Migalhas de Peso

A nova amplitude da impenhorabilidade de contas bancárias segundo o STJ

O entendimento majoritário do STJ entendeu pela impenhorabilidade de contas bancárias até 40 salários mínimos, ampliando a incidência do Art. 833, X do CPC/15.

16/6/2021

(Imagem: Arte Migalhas)

O artigo 833, caput do CPC/15 preconiza os casos de impenhorabilidade dos bens do devedor. Neste dispositivo, é importante indicar os incisos IV e X que definem, respectivamente: 

“IV - os vencimentos, os subsídios, os soldos, os salários, as remunerações, os proventos de aposentadoria, as pensões, os pecúlios e os montepios, bem como as quantias recebidas por liberalidade de terceiro e destinadas ao sustento do devedor e de sua família, os ganhos de trabalhador autônomo e os honorários de profissional liberal, ressalvado o § 2º;

X - a quantia depositada em caderneta de poupança, até o limite de 40 (quarenta) salários-mínimos;” 

Ou seja, desde o nascimento do Código de Processo Civil de 2015 a impenhorabilidade abrangia os meios de subsistência do devedor e, apresentava limitação de 40 salários-mínimos em caderneta de poupança. 

Contudo, a partir de entendimento majoritário do Superior Tribunal de Justiça, a ampliação do limite pecuniário para penhora estendeu-se, abrangendo toda e qualquer tipo de conta bancária do devedor, inclusive conta corrente. 

Este entendimento pode ser percebido através de pílula jurisprudêncial a seguir: 

“Como se vê, o acórdão recorrido – no ponto – não destoa da recente orientação desta Corte acerca da matéria, segundo a qual a abrangência da regra do art. 833, inciso X, do CPC/2015 se estende a todos os numerários poupados pela parte executada, até o limite de 40 (quarenta) salários mínimos, não importando se depositados em poupança, em conta-corrente, fundos de investimentos ou guardados em papel-moeda (...) (STJ – AREsp: 1671483 SP 2020/0047805-9, Relator: Ministro MARCO BUZZI, Data de Publicação: DJ 03/08/2020).” 

Sendo assim, a proteção da dignidade do devedor e de sua família é notória. Dignidade esta relacionada ao Princípio da Dignidade da Pessoa Humana que, em campo prático, aplica-se na proteção da integridade física e psíquica do indivíduo e na manutenção de condições mínimas para o exercício da vida. 

Dentro deste prisma, a redução patrimonial excessiva do devedor desencadearia ataque direto a sua capacidade psíquica, tal como a física, reduzindo sua capacidade de subsistência, afetando sua essência como indivíduo social e biológico. 

Cabe ressaltar que a própria Carta Magna de 1988 expõe a proteção de tal princípio: “Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: (...) III - a dignidade da pessoa humana;”. 

Importante indicar que este entendimento já vinha sendo trabalhado desde 2014, posto que, em REsp n. 1230060, o STJ entendeu pela impenhorabilidade do mesmo limite salarial para qualquer aplicação financeira. 

Sendo assim, era um entendimento que vinha se consolidando até culminar na ampliação do Art. 833, inciso X do CPC/15. 

No mesmo artigo processual civilista, é importante indicar o parágrafo 2º que possui o seguinte texto: “(...) O disposto nos incisos IV e X do caput não se aplica à hipótese de penhora para pagamento de prestação alimentícia, independentemente de sua origem, bem como às importâncias excedentes a 50 (cinquenta) salários-mínimos mensais, devendo a constrição observar o disposto no art. 528, § 8º e no art. 529, § 3º”. 

Ao ler o dispositivo em relevo, nota-se que a impenhorabilidade não abarca casos de prestação alimentícia, neste sentido, o entendimento abrangente do STJ, quanto a aplicação do Art. 833, X do CPC/15, manteve esta exceção. 

Neste diapasão, a título de conhecimento amplo sobre o tema, é imprescindível indicar que a Garantia do Mínimo Existencial é um dos impulsionadores do entendimento abrangente do Superior Tribunal de Justiça. 

