A “Cannabis”, planta oriunda do “lado” Oriental, teve suas primeiras impressões no Afeganistão e em outros locais da Ásia Central e Meridional. Estima-se que a planta tenha evoluído durante milênios, neste planeta, com passagens em diversos momentos na história da humanidade.
O Brasil, terra “indígena”, descoberta pelos Europeus, mais precisamente pelos Portugueses em 22 de abril de 1500, pelo líder das Navegações “Pedro Álvares Cabral”, possui influência direta em relação à tese estabelecida. É neste local que, aproximadamente 521 anos atrás, foi “descoberto” pelas influências Europeias, tendo em vista que, em outras regiões do planeta, já existiam condutas civilizatórias pré-estabelecidas e homogêneas.
Enquanto isso, no resto do mundo, havia grandes movimentações, como as navegações, sistemas econômicos estruturados, Igreja Católica em ascensão, a formação do Estado, sistema jurídico, político e legislativo, tudo conforme a evolução das necessidades humanas nos determinados locais do planeta.
De outro plano, temos a evolução da planta e o uso da “Cannabis” em determinados meios econômicos. Ressalta-se que a “Cannabis” é um gênero de angiospermas que inclui três variedades diferentes na família: a “Cannabis Sativa”, a “Cannabis Indica” e a “Cannabis Ruderalis”.
Sendo uma planta totalmente versátil, a “Cannabis” começa a integrar reciprocamente às atividades humanas, foi usada para tecelagem, fabricação de papéis, utilizada nas navegações, mais precisamente nas “velas” e “cordas” dos navios da época. Foi, também, fabricado o primeiro livro em papel, produzido em grandes escalas, referindo-se a Bíblia de Gutemberg, o título impresso. Já era usada por Shen-Nung, governante e herói chinês, para fins medicinais, em aproximadamente 2.900 anos antes de Cristo.
Existem estudos da história da Bíblia, por teólogos que realizam traduções do hebraico que, em algumas passagens bíblicas, existe a menção da “Cannabis”, como por exemplo, em Êxodo 30: 22-23: “onde Moisés foi instruído por Deus a ungir a tenda do encontro e todo seu mobiliário com o óleo especialmente preparado”. O óleo ungido seria a “k-aneh-bosem”, em que tradutores afirmam que o termo refere-se a “Cannabis”. Ou seja, a planta pela qual até hoje se abordam discussões, sempre esteve ao lado do homem, de maneira muito positiva e harmônica, sendo uma criação da natureza para o homem desfrutar de sua versatilidade com sabedoria.
Ocorre que, o homem está evoluindo no planeta durante milhares de anos, sendo que existem estudos que apresentam nosso surgimento cerca de 350 mil anos atrás, havendo os primeiros registros na região leste da África, e que adquiriu comportamento moderno nos últimos 50 mil anos. Evoluímos ao “homo sapiens sapiens”, gênero pelo qual nosso primeiro ancestral desconhece.
Mais precisamente, no último século, as situações econômicas, formas de Estado, divisões políticas, modo de interação humano, foi mudando gradativamente, até chegarmos ao tempo atual. Dotados hoje, de tecnologia avançada, comparando com nossos ancestrais, é certo o retrocesso e o estigma que implantamos não a “Cannabis”, mas as relações humanas heterogêneas.
É de suma importância ressaltar o local pelo qual esta tese está sendo elaborada, num país considerado de terceiro mundo, desigual por natureza etimológica. A influência dos Estados Unidos da América em nosso ordenamento Estatal, tendo notória a participação deste país, em específico, na guerra às drogas, ao combate do comunismo, a ditadura de 1964 e a forte coerção nos países latino-americanos.
A primeira lei sobre a criminalização da “Cannabis” no Brasil foi em 1830, pela Câmara do Rio de Janeiro, antes mesmo da abolição da escravidão, em 1888. Pela redação da lei imposta, era claro a discriminação e o racismo praticado, sendo que o “pito de pango” (“Cannabis”) foi proibido, juntamente com outras culturas e hábitos do povo preto, como por exemplo, a capoeira, hoje, já considerada como patrimônio cultural.
