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Lei da Improbidade Administrativa em exame pelo Poder Legislativo - Supressão de uma fase que não deixa saudades

Foi assim que a Medida Provisória 2.225-45 de 2001 alterou o § 7º do art. 17, introduzindo no rito específico uma fase pré-processual.

22/7/2021

(Imagem: Arte Migalhas)

Questões ligadas à "Lei da Improbidade Administrativa" despertam interesse desde o seu nascimento. Após vitoriosa campanha eleitoral — baseada principalmente na "cassa aos marajás" —, o Presidente Collor enviou ao Poder Legislativo o projeto que deu origem à lei 8.429/92, mais conhecida como "Lei da Improbidade Administrativa" ("LIA"). O projeto era visivelmente inspirado na Lei Bilac Pinto (lei 3.502/58, que, a seu turno, tinha por base a Lei Pitombo Godoi-Ilha, a lei 3.164/57). O texto original do "Projeto Collor" era bem pior que a Lei Bilac Pinto, um dos motivos pelos quais sofreu muitas alterações durante sua tramitação.¹

Depois de promulgada, a LIA ainda recebeu diversas outras modificações, nem sempre inspiradas no interesse público (o que é demonstrado pelo oportunismo das mudanças, muito mais evidente que qualquer propósito de verdadeiro aperfeiçoamento técnico-jurídico da lei).

Foi assim que a Medida Provisória 2.225-45 de 2001 alterou o § 7º do art. 17, introduzindo no rito específico uma fase pré-processual: de acordo com o novel dispositivo, ainda hoje vigente, se o juiz entender que a inicial está "em devida forma", "ordenará a notificação do requerido para oferecer manifestação por escrito"; em seguida, o magistrado pode encerrar o processo ou receber a inicial, mandando citar o réu, dando início à verdadeira e própria fase processual (§§ 8º e 9º).

Agora, o PL 10.887/18 — que sinaliza profundas alterações na lei 8.429/92 — tem reacendido os debates, desde o início de sua tramitação na Câmara dos Deputados e ainda após sua aprovação naquela Casa Legislativa.

Buscando revigorar o marco legal da probidade administrativa, o referido PL tenta positivar o que de fato já ocorre na prática judiciária e, também nesse sentido, diversos de seus pontos nada mais fazem do que tornar lei o que já tem prevalecido na jurisprudência.

Mesmo aguardando tramitação no Senado Federal — e, portanto, sujeito a alterações —, um ângulo específico do PL merece atenção: a simplificação do procedimento mediante a extinção do contraditório que antecedia o recebimento da petição inicial e a citação dos acusados, mencionados acima.

Permita-nos, caro leitor, algumas anotações.

A bem da verdade, como já acentuado, a redação original da lei 8.429/92 não previa o contraditório preliminar. Após o ajuizamento da petição inicial, promovia-se a citação para que os réus, querendo, apresentassem contestação. Seguia-se, portanto, a regra geral do processo civil.

Todavia, o contraditório preliminar não alcançou efeitos práticos exitosos, condizentes com a lógica jurídica e com os princípios republicanos e democráticos.

A tortuosa disposição do art. 17, § 8º, da lei 8.429/92, que parecia confundir questões formais e processuais com questões de mérito, militou contra a efetividade desse novo rito processual. Por consequência, o contraditório preliminar tornou-se um tanto quanto burocrático e ineficiente, além de criar uma certa perplexidade para os advogados.

Como é notório, a defesa pode contemplar questões processuais e/ou de mérito. O impulso natural do advogado o leva a deduzir, já na defesa prévia, todas as alegações de defesa possíveis.

Com o tempo, porém, verificou-se a tendência de os juízes afirmarem que as questões processuais se confundiriam com o mérito e que, no mérito, as acusações seriam relevantes para recebimento da inicial, ordenando, quase que invariavelmente, a citação do réu. Ao final das contas, nem sempre por razões jurídicas, mas pelo benefício da dúvida que o acusador (sabe-se lá por que) recebe, tornaram-se raríssimos os casos de acolhimento da defesa prévia.

O conflito entre o que prevê a lei e o que se verifica na prática cria um grande dilema: recorrer ou não da decisão que rejeita a defesa prévia?

Com o tempo, passou-se a perceber que a pretensão recursal tende a ser fadada ao insucesso por conta da propensão de o tribunal prestigiar o entendimento firmado pelo juiz nesse exame preliminar. Por isso, eventual recurso tende a apenas fazer o processo demorar, principalmente se forem vários réus (o que é o mais comum); demora que, em caso de condenação, agrava sobremaneira a situação do réu, tanto pela atualização dos valores quanto pelo custo de oportunidade atrelado ao período em que os bens permaneceram indisponibilizados.

A grave ineficiência processual causada pelo contraditório preliminar, seja pela repetição das mesmas alegações de defesa, seja pela demora para notificar o acusado e para citá-lo quando recebida a inicial, há muito recomendavam sua extinção ou, quando menos, drástico aprimoramento.

Parece-nos que a simplificação das normas e dos procedimentos é um objetivo a ser continuamente perseguido e, nesse ponto, andou bem o projeto, tal como ora se encontra. Ao extinguir uma fase procedimental de baixíssima utilidade prática e que mais dificulta a defesa que a auxilia, trouxe outros benefícios a favor da ampla defesa e do efetivo contraditório.

Assim, a realidade colhida na maioria das ações de improbidade administrativa nos faz ter certeza de que o afastamento de atos processuais que tendem à absoluta improdutividade deve trazer sensível ganho de celeridade e beneficiar os réus.

A uma porque, na atualidade, a indisponibilidade de bens é decretada sem grandes rigores (com base no "in dubio pro societate" que já tivemos a oportunidade de criticar em outra oportunidade²) e, assim, a demora para o julgamento passa a militar gravemente contra o réu que teve seu patrimônio bloqueado.

A duas porque, em geral, o polo passivo de uma ação de improbidade administrativa é formado por duas ou mais pessoas, quando não por mais de uma dezena, de modo que a demora para consumar os atos do contraditório preliminar — notificação, apresentação da defesa prévia, decisão, eventuais recursos e posterior citação — causam prejuízo efetivo ao acusado e tornam a situação um tanto quanto cômoda para a acusação.

Quem atua na defesa em ações de improbidade administrativa certamente lembrará de diversos casos em que o ciclo citatório demorou anos para ser concluído (e a crescente facilidade para indisponibilizar ativos dos réus foi consistente desestímulo para que a acusação promovesse o andamento do processo).

Conquanto desde sempre os requisitos da inicial previstos na legislação (LIA e CPC) fossem aplicáveis, a circunstância de se tratar de uma inicial sujeita a um juízo de recebimento em fase pré-processual (=aparentemente sujeita a um segundo exame, mais detido), certamente levou seus autores a se descuidarem, especialmente no devido delineamento da causa petendi e os juízes, por outro lado, a uma maior "benevolência" no dito exame "preliminar".

Portanto, outro benefício que certamente advirá da simplificação do rito previsto pela lei 8.429/92 será a reaproximação das questões materiais dos tipos de improbidade administrativa com os aspectos formais e procedimentais da lei LIA e do CPC.

Nesse sentido, a acusação de que alguém cometeu improbidade administrativa, o que é de extrema gravidade, não pode ser lastreada em meras suposições ou alegações; é imperioso que a petição inicial seja instruída por elementos concretos e que todos os documentos preexistentes já a acompanhem, no que é expresso o art. 16, § 3º, I e II, e §§ 5º e 6º, tal como projeta o PL aprovado pela Câmara dos Deputados.

A afirmação, vale observar, é aderente às regras gerais do ônus da prova (CPC 373, I) e do momento da produção da prova documental (CPC 434 e 435), que devem ser rigorosamente aplicadas, evitando-se que o processo judicial seja utilizado para suprir a falta de investigação e que ao réu caiba provar sua inocência quando, pela Constituição Federal, o ônus da prova é todo da acusação.

No mais, o PL aprovado pela Câmara reafirma a necessidade de se evitar o prolongamento do processo quando já houver elementos que levem à conclusão de ser impossível a imposição das sanções previstas na LIA, hipótese em que o magistrado deverá extinguir o feito ou converter a ação de improbidade administrativa em ação civil pública (v. § 17 do art. 17 projetado).

É apropriado afirmar que cabe aos magistrados atuar com maior rigor as previsões normativas da legislação processual relativas ao julgamento antecipado do mérito, total (CPC 355) ou parcial (CPC 356), seja por deparar-se com petição inicial fragilmente instruída (isto é, cuja instrução não seja proporcional e condizente com a gravidade da acusação) ou com defesa suficientemente robusta. De outro lado, evitando-se a prática de atos desnecessários, elimina-se mais rapidamente a dúvida que paira na sociedade a respeito de tão grave acusação, evitando-se que ela perdure além do tempo necessário.

Por essas razões básicas e por muitas outras, que tornariam este texto mais extenso do que deve ser, essa fase preliminar não deixará saudades.

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1- Em grande parte, por atuação do Ministério Público de São Paulo. Antonio Araldo Ferraz Dal Pozzo, um dos autores deste artigo, era Procurador-Geral de Justiça, àquela época e acompanhou de perto os trabalhos parlamentares.

2- DORNA, Mário Henrique de Barros. O juízo preliminar da lei de improbidade administrativa. In: Revista de Processo, vol. 300, pp. 251/266, fev./2020, DTR/2020/122.

Antonio Araldo Ferraz Dal Pozzo
Advogado e sócio fundador do escritório Dal Pozzo Advogados. Ex-procurador Geral de Justiça do Ministério Público do Estado de São Paulo.

Mário Dorna
Mestre em Direito Processual Civil pela PUC/SP. Membro efetivo do IBDP. Advogado associado ao Dal Pozzo Advogados.

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