O falecimento de uma pessoa provoca um clima natural de “stress” nos familiares.
Em tempos de considerados normais a eventual abertura do inventário de bens suscita, frequentemente divergências mais ou menos agudas que aumentam a dor da perda e o significado da ausência que a morte, com tudo que envolve o fato, desencadeia nos sentimentos que vão desde as fantasias de culpa até a própria tanatofobia.
Acontece que a pandemia que assola o Brasil, por causa da Covid19 ensejou clima existencial inédito, caracterizado entre outras alterações da cotidianidade, a suspensão das atividades econômicas, sociais, culturais enfim a rotina de centena de milhões de pessoas que passaram a ter uma convivência obrigatória de isolamento, pela decretação do distanciamento social, o home office e até a simbólica máscara facial.
Concomitantemente com o falecimento inesperado de centenas de milhares de pessoas sem o processo natural de doenças crônicas, com a falência do sistema hospitalar, a nevrosidade diante da impotência de resposta à doença fatal, sem tratamento, tudo isto se somou à necessidade de enterros sem se quer a ritualística de despedida dos familiares.
Essa nevrosidade e brusquidão, o desamparo generalizado diante da necessidade de resolver questões financeiras e econômicas, envolvidas muitas vezes em tecido sentimental, na partilha de bens vem transformando o processo de inventário, já por si palco de disputas e desavenças num exemplo radical e sofrido que se irradia por outras realidades do universo jurídico: visitas nas situações de divórcio, querelas de toda natureza que a mediação personalizada formal ou informal eram capazes de dirimir tomam proporções de intermináveis desencontros capazes de produzir a médio e longo prazo processos que irão tumultuar ou já esgotado limite de organização, trâmite e resolução de bolhas que se atropelam, por exemplo nas causas trabalhistas, nas quebras de empresas que não conseguiram resistir à crise econômica que paralisou o sistema financeiro de milhões de pessoas.
Urge criatividade para criação de mecanismos originais capazes de socorrer a população com auxílio de ferramentas de Serviço Social, psicologia, sociologia e, principalmente, visão audaciosa no campo do Direito, tudo no período de crise, aliviar os prejuízos materiais e emocionais de tamanha proporção.
Um pensamento burocrático e fórmulas simplistas não correspondem a temos de exceção em que o próprio conceito de segurança na vida é fraturado.
Em recente entrevista Maria da Penha que deu seu nome à importante Lei de defesa da mulher vítima de agressão, dramaticamente, afirmou o horror de conviver nos finais de semana com o cônjuge agressor.
Sirva este alerta testemunhal para convocar a sociedade no sentido de se manejar, rápida e cirurgicamente para contornar o problema instaurado.