1. Sinopse fática
A Reclamante foi chamada para assinar o acordo de redução da jornada de trabalho prevista na égide da MPV 936/20, convertida na lei 14.020/20 em 50%, todavia, ato contínuo, cerca de dois dias após a assinatura, foi comunicada da demissão sem justo motivo pelo jurídico que entendeu por não haver surgido o direito à estabilidade já que a empregada não recebeu o respectivo benefício.
No processo a Reclamante afirma que há direito à estabilidade porque o contrato teria sido assinado em 17.4.20 e que a assinatura do contrato é suficiente para a garantia no emprego prevista no art. 10 da lei 14.020/20 (MPV 936/20).
O juízo de primeiro grau deu provimento à inicial, e o segundo grau reformou na totalidade.
2. Quanto à comunicação ao Ministério da Economia
A Reclamante alega que o direito à garantia surge no momento da assinatura do respectivo acordo, o fato de a empresa não comunicar ao ministério da economia teria sido o motivo do não recebimento do benefício.
A empresa alega que possuía o prazo de 10 dias para comunicar o ME, sendo que a demissão se deu em tempo inferior, e não tendo recebido o benefício, nem adquirido o direito de recebê-lo não há que se cogitar a respectiva garantia.
Então levantou duas possibilidades à garantia em sua defesa, a primeira, quando comunicado o ME em tempo hábil e a demissão se der após o recebimento do benefício, ou em caso de não comunicação, caso em que o empregador se sub-roga ao Estado e realiza o pagamento respectivo. Situação em que nenhuma das duas se enquadram à Reclamante.
Explicando o segundo caso, percebe-se que haveria um dupla vantagem ao Empregador que sub-rogado na obrigação de pagamento do benefício por atraso na comunicação, não realiza o pagamento, não fazendo surgir o direito à garantia, e tampouco pagando o valor devido em nítido enriquecimento sem causa.
Se o empregador não comunicar ao ME, ele mesmo deverá pagar o benefício na data do salário, fazendo surgir o direito à garantia provisória no emprego, se comunicar, a garantia surge da data do pagamento, no primeiro caso sendo indiferente se o empregador realizou o pagamento ou não, mas o empregado nesse momento teria o direito de recebê-lo.
Sendo a consequência da não comunicação no prazo de 10 dias o pagamento do benefício pelo Empregador, eximindo o Estado até o pagamento subsequente após a comunicação.
Em segunda linha defensiva, acaso houvesse o reconhecimento da estabilidade a Reclamada alegou que diferentemente dos outros tipos de estabilidade, essa possui consequência taxativa prevista na norma correspondente, ou seja, o quantum indenizatório é fixo e não ocorrem as demais regras de estabilidade quando há direitos decorrentes da postergação da relação empregatícia (aumento de aviso prévio, inclusão de horas extraordinárias habituais, adicional noturno etc.).
3. A lógica da norma – porque é justa
A Reclamada argumenta que o benefício assistencial não integra o patrimônio do Empregado, mas do Empregador, posto que é uma redução no ônus salarial da empresa, o que integra o patrimônio do trabalhador é a redução da jornada, e a garantia no emprego quando houver o recebimento do benefício (quando comunicado o ME em até 10 dias) ou da data do pagamento do salário (quando não houver comunicação ao ME), sendo-lhe subtraída uma pequena quantia de sua remuneração mensal em contrapartida.
§ 3º Caso a informação de que trata o inciso I do § 2º deste artigo não seja prestada no prazo previsto no referido dispositivo:
I - o empregador ficará responsável pelo pagamento da remuneração no valor anterior à redução da jornada de trabalho e do salário ou à suspensão temporária do contrato de trabalho do empregado, inclusive dos respectivos encargos sociais e trabalhistas, até que a informação seja prestada;
Assim o Empregado, do mesmo modo, terá recebido o benefício emergencial, ou terá adquirido o direito ao recebimento, mas não pelo Estado, e sim pelo Empregador, situação em que nada modifica a redação e aplicabilidade do art. 10.
