Ao se analisar o contexto histórico do sistema repressivo penal pode-se observar a evolução do tratamento dado pelas civilizações ao preso. No começo da formação das sociedades civis a mutilação e a morte eram tidas como principais penas aplicadas pelo Estado. Cita-se neste exemplo as civilizações que se desenvolveram ao longo dos rios Tigres e Eufrates nos anos 3000 A. C – onde originou-se o famoso Código de Hamurábi.
Com a evolução do comércio, e a necessidade da mão-de-obra abundante, o trabalho forçado passou a figurar no centro das sanções penais, à medida que as civilizações da Idade Média progrediam. Foi, no entanto, na idade moderna (séculos XVII e XVIII) que as grandes nações do mundo – cansadas das práticas de tantas barbáries sob a égide do império da lei – começaram a migrar para um sistema mais humano de aplicação da lei penal.
Em meados do século XVIII, Cesar Bonesana – também conhecido como "o Marquês de Beccaria" – publicou a sua obra mais famosa (Dei Delliti e Delle Pene) a qual viria a ser o maior baluarte da luta contra as arbitrariedades promovidas no sistema penal da época. Segundo sua obra o magistrado poderia aplicar apenas as penas previstas em lei. Indo além, se referia às penas cruéis como "odiosas e contrárias à justiça", e concluía sobre as prisões da época que eram "horrível mansão do desespero e da fome, faltando dentro delas muitas coisas, mas principalmente piedade e a humanidade".
No direito contemporâneo, principalmente após o advento da publicação da Declaração Universal dos Direitos do Homem, o exercício da punição penal pelo Estado ganhou outro enfoque: a ressocialização do preso à comunidade. Muito mais que evitar o acometimento de penas graves e odiosas ao sujeito judicialmente condenado, o Direito Moderno passou a resguardar a busca pela recuperação deste através de práticas que lhe permitam – após o cumprimento da pena – conviver serenamente em sociedade.
Atualmente a tentativa do Estado brasileiro em promover a ressocialização do apenado possui dois frontes principais de batalha: a capacitação do preso para exercício de trabalhos técnicos e, ainda, a promoção da educação formal dele. Sob o enfoque desse novo tratamento dado à figura da pessoa recolhida ao cárcere privado há de se destacar que em meados de 1950 foram escritas as Normas Gerais do Regime Penitenciário – lei 3.274/57, que são o ponto de partida para a opção do nosso regime legal pela implantação da educação formal do apenado como corolário para ressocialização deste.
Segundo dados do Departamento Penitenciário Nacional (DEPEN), a população carcerária do Brasil chegou, em 2019, à incrível marca de 773 mil presos, considerando todos os regimes de aplicação da pena. São pessoas que, a despeito de terem cometido crimes de todas as naturezas, ainda assim são humanos, e, portanto, pessoas com sentimentos, tristezas e problemas.
A pesquisa promovida pelo Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) – denominada Projeto Sistema Prisional em Números – trouxe dados alarmantes quanto às condições das instalações carcerárias do Brasil. Os números mostram que a taxa de ocupação dos presídios está em incríveis 175%. Segundo o levantamento feito, 58% dos estabelecimentos prisionais não dispõe de assistência médica aos internos e 44% dos presídios não possuem qualquer tipo de assistência educacional.
Conforme os dados colhidos no estudo do CNMP é possível observar que 55% dos detentos brasileiros estão na faixa etária dos 18 aos 29 anos, ou sejam, são pessoas que têm uma longa vida pela frente. No entanto, o relatório Reentradas e reiterações infracionais produzido pelo Departamento de Pesquisas Judiciárias do Conselho Nacional de Justiça, atestam que 42,5% das pessoas maiores de 18 anos que possuíam passagem pelo sistema prisional em 2015 retornaram ao recolhimento em cárcere até o ano de 2019. Os números impressionam ao mesmo tempo que enunciam o fracasso nacional na tentativa de ressocializar a população carcerária.
Outro dado que merece destaque, visível na pesquisa realizada pelo CNMP, é de que a população carcerária multiplicou por 8 desde o início do catálogo dos dados por aquele órgão em 1990. A manter esse ritmo, é devastador o futuro que se apresenta para a nossa sociedade.
Se seguirmos com a tendência de alta tanto do número da população carcerária, quanto do número de reincidentes, chegaremos indiscutivelmente à uma situação insustentável – a qual, a bem da verdade, já estamos.
Os dados colhidos pelos diversos órgãos componentes do judiciário brasileiro demonstram que o Direito Penal, mais especificamente a reclusão do condenado aos estabelecimentos prisionais, tem se demonstrado cada vez mais a prima ratio para o enfrentado às questões relacionadas à violência e segurança pública.
Há, ou pelo menos deveria existir, uma preocupação com a dignidade da pessoa humana privada de sua liberdade desde o advento da Declaração Universal dos Direitos dos Homens.
O Estado tem o dever legal de adotar medidas que possibilitem aos apenados o futuro retorno ao harmônico convívio social. Por reintegrar uma pessoa podemos entender que é a oferta, ao condenado a cumprir pena em regime privativo de liberdade, de condições para que ele possa se reorganizar, não necessitando encontrar mais na delinquência um modo de vida.
Apesar de conhecer o caminho, e de haver inclusive legislação apontado para ele, o nosso sistema carcerário falha em ressocializar os seus presos, o que pode ser visto nos números apresentados no início deste trabalho. Ao não agir para recuperar aqueles que pelos mais diversos motivos descaminharam-se para o mundo do crime, o Estado Brasileiro colabora para as taxas cada vez maiores de pessoas reincidentes na criminalidade.
São poucos os estímulos que o sistema penitenciário brasileiro dá ao apenado para que possa promover a ressocialização deste por meio da produção literária. No entanto, despontam, inclusive na jurisprudência pátria, decisões e teses que fortemente embasam essa possibilidade. A escrita de textos autorais corresponde ao último estágio de desenvolvimento das habilidades psicossociais de interação humana à medida que exige grau máximo de envolvimento do autor em sua confecção.
O estímulo aos presos para que produzam textos, expressando suas ideias, pensamentos, ambições e planos demonstra-se como verdadeiro objetivo a ser perseguido pela sociedade como meta para ressocialização deste. O desenvolvimento literário dos apenados possui o condão de dar voz a estes para que possam expressar-se e se fazer serem entendidos pela sociedade como um todo. Encontra-se, na produção literária, portanto, um importante mecanismo hábil a promover a ressocialização de presos, principalmente pelo alto grau de desenvolvimento de habilidades cognitivo-sociais que esta atividade promove.
Sendo a produção literária uma faceta da atividade intelectual inerente aos estudos, é imperioso concluir que a realização deste tipo de atividade pelos apenados, importará, sem sombra de dúvidas, em hipótese legal de remição da pena. É crível concluir que a produção de textos e artigos acadêmicos, pelo preso, denotam o envolvimento do autor com o tema abordado na produção textual, o que implica necessariamente na atividade pensante, no desenvolvimento de ideias, e, portanto, aptas à promoção da remissão da pena.
Além de permitir a ressocialização do preso, a produção textual revela-se importante medida de política criminal no que diz respeito à recuperação do preso à convivência social. Sem sombra de dúvidas, a pena aplicada deverá ser diminuída à medida em que a pessoa reclusa ao cárcere produza cada vez mais textos, demonstrando assim o seu interesse cada vez maior no próprio desenvolvimento intelectual.