Recentemente, a Medida Provisória 1.040, de 29 de março de 2021, promoveu diversas mudanças na legislação, visando facilitar a abertura de empresas e desburocratizar o ambiente de negócios nacional. Dentre tais mudanças, a lei 6.404/76, conhecida como lei das Sociedades Anônimas, foi alterada, com o intuito de conferir maior proteção aos acionistas minoritários de companhias abertas, ou seja, de sociedade anônimas que detém seus valores mobiliários (ações, debêntures etc.) admitidos à negociação na Bolsa de Valores ou no Mercado de Balcão.
Vale destacar que a lei das Sociedades Anônimas já delimita em seu artigo 122, temas de competência privativa da Assembleia Geral para deliberação e, como por exemplo, podemos citar a reforma do estatuto social, a aprovação das contas dos administradores e das demonstrações financeiras, a autorização para emissão de debêntures e para pedido de falência ou concordata (atual recuperação judicial) como sendo temas que somente podem ser deliberados pela Assembleia Geral, com convocação prévia dos acionistas da companhia.
Por força da publicação da Medida Provisória, mais dois temas passaram a ser de competência privativa da Assembleia Geral, em companhias de capital aberto, quais sejam: (a) a alienação ou a contribuição de ativos (operação de dropdown, por exemplo) para outra empresa, caso o valor da operação corresponda a mais de 50% (cinquenta por cento) do valor dos ativos totais da companhia constantes do último balanço aprovado; e, (b) a celebração de determinadas transações com partes relacionadas, ou seja, com pessoas físicas ou jurídicas que sejam vinculadas à sociedade, como, por exemplo, acionistas controladores, sociedade que pertença ao mesmo grupo econômico, membros da alta gestão da companhia etc., desde que tais transações atendam aos critérios de relevância, ainda a serem definidos pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM).
As aludidas alterações vão ao encontro das recomendações propagadas pelo Código Brasileiro de Governança Corporativa, segundo o qual a Diretoria da Companhia deve levar à Assembleia Geral assuntos concernentes à boa condução dos negócios da sociedade.
Como se vê, a MP em questão trouxe maior proteção aos acionistas minoritários, ao prever que temas que possam comprometer a continuidade da atividade da sociedade de capital aberto, ou que possam causar-lhe impacto, sejam necessariamente trazidos à deliberação pelo órgão societário que pode reunir todos os acionistas: a Assembleia Geral. Assim, busca-se atender aos princípios de governança corporativa, tais como transparência, equidade, prestação de contas e responsabilidade corporativa.
De mais a mais, o prazo de antecedência da publicação do primeiro anúncio de convocação de Assembleia Geral de companhias abertas, foi ampliado de 15 (quinze) para 30 (trinta) dias, alterando-se, portanto, o inciso II do parágrafo primeiro do artigo 124, de forma que, agora, o prazo encontra-se em consonância com o prazo de publicação de demonstrações financeiras e pareceres previsto no artigo 133, que trata sobre os documentos necessários para deliberação na Assembleia Geral Ordinária anual.
Sobre a alteração do prazo acima, é importante ressaltar que a CVM já publicou a Resolução 25, de 30 de março de 2021, dispondo que as assembleias gerais já convocadas ou as que vierem a ser convocadas até 30 de abril de 2021 poderão observar o prazo de 15 (quinze) dias de antecedência de primeira convocação.
Outras alterações também foram realizadas, com impacto na governança corporativa das sociedades de capital aberto, passando a ser obrigatória a participação de conselheiros independentes na composição do conselho de administração destas companhias e vedada a acumulação do cargo de presidente do conselho de administração com o cargo de diretor-presidente ou de principal executivo da companhia, salvo se a CVM assim autorizar, em hipótese a ser regulamentada. A regra atinente à vedação do acúmulo de funções somente entrará em vigor em 360 (trezentos e sessenta) dias contados da publicação da MP, que ainda deverá ser convertida em lei.
Neste ponto, saliente-se que a B3, Bolsa de Valores nacional, já possuía como um dos pré-requisitos para a admissão das companhias no chamado “Novo Mercado” que o Conselho de Administração contemplasse, no mínimo, 2 (dois) membros ou 20% de conselheiros independentes, o que maior for, com mandato unificado de, no máximo, dois anos. O Novo Mercado é uma listagem destinada à negociação de ações emitidas por companhias que se comprometem, voluntariamente, com a adoção de práticas de governança corporativa adicionais em relação ao que é exigido pela legislação, visando estabelecer um “padrão de governança corporativa altamente diferenciado”.
Assim, a Medida Provisória 1.040 trouxe significativas mudanças na lei das Sociedades Anônimas, conferindo maior proteção ao acionista minoritário das sociedades de capital aberto e, ainda, regulamentando questões referentes à governança corporativa destas sociedades, as quais deverão se adequar às alterações promovidas na legislação, ressalvando-se que, no decorrer do processo de conversão da medida provisória em lei, podem ocorrer novas emendas e, por conseguinte, alterações na lei das Sociedades Anônimas.
O aprimoramento dos instrumentos de proteção dos acionistas minoritários objetiva provocar externalidades positivas, como credibilidade, seriedade e segurança do mercado de capitais brasileiro.