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As inovações do testamento digital e o provimento 100 do CNJ

A sucessão testamentária outorga ao indivíduo maior liberdade na partilha de seus bens e, através das recentes inovações, tem-se a possibilidade de ser realizado de maneira digital.

13/8/2021

(Imagem: Arte Migalhas)

No intuito de proteger o patrimônio dos cidadãos após a sua morte, a legislação brasileira conta com o ramo do Direito Sucessório. Com previsão legal no Livro V, do Código Civil, Sílvio Venosa 1 sintetiza este campo como a área jurídica responsável pela transmissão de bens, direitos e obrigações em razão da morte.

Nos termos do artigo 1789, do Código Civil Brasileiro, a transmissão de bens do falecido pode ocorrer através da sucessão legítima ou testamentária. A primeira, ocorre no caso de inexistência de disposição expressa por parte do falecido sobre seu patrimônio e gera a distribuição de seus bens entre os entes mais próximos. Ao seu turno, a sucessão testamentária, conforme se observa pelo nome, depende da existência de um testamento, no qual o testador define suas preferências na partilha de seus bens.

No que tange à definição doutrinária, Maria Helena Diniz 2 conceitua testamento como “[...] o ato personalíssimo e revogável pelo qual alguém, de conformidade com a lei, não só dispõe, para depois de sua morte, no todo ou em parte, do seu patrimônio, mas também faz outras estipulações.” O procedimento e os requisitos do testamento estão presentes no Livro V, Título III, do Código Civil  e sofrem alterações a depender se é ordinário ou especial.

Dentre os testamentos ordinários, existem o particular, público ou cerrado, sendo o público, em razão de seu procedimento, o que proporciona maior segurança jurídica ao testador.

Ocorre que, mesmo proporcionando maior liberdade na transmissão dos bens, o testamento não é um hábito comum pelos brasileiros que ainda optam, na maioria das vezes, pela sucessão legal, cuja ordem consta do artigo 1829, do Código Civil, a saber:

“I - aos descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente, salvo se casado este com o falecido no regime da comunhão universal, ou no da separação obrigatória de bens; ou se, no regime da comunhão parcial, o autor da herança não houver deixado bens particulares; II - aos ascendentes, em concorrência com o cônjuge; III - ao cônjuge sobrevivente; IV - aos colaterais.”

Vale destacar que nos dias atuais, vive-se a pandemia da Covid-19, que elevou o número de mortos em todo o mundo, o que leva a sociedade a uma constante reflexão acerca da morte e, consequentemente, sobre as características e vantagens de um eventual testamento.

Ainda neste sentido, destaca-se que, as medidas de distanciamento social decretadas em razão da pandemia da Covid-19 muitas vezes restringem o deslocamento dos cidadãos para alguns estabelecimentos, tornando mais difícil a realização de alguns serviços que anteriormente exigiam a participação presencial dos interessados. Com efeito, no caso do testamento público, por exemplo, o artigo 1864, do Código Civil, prevê a necessidade de atos a serem realizados exclusivamente em caráter presencial, como a escritura da vontade do testador por tabelião ou seu substituto legal em livro de notas, a leitura em voz alta para o testador e duas testemunhas seguidas da assinatura dos presentes.

Diante da problemática exposta, o Conselho Nacional de Justiça publicou em maio de 2020, o Provimento 100 do CNJ, o qual institui o “E-notariado” como uma ferramenta dos brasileiros para realizar diversos serviços de maneira remota. Neste entendimento, ressalta-se o artigo 29, do Provimento, que garante aos atos notariais eletrônicos a constituição de um instrumento público para todos os efeitos legais.

Um exemplo da aplicação prática do sistema citado acima está no procedimento de divórcio, cujos casos consensuais agora podem ser realizados de maneira exclusivamente online através do sistema 'E-notariado', inaugurando a possibilidade da realização de diversos outros serviços online.

No caso do testamento, a possibilidade trazida pelo Provimento 100, de realizar uma videoconferência notarial é capaz de suprir a presença física em cartórios para a realização deste procedimento, permitindo que estes sejam realizados de maneira 100% online. Deste modo, possível o preenchimento de todos requisitos legais do testamento público, adaptados para a realização de forma remota.

Ainda, deve-se ressaltar o fato de que a possibilidade de realizar o testamento de maneira online não exclui os outros requisitos do ato, afinal, trata-se de um negócio jurídico unilateral e personalíssimo, cujo testador não estará disponível no momento da abertura da sucessão para dirimir qualquer dúvida. Sendo assim, todas as demais formalidades devem ser respeitadas, quais sejam, a presença de 02 (duas) testemunhas, leitura em voz alta após o término, escritura por tabelião ou substituto e respeito aos limites da parte disponível do testador.

Quanto aos limites da parte disponível ao testador, vale lembrar que de acordo com o direito brasileiro, artigos 1845 e 1846 do Código Civil Brasileiro, o testador somente pode dispor da parte disponível de seus bens, eis que a outra metade é reservada à legítima (herdeiros). Todavia, se o testador não possuir herdeiros poderá dispor da totalidade de seus bens.

Desta forma a sucessão testamentária outorga ao indivíduo maior liberdade na partilha de seus bens e, através das recentes inovações, tem-se a possibilidade de ser realizado de maneira digital.

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1 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil, volume 7 - Direito das Sucessões. 2014

DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: direito das sucessões. v. 6. 22. Ed. São Paulo: Saraiva, 2008.

Giovani Gionédis
Sócio diretor do Pereira Gionédis Advogados. Assessor Parlamentar da Assembléia Legislativa - 1987/1988; Procurador Geral do Município de Curitiba - 1989/1994; Secretário de Estado de Governo do Paraná - 1995/1997.

Paulo Vitor Gonçalves Vieira Kammers
Advogado Associado em Pereira Gionédis Advogados. Graduado em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR). Pós-Graduando em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários (IBET).

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