Migalhas de Peso

A instalação dos novos Centros de Inteligência nos tribunais brasileiros e o crescente debate sobre tratamento e prevenção de demandas repetitivas

A recente criação do Centro de Inteligência do TJ/RJ para monitorar demandas repetitivas não é um evento isolado e particular a esse tribunal. Por força da resolução CNJ 349/20, os tribunais brasileiros estão desenvolvendo seus respectivos centros.

10/8/2021

(Imagem: Arte Migalhas)

No último mês de junho/21, o TJ/RJ noticiou a instalação do seu Centro de Inteligência para identificar e monitorar demandas repetitivas1. O Centro tem por objetivo principal a sugestão de medidas de prevenção e repressão da litigância excessiva e protelatória, a partir do desenvolvimento de ferramentas tecnológicas e da interação entre seus membros, e atuará em parceria com o núcleo de inovação – LABLEXRIO, bem como com o Núcleo de Gerenciamento de Precedentes – NUGEP 2.

Tal medida vem sendo tomada, ao longo dos últimos meses, por diversos Tribunais de Justiça, Tribunais Regionais do Trabalho e Tribunais Regionais Federais em atenção à determinação do CNJ contida na resolução 349/20 3, que prevê o desenvolvimento dessa rede de Centros de Inteligência como uma das providências relativas ao macrodesafio 4 de consolidação do sistema de precedentes obrigatórios, contido na Estratégia Nacional do Poder Judiciário para o período de 2021-2026 (Resolução CNJ 325/2020 5).

Assim, os centros de cada tribunal foram idealizados pelo CNJ, para funcionarem de forma autônoma e estratégica ao lado de uma segunda estrutura, instalada, no âmbito do CNJ, em abril deste ano: o Centro de Inteligência do Poder Judiciário (CIPJ). O CIPJ é formado por um grupo decisório e outro operacional, cujos membros integram, em sua maioria, os Núcleos de Gerenciamento de Precedentes (NUGEP) de diversos tribunais, com o intuito de discutir causas, possíveis soluções e medidas preventivas das demandas repetitivas ou de massa, e combater a judicialização indevida.

Para além do adequado tratamento de demandas repetitivas, os Centros de Inteligência também se prestam a emitir notas técnicas para uniformizar procedimentos internos relativos, por exemplo, a causas de litigância predatória, outro problema real que assola o Judiciário brasileiro. 6 O tema já foi, inclusive, tratado pelo Centro de Inteligência do Juizado Especial do TJ/RN 7, que, em nota técnica, fornece orientações aos magistrados para prevenir a proliferação de demandas fabricadas.

Paralelamente à criação dos centros, para capacitar as diversas unidades judiciárias do país, estão sendo promovidos encontros denominados “caravanas virtuais”, em parcerias entre o CNJ e os tribunais de justiça, a respeito de temáticas relacionadas à própria estruturação dos Centros de Inteligência locais, à gestão de precedentes e, também, às demandas de massa.

O primeiro deles foi realizado em 1º de junho deste ano, com o Conselho da Justiça Federal (CJF), a respeito do tema “A atuação dos Centros de Inteligência no tratamento e prevenção das demandas predatórias em conjunto com os Núcleo de Monitoramento do Perfil de Demandas (Numopedes)” 8. Em seguida, foram realizados encontros promovidos pelo Tribunal de Justiça do Maranhão (TJ/MA) 9, pelo Tribunal de Justiça do Pará (TJ/PA), pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJ/MG) 10 e pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJ/DFT) 11, que contaram com painéis envolvendo a temática de instauração de IRDR e de funcionamento, em suas diversas frentes, do Centro de Inteligência 12. O próximo evento ocorrerá no dia 16 de agosto, pelo STJ, com transmissão pelo seu canal no YouTube 13, a respeito do tema “Demandas previdenciárias e as ações integradas do Centro Nacional de Inteligência da Justiça Federal, do CNJ, do STJ e da Procuradoria-Geral Federal na redução de litígios” 14.

Os Centros de Inteligência dos tribunais são, portanto, mais uma ferramenta para o adequado tratamento da litigância de massa. Sua implementação e funcionamento por meio virtual demonstra, sobretudo nos tempos atuais, que os recursos tecnológicos devem ser cada vez mais utilizados para garantir não apenas a efetivação do sistema de precedentes, mas também a unidade do Poder Judiciário.