Conforme se apresenta neste artigo em parágrafo já dedicado, a “Cannabis” é uma planta extremamente versátil, liderava o mercado econômico dos povos antigos. No entanto, após a revolução industrial, as empresas não viam rentabilidade na planta, mercados, estes, farmacêuticos, grandes empresas de algodão, a indústria do tabaco, do álcool.
Essa influência, juntamente com o uso da planta associado às classes mais pobres da sociedade, fez com que o Estado omitisse e retroagisse, criminalizando assim, o seu uso, para todo e qualquer meio.
O retrocesso e o interesse “oculto” do Estado são as chaves para entendermos este assunto, pois, mesmo após as evoluções jurídicas, legislativas e executivas, com a Constituição de 1988, estabelecendo em seu art. 5º caput e seus incisos XIII, XVIII, XXXII, XLII, juntamente com o art. 196 da lei Maior.
Em breve sintetização da Carta Magna de 1988, em suma, o art. 5º refere-se aos direitos e garantias fundamentais, expele em seu bojo, o direito a crescente, quanto ao direito do exercício do trabalho, ofício ou profissão, sendo que este direito deveria amparar os agrônomos responsáveis pelo cuidado, crescimento da planta, sendo um meio de desabilitar os cidadãos brasileiros desempregados, que hoje, no Brasil, encontra-se em número expressivo, de 13,9 milhões, conforme pesquisa do IBGE, datado do 4ª trimestre de 2020. A criação de associações sem fins lucrativos, para exerceram a função social pré-estabelecida de unir os cidadãos para determinada causa, sendo que hoje, há pouco incentivo para políticas públicas voltadas às associações que usam a “Cannabis” para produzir remédios aos associados, normalmente, com doenças que não são tratadas por alopáticos encontrados no mercado, como por exemplo a fibromialgia, convulsões, dores musculares, ajudando até mesmo em pacientes cancerígenos que estão sendo tratados pela quimioterapia, alegado pelos pacientes, que existe crescente melhora na autoestima do mesmo, diminuindo as dores, a falta de apetite, propiciando assim, vida digna ao enfermo. A defesa do consumidor, sendo que o usuário de “Cannabis”, por se tratar de uma droga ilícita, não possui qualquer direito estabelecido, prejudicando assim, o usuário que, muitas vezes, não sabe realmente o que está consumindo e, por fim, mas não menos importante, a prática do racismo, como crime inafiançável e imprescritível, demonstrando assim, pouca validade na discussão e penalização do porte de “Cannabis”, onde, muito normalmente nos casos práticos, o individuo menos favorecido, preto, residente na favela, é denunciado e preso, por portar poucas gramas da planta.
O que sugere para a discussão entre o art. 196 da CF/88 e a lei de drogas, 11.343/06, que encontram-se em discordância, já que por um lado a lei maior assegura o direito à saúde, como um dever do Estado e um direito de todos, demonstrando assim, a falta de incentivo para inserir a planta em uma categoria medicinal, tratando os usuários, não só da “Cannabis”, mas os usuários de drogas, como uma questão de saúde e não por um meio coercitivo, conforme demonstrado na lei de drogas 11.343/06.
Fato é que não existe uma quantidade de “Cannabis” que transforme o indivíduo em usuário ou traficante, o que se entende, pacificamente pela doutrina, é de que as diferenças entre o usuário e o traficante, se estabelecem pelas relações econômicas, sendo que o traficante de entorpecentes possui um rol de características próprias, na lei, para exercer aquela atividade e vender o produto com fins lucrativos, sendo que, no caso realístico, a apreensão de balança, dinheiro, quantidades grandes ou até mesmo pequenas da droga, o levam a interpretação jurídica de que o mesmo exerce a atividade criminosa, sendo que para o usuário, a “Cannabis”, não possui objeto típico para exercício da venda, mas sim, para consumo próprio, tornando assim, o objeto atípico.
Os artigos que expressam essa discussão abordada encontram-se na lei de drogas, 11.343/