrante do Grupo de Pesquisa de Hermenêutica Administrativa do Centro Universitário de Brasília - UNICEUB. Integrante do Grupo de Pesquisa Centros de Inteligência, Precedentes e Demandas Repetitivas da Escola Nacional da Magistratura - ENFAM.

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