Também não seria lícito de forma alguma simplesmente NÃO PAGAR o benefício, tampouco NÃO COMUNICAR o ME, causando o "não recebimento" e aplicando ilicitamente a consequência de não garantia provisória no emprego. A própria Reclamada levantou em seus argumentos que não houve a aquisição do direito subjetivo ao benefício, e é esse fato que efetivamente deve ser considerado.
Então ocorreu o não surgimento do direito subjetivo à garantia, restando apenas a hipótese normativa que não atingiu a condição de fato jurídico que somente seria aplicável seu consequente quando houvesse o recebimento ou aquisição do direito subjetivo ao recebimento na data do pagamento.
4. A reclamante alega ter sofrido prejuízos com a demissão sem pagamento da indenização
A Reclamante não sofreu prejuízo após a assinatura do contrato porque laborou poucos dias em jornada reduzida, os valores não foram descontados de sua remuneração, tendo apenas obtido o benefício da redução da jornada de trabalho.
Essa é a lógica normativa que determina o recebimento do benefício como fator preponderante para o surgimento da garantia provisória no emprego, a aplicação da consequência negativa ao empregado, ou seja, a redução econômica do salário (ou não, quando o empregado receber um salário-mínimo, situação em que receberá integralmente).
5. Desfecho
O TRT13 julgou à unanimidade que não tendo recebido o benefício, não há a garantia provisória no emprego, reformando a decisão de primeiro grau, acolhendo os argumentos do escritório André Colares Sociedade de Advocacia.
6. Conclusão
a. quando surge a garantia provisória no emprego?
A garantia provisória no emprego, segundo o TRT13, surge apenas com o recebimento do benefício.
Ponderamos esse entendimento para afirmar que não é o recebimento do benefício, apenas, pois quando não houver comunicação ao Ministério da Economia, a garantia surgirá na data prevista para o pagamento do benefício pelo Empregador que assume essa responsabilidade nos termos do I, do §3o do art. 5º da lei 14.020/20.
b. no caso de demissão de empregado no período de garantia
O não cumprimento do período de garantia pelo empregador não deve ocasionar acréscimos indenizatórios pela extensão do contrato de trabalho e demais reflexos, senão os já previstos na própria 14.020/20, pois a lei instituiu punição específica e exaustiva.
c. no caso de demissão de empregado no período de garantia qual será a indenização?
O valor a ser recebido pelo empregado em casos de descumprimento da garantia provisória no emprego não será calculado com base no salário, mas no valor a ser recebido com a aplicação do benefício e redução da remuneração (quando aplicável a redução) segundo o art. 10, §1º, I, II, III da lei 14.020/20
d. é o empregador obrigado a manter o contrato de redução da jornada?
Não, o empregador pode demitir o empregado a qualquer tempo antes do recebimento do benefício, quando comunicado o ME ou da data que deveria receber o benefício se não comunicado o ME.
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Primeira Turma do TRT13. Rel. Ana Maria Ferreira Madruga. Processo no 0000438-68.2020.5.13.0024. (2020).
Supremo Tribunal Federal - Tribunal Pleno. ADI 6363. (2020).
André Nóbrega Quintas Colares. Covid-19 T1E1. Nota da Anamatra Sobre a MP 936. Clique aqui (2020).
André Nóbrega Quintas Colares. Covid-19 T1E2. Planilha Automática para Aplicação da Medida Provisória 936 de 1o de abril de 2020. Clique aqui (2020).
André Nóbrega Quintas Colares. Covid-19 T1E3. Embargos de Declaração da Medida Cautelar, na Ação Direta de Inconstitucionalidade no 6.363 (MP 936). Clique aqui (2020).
Continua. Observações gerais. Clique aqui (2020).
André Nóbrega Quintas Colares. Covid-19 T1E5. STF examina hoje 16/4/20 ações contra alterações de regras trabalhistas durante pandemia. Clique aqui (2020).
André Nóbrega Quintas Colares. Covid-19 T1E6. Os acordos da MP 936 - T1E3. Clique aqui (2020).
André Nóbrega Quintas Colares. Covid-19 T1E7. Cloroquina e Hidroxicloroquina. Clique aqui (2020).
André Nóbrega Quintas Colares. Covid-19 T1E8. How is Brazil Law-Leading With Coronavirus? Shifting Saves. Clique aqui (2020).