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1 Disponível aqui. Acesso em 7.7.2021.

2 Tivemos a oportunidade de tratar do funcionamento dos NUGEPs. Disponível aqui. Acesso em 7.7.2021.

3 A resolução pode ser consultada aqui. Acesso em 7.7.2021. O seu cumprimento por parte dos tribunais pode ser acompanhando pelo Cumprimento de Decisão n. 0009936-78.2020.2.00.0000. Além do TJRJ, após a determinação do CNJ, os seguintes tribunais já criaram seus respectivos Centros de Inteligência: TJAC, TJAL, TJAP, TJBA, TJCE, TJGO, TJMS, TJPI, TJRR, TJRS, TJSC, TJSE, TJTO, TJRN, TJRO, TJMT, TJPA, TJRO, TJPR, TJAM, TJSP, TRF-1, TRF-5, TRT-1, TRT-2, TRT-6, TRT-9, TRT-11, TRT-12, TRT-13, TRT-14, TRT-15, TRT-16, TRT-17, TRT-19, TRT-20, TRT-21 e TRT-22, TRT-23 e TRT-24.

4 Os macrodesafios são metas para o Poder Judiciário para o ciclo 2021-2026, estabelecidas pela Resolução CNJ 325/2020 a partir da consulta pública aos cidadãos, magistrados, servidores, advogados e demais membros da sociedade. São eles: (i) a garantia dos direitos fundamentais, (ii) o fortalecimento da relação institucional do poder judiciário com a sociedade, (iii) a agilidade e produtividade na prestação jurisdicional, (iv) o enfrentamento à corrupção, à improbidade administrativa e aos ilícitos eleitorais, (v) a prevenção de litígios e adoção de soluções consensuais de conflitos, (vi) a consolidação do sistema de precedentes obrigatórios, (vii) a promoção da sustentabilidade, (viii) o aperfeiçoamento da gestão da justiça criminal, (ix) o aperfeiçoamento da gestão administrativa e da governança judiciária, (x) o aperfeiçoamento da gestão de pessoas, (xi) o aperfeiçoamento da gestão orçamentária e financeira, (xii) o fortalecimento da estratégia nacional de TIC e de proteção de dados.

5 A resolução pode ser consultada aqui. Acesso em 7.7.2021.

6 Um exemplo recorrente é a propositura de ações fraudulentas com pedido de indenização por danos morais por suposta negativação indevida, ocorridas no âmbito do Tribunal de Justiça Estado de Minas Gerais (TJMG), que registrou 50.000 (cinquenta mil) processos fraudulentos ou abusivos entre os anos de 2014 e 2018. A repressão à litigância predatória vem sendo objeto de diversas medidas institucionais pelos tribunais de justiça do país, e, recentemente, deu origem ao IRDR 66, no TJMG, em que se discute a possibilidade de o juiz ordenar que a parte anexe aos autos cópias das iniciais de outras ações, envolvendo as mesmas partes, bem como a declaração de autenticidade dos documentos que instruem a inicial, com o intuito de evitar o fracionamento das demandas, a permitir a verificação de litispendência (Processo1213505-93.2018.8.13.0000).

7 Disponível aqui. Acesso em 7.7.2021.

8 O evento está disponível aqui. Acesso em 7.7.2021.

9 O evento está disponível aqui. Acesso em 7.7.2021.

10 O evento está disponível aqui. Acesso em 7.7.2021.

11 Disponível aqui. Acesso em 28.7.2021.

12 Disponível aquiDisponível aquiDisponível aquiAcesso em 28.7.2021.

13 Disponível aqui. Acesso em 6.8.2021.

14 Disponível aqui. Acesso em 28.7.2021.

Sofia Temer
Doutora e mestre em Direito Processual pela UERJ. Membro do IBDP, do ICPC e da Processualistas. Sócia do escritório Gustavo Tepedino Advogados.

Juliana Esteves
Graduanda na PUC/RJ. Membro do Grupo de Estudos Processuais da PUC/RJ. Colaboradora do escritório Gustavo Tepedino Advogados.

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