A partir de decisão proferida pelo Tribunal Federal Administrativo Alemão, em 1953, esta garantia foi instaurada, onde, uniu o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana, a Liberdade material e o Estado Social. Sendo assim, o papel do Estado seria garantir ao indivíduo a plena atividade de seus direitos. 

O entendimento majoritário exposto pelo Superior Tribunal de Justiça age dentro deste prisma, visto que, ao abranger as regras de impenhorabilidade promove a garantia das necessidades básicas do indivíduo, que, no cenário contemporâneo, é mais extenso que fatores meramente biológicos. 

Quanto à aplicação deste entendimento em outras searas, é importante indicar decisão de execução fiscal em que a ampliação do Art. 833, X do CPC/15 não foi aplicada : 

“Enfim, no que tange ao pedido de liberação dos valores bloqueados na origem com base na impenhorabilidade prevista no inciso X do art. 833 do CPC (limite de 40 salários mínimos, a quantia depositada em caderneta de poupança), trata-se de modalidade de impenhorabilidade que não aproveita às pessoas jurídicas (situação da parte executada), já que se destina à manutenção dos valores necessários ao sustento do próprio devedor e de sua família, ou seja, verbas de caráter alimentar. (fls. 36-37, e-STJ, grifos acrescidos). (AgInt no REsp 1878944/RS, DJ 01/03/2021). 

A partir do trecho da jurisprudência supramencionada observamos a segunda exceção a aplicação do Art. 833, X do CPC/15 em sentido ampliado. Ou seja, para pessoas jurídicas, tal benesse não possui incidência. 

Quanto aos debates trabalhistas, a aplicação do Art. 833, X do CPC/15 é controvertida, sendo aplicada em alguns casos, conforme se pode analisar através da partícula jurisprudencial a seguir: 

“AGRAVO DE PETIÇÃO. COTA POUPANÇA. IMPENHORABILIDADE ATÉ O LIMITE DE 40 SALÁRIOS MÍNIMOS. Nos termos do art. 833, X, do CPC, são impenhoráveis os valores depositados em caderneta de poupança, até o limite de 40 (quarenta) salários-mínimos. No mesmo sentido é a diretriz assentada na Súmula nº 106 deste E. Regional. (TRT 12 – AP – 0001090-78.2016.5.12.0016, Relator: HELIO BASTIDA LOPES, PRIMEIRA CÂMARA, Data de Julgamento: 05/11/2020).” 

Retornado ao entendimento do STJ cabe aqui expor nova decisão proferida em acordo com a ampliação do limite de impenhorabilidade: 

“É pacífico o entendimento no Superior Tribunal de Justiça no sentido de que a impenhorabilidade da quantia de até quarenta salários mínimos poupada alcança não somente a aplicação em caderneta de poupança, mas, também, a mantida em fundo de investimento, em conta-corrente ou guardada em papel-moeda, ressalvado eventual abuso, má-fé ou fraude" (AgInt no REsp 1858456/RO, rel. Ministra REGINA HELENA COSTA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 15/06/2020, DJe 18/06/2020).” 

Portanto, é notório que o impedimento de penhora para valores até 40 salários mínimos pode ampliar as dificuldades já existentes na execução de demandas civilistas. 

Com o intuito de proteger a integridade e dignidade do devedor, o Superior Tribunal de Justiça, fez nascer novo entendimento, e, consequentemente, novos desafios na prática forense.

Vitor Hugo Lopes
Advogado. Pós Graduado em Direito Empresarial e Direito imobiliário . Sócio fundador do Vitor Hugo Lopes Advogados Associados.

Veja mais no portal
cadastre-se, comente, saiba mais

Artigos Mais Lidos

ITBI na integralização de bens imóveis e sua importância para o planejamento patrimonial

19/11/2024

Cláusulas restritivas nas doações de imóveis

19/11/2024

Estabilidade dos servidores públicos: O que é e vai ou não acabar?

19/11/2024

Quais cuidados devo observar ao comprar um negócio?

19/11/2024

A relativização do princípio da legalidade tributária na temática da sub-rogação no Funrural – ADIn 4395

19/11/2024