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Das particulares dos contratos de franquias

Quanto à bilateralidade, pode-se afirmar que é caracterizada pela vontade de ambas as partes assumirem obrigações consensuais e mútuas.

3/8/2021

(Imagem: Arte Migalhas)

Caros leitores, retomando o tema das franquias que tratei no último artigo, passamos agora a estudar as particularidades e elementos que caracterizam os contratos de franchising.

Sebastião José Roque apresenta um rol objetivo das características, estabelecendo que se trata "de um contrato bilateral, consensual, oneroso, empresarial, de execução continuada, internacional ou nacional, híbrido e complexo, de prestações recíprocas".1

Passo a explicar cada característica:

Quanto à bilateralidade, pode-se afirmar que é caracterizada pela vontade de ambas as partes assumirem obrigações consensuais e mútuas. É consensual, pois as partes envolvidas de forma livre aceitam e assinam o contrato, assumindo com autonomia da vontade as obrigações contratadas.2

Oneroso, pois desde o seu início produz obrigações para os envolvidos, tal como o pagamento de taxas iniciais e adimplemento contratual. Ensina Gustavo Saad Diniz que, em decorrência da onerosidade, o contrato poderá estabelecer uma remuneração direta em troca da cessão do know-how, definidas como royalties, ou ainda, pode-se falar em remuneração indireta, derivada do fornecimento exclusivo de mercadorias, alugueres e manutenção de equipamentos, bem como da venda de materiais de utilização própria. Por fim, Diniz sustenta que é possível também exigir uma taxa de adesão à franquia e taxas pela participação de estratégias de marketing da rede franqueadora.3

É empresarial pois é estabelecido entre duas empresas, isto é, duas pessoas jurídicas, característica que decorre da própria redação do artigo 1º da lei 13.966/19 que define a franquia empresarial.

A execução continuada ocorre por se tratar de um contrato de duração, isto é, não se realizam todas as operações em um único ato, mas se repetem e se perpetuam no transcorrer do tempo. Nas palavras de Roque "não se realizam em um só momento, mas de forma continuada e permanente; tanto as prestações como as contraprestações são contínuas e vão se repetindo no tempo e no espaço".4

Pode ainda ser nacional ou internacional,5 isto é, pode envolver pessoas jurídicas de mais de uma nacionalidade. Além disso, o contrato de franquia é híbrido porque é formado por elementos de diversos âmbitos contratuais, como por exemplo, um contrato de fornecimento, de concessão, de prestação de serviços etc., no entanto, toda esta aglutinação de elementos configura o contrato de franquia como um contrato peculiar, tratando-se de um contrato complexo.6

Neste mesmo sentido, ensina Venosa, que o contrato é bilateral por conter obrigações recíprocas. Sustenta que se trata de um contrato intuitu personae, no sentido de que ambas as partes visam a figura do outro contratante. Além disto, é consensual porque depende unicamente da vontade de contratar das partes. É comutativo, pois apresenta prestações conhecidas pelas partes, embora possam conter outras espécies de cláusulas. Além de que é de execução continuada, isto é, requer o cumprimento por prazo razoavelmente longo. Por fim, vale explicar que embora todas estas características possam constituir um contrato de franquias, não significa que todas necessitam estar presentes concomitantemente.7

É importante também perpassar sobre a natureza jurídica, há o entendimento de que o contrato de franquias é, em verdade, um contrato principal composto de contratos acessórios ou dependentes. Conforme a definição de Roque, a franquia é geralmente um complexo de contratos, definidos entre principais, acessórios ou dependentes. Aproxima-se ainda do contrato de distribuição e de representação, enquadrando-se, também como contrato de transferência de tecnologia.8

Sobre a possibilidade de se aplicar o Código de Defesa do Consumidor nos contratos de franquia, Venosa sustenta que "embora não seja um contrato típico de consumo, se clara e presente a vulnerabilidade do franqueado, devem ser aplicados os princípios do Código de Defesa do Consumidor".9 Por outro lado, DINIZ defende que "Há entre as partes uma relação interempresarial e de fomento absolutamente afastada da lógica consumerista, sendo inaplicável o CDC nesta relação".10 Portanto, há uma discussão doutrinária sobre a incidência ou não do CDC.

Vale lembrar também que não há que se falar em vínculo de emprego, pois não se configura desta forma, a menos que o sistema de franquias seja fraudulento e que tenha o condão de ocultar a relação trabalhista.

Em síntese o sistema de franquias possui um conjunto de peculiaridades e conhece-las é essencial para que o ambas as partes saibam o que esperar dessa relação contratual. E é claro, não poderia faltar o papel do advogado, que é fundamental para evitar eventos inesperados, bem como para estabelecer as regras do jogo de forma clara e de acordo com o ordenamento jurídico pátrio.

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1- ROQUE, Sebastião José. Do contrato de franquia empresarial. São Paulo: Ícone, 2012, p. 16.

2- Idem.

3- DINIZ, Gustavo Saad. Curso de direito comercial. São Paulo: Atlas, 2019, p. 679.

4- ROQUE, Sebastião José. Op. cit., p. 17.

5- Idem.

6- Idem.

7- VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: contratos. 18. ed. São Paulo: Atlas, 2018, p. 896.

8- ROQUE, Sebastião José. Op. cit., p. 15.

9- VENOSA, Sílvio de Salvo. Op. cit., p. 892.

10- DINIZ, Gustavo Saad. Op. cit., p. 679.

Diego Kubis Jesus
Bacharel em Direito e mestrando em Direitos Fundamentais e Democracia. Pesquisador do escritório Clèmerson Merlin Clève - Advogados Associados.

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