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Bioplásticos, biodegradáveis e oxidegradáveis: a solução para a poluição plástica. Será?

Plásticos biodegradáveis e oxidegradáveis, disponíveis no mercado, são considerados a melhor alternativa para conter a poluição plástica. Porém, pesquisas recentes questionam essa “aparente solução”.

19/7/2021

(Imagem: Arte Migalhas)

Diariamente são descartados milhares de resíduos plásticos que, tecnicamente, são considerados recicláveis, porém o destino é o pior possível: os aterros sanitários e o meio ambiente. Embora a Política Nacional de Resíduos Sólidos, em seu art. 32, determine que as embalagens devam ser fabricadas com materiais que propiciem a reutilização ou a reciclagem, o fato de o material ser considerado reciclável “não é garantia de que será. A viabilidade econômica, muito mais que a técnica, é o que define o índice de reciclagem de um material” (PERTUSSATTI, 2020, pg.12).

A maioria dos municípios não adota a coleta seletiva, ou, caso adote, a reciclagem de sacolas plásticas e materiais de uso único, por exemplo, é inviável. E, mesmo quando destinados para os aterros sanitários, os impactos ambientais são expressivos, pois além de serem os principais responsáveis pela poluição plástica, contribuem para outro fator preocupante, os microplásticos (PERTUSSATTI, 2020, pg.6).

O problema dos microplásticos é que, uma vez liberados, permanecem no ambiente por elevado tempo, podem ser facilmente ingeridos e acumulados nos animais. Acumulam-se também nos alimentos, além de adsorver ou liberar contaminantes químicos, levando à contaminação química de animais e seres humanos, em ambientes aquáticos ou terrestres. (PERTUSSATTI, 2020, pg.6) [g.n.]

E como “aparente solução”, muito tem se falado nos chamados bioplásticos, plásticos biodegradáveis, plástico oxidegradável. Porém, “bioplásticos podem parecer atraentes, mas também são um pouco enganosos. O termo se refere a diferentes tipos de produtos, mas nem todos eles podem ser considerados sustentáveis” (GONCALVES, 2020, pg.50).

Segundo Pertussatti (2020, pg.19) para que ocorra a degradação é “necessário que o material esteja em ambiente que proporcione condições adequadas para a ação dos microrganismos, sendo que, sem estas, o plástico não sofre o processo de biodegradação”. Outra “opção atraente”, mas também enganosa, é o plástico oxidegradável, que se desintegra, formando microplásticos, ao invés de se degradar, é inviável para reciclagem.

Seguindo na busca do plástico 100% biodegradável, importante citar a pesquisa da USP, que objetiva produzir plástico 100% biodegradável com resíduos da agroindústria (USP, 2017), além de desenvolver “um novo tipo de plástico biodegradável, que tem como matéria-prima o amido de mandioca, produzido em parceria com a Escola Politécnica” (USP, 2019).

Os pesquisadores destacam que o plástico 100% biodegradável desenvolvido na Universidade “é feito de material biológico, e por isso é atacado, na natureza, por outros agentes biológicos – bactérias, fungos e algas – e se transformam em água, CO2 e matéria orgânica. Ele se degrada em no máximo 120 dias” (USP, 2017).

Todavia, chamam a atenção para outros tipos de plásticos, disponíveis no mercado, considerados biodegradáveis:

(...) Atualmente, existem no mercado outros tipos de plástico biodegradável. São feitos a partir de fontes renováveis – milho, mandioca, beterraba e cana-de-açúcar. Porém, estas fontes servem como matérias-primas para produzir um composto (ácido láctico) do qual se pode sintetizar o polímero (PLA – ácido polilático). “Devido ao fato destes plásticos não serem produzidos com polímeros naturais, como proteína e carboidratos, por exemplo, o material apresenta estrutura mais complexa e só se biodegrada corretamente em usinas de compostagem, onde há condições adequadas de luz, umidade e temperatura, além da quantidade correta de microrganismos” (USP, 2017) [g.n.].

(...) Outro plástico muito divulgado na busca por maior sustentabilidade é o “plástico verde”. No entanto, a pesquisadora faz um alerta sobre este tipo de plástico. É feito de cana-de-açúcar, mas não é biodegradável. A partir da cana, é produzido o polietileno igual ao obtido do petróleo, assim o tempo de decomposição do plástico verde é o mesmo do plástico comum. “Vai continuar a causar problemas nas cidades e na natureza.” (USP, 2017) [g.n.].

