Tem sido recorrente, nas hostes do Governo Federal, o equivocado entendimento segundo o qual o STF, na ADI 6343, impediu a União, na pessoa do Presidente da República, de governar na gestão da pandemia do coronavírus.
Esse entendimento é por demais errado, pois a Suprema Corte do Brasil reconheceu, na citada ADI, a competência comum da União, Estados, Distrito Federal e Municípios na gestão da pandemia, cabendo à primeira a coordenação geral e central desse mister.
Com efeito, compulsando o inteiro teor do acórdão do STF em tela, é fácil verificar que ele assentou, por maioria esmagadora de votos, vencido o Ministro Marco Aurélio, orientação que tem indiscutível lastro na Constituição Federal, notadamente no seu art 1º , que prevê a forma federativa de nossa república, como assim no artigo 23, II e IX ,que estabelece a competência administrativa comum da União, Estados , Distrito Federal e Municípios nas áreas de assistência pública e saúde, e nos artigos 24, XII e 30, II, que estatuem a competência concorrente e suplementar desses entes federados para, respectivamente, legislarem sobre essas matérias (assistência pública e saúde).
Vale transcrever elucidativa passagem do citado acórdão do STF que esclarece tais competências dos entes federados, pontuando que à União, principalmente na pessoa do Presidente da República, embora a competência desta e dos Estados, Distrito Federal seja comum (concorrente e suplementar para legislar), cabe a coordenação geral e central na gestão dessa pandemia que tanto assola o País, senão vejamos:
“A União tem papel central, primordial e imprescindível de coordenação em uma pandemia internacional nos moldes que a própria Constituição estabelece no SUS”
Assim, gostemos ou não da atuação do STF, é a ele que compete dizer e declarar o direito em última e definitiva instância, sendo certo que no presente caso resta evidente que a Suprema Corte firmou o entendimento de que todos os entes da Federação detêm competência administrativa comum na gestão da pandemia, bem assim, como corolário lógico, as respectivas responsabilidades administrativa, penal e cível dos agentes políticosl. Só que não se pode olvidar o papel central e primordial da União, principalmente o do Presidente da República, na coordenação , como dito no acórdão em apreço, da gestão desse problema de escala planetária.
Alguns desavisados podem, como tem ocorrido, objetar com o argumento de que os governadores e prefeitos têm responsabilidade na gestão da pandemia. Sem dúvida que sim. Com efeito -- se comprovado o suposto desvio de verbas transferidas pela União aos Estados e Municípios, como os partidários do Governo Federal têm propalado aos quatro cantos, e isso deveria decorrer, nas esferas penal e cível, de investigações policiais e de decisões transitadas em julgado do judiciário, notadamente o STF --, eles (governadores e prefeitos), ao fim e ao cabo, poderiam ser responsabilizados, respeitando-se o devido processo legal.
Ademais, a responsabilidade por crime de responsabilidade dos agentes políticos do topo, decorreria de decisões emanadas do Congresso Nacional, das Assembleias legislativas das Câmaras de Vereadores, respeitando-se, nos processos de impedimento, o devido processo legal.
O que não se pode perder de vista, na esteira do julgado em análise, é que as competências e responsabilidades dos governadores e prefeitos não afastam as do Presidente da República, que, como mencionado, é o maior responsável na coordenação da gestão da pandemia.
A CPI instaurada no Senado Federal, queiramos ou não, é um espaço, no aspecto jurídico, de apuração de fatos e pré-constituição de provas referentes a ações e omissões de agentes políticos, que servirão para o encetamento de eventuais processos penais, cíveis e por crime de responsabilidade destes.
No aspecto político eleitoral ela, a CPI, terá indiscutíveis reflexos, na medida em que poderá influenciar no pleito que se avizinha em 2022.