Desta forma, apesar dos avanços, os estudos mais recentes vêm desconstruindo a ideia de que os bioplásticos, plásticos biodegradáveis e oxidegradáveis disponíveis no mercado, não sejam, de fato, a solução ideal para o problema relacionado à poluição com sacolas plásticas e demais descartáveis de uso único. Uma alternativa mais acessível, viável, responsável e eficaz, para frear boa parte da poluição do meio ambiente é o ato de RECUSAR esses materiais, um verdadeiro exercício de consciência ambiental.

A consciência ambiental pode ser definida como uma reflexão sobre os acontecimentos relacionados ao meio ambiente, selando um compromisso com mudanças de comportamentos, padrões e atitudes que refletirão positivamente no indivíduo, como parte do sistema, bem como toda a coletividade, fortalecendo o desenvolvimento sustentável.

Importante destacar que em 2010, o Ministério do Meio Ambiente já chamava a atenção para o consumo excessivo de sacolas plásticas, com a campanha “Saco é um Saco”, com o objetivo de estimular uma mudança de hábito nos consumidores. Naquele ano eram consumidas uma média de 1,5 milhão de sacolas plásticas por hora no Brasil (BRASIL, 2010).

O cenário anterior era preocupante e o atual é desastroso. De acordo com recente pesquisa realizada pelo Ipec (Inteligência em Pesquisa e Consultoria), “o Brasil produz anualmente 3 milhões de toneladas de plásticos de uso único, dos quais 13% são produtos ??como pratos, copos, talheres, sacos plásticos e canudos. Isso equivale a 200 bilhões de itens descartáveis ??por ano (UNEP, 2021).

Interessante mencionar, que a mesma pesquisa revelou, ainda, que “72% dos consumidores gostariam de receber os pedidos sem plástico descartável, 15% já teriam deixado de solicitar o serviço por se sentirem incomodados pela quantidade de plásticos” (UNEP, 2021).

Isso evidencia que o ato de RECUSAR as sacolas plásticas e outros materiais descartáveis de uso único, se adaptar aos padrões de sustentabilidade, visando o menor ou qualquer impacto ao meio ambiente são atitudes necessárias e urgentes (GONCALVES, 2020). E, mesmo que os plásticos (realmente) 100% biodegradáveis sejam disponibilizados no mercado, ainda assim, a consciência ambiental sempre será a melhor alternativa.

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BRASIL. Disponível em: clique aqui. MMA distribui sacolas retornáveis em Ipanema, no Rio de Janeiro. 

GONCALVES, Luisa Cortat Simonetti. REMÉDIOS JURÍDICOS CONTRA A POLUIÇÃO PLÁSTICA DOS OCEANOS: UMA ANÁLISE DOS ESFORÇOS DO DIREITO INTERNACIONAL PÚBLICO E DAS INICIATIVAS PRIVADAS PARA ENFRENTAR A SOPA DE PLÁSTICO. Monografia. Disponível em: clique aqui

PERTUSSATTI, Caroline Alvarenga. GESTÃO AMBIENTAL DE RESÍDUOS PLÁSTICOS NO BRASIL: Subsídios para uma Diretriz Nacional. Artigo. Disponível em: clique aqui.

UNEP. Pesquisa Ipec revela que 72% dos consumidores gostariam de receber delivery de comida sem plástico. Disponível em: clique aqui.

USP. Universidade de São Paulo. USP produz plástico 100% biodegradável com resíduos da agroindústria. Jornal da USP. 2017. Disponível em: clique aqui.

Universidade de São Paulo. Engenheiros da USP criam plástico biodegradável feito de mandioca, transparente e resistente. Jornal da USP. 2019. Disponível em: clique aqui.

 

Carla Ap. Mantaia
Bacharel em Direito pela Faculdade de Rondônia - FARO, 2015. Advogada - aprovada/habilitada no XVIII Exame de Ordem Unificado, 2016. Pós-graduada pela Escola da Magistratura do Estado de Rondônia - EMERON, 2016-2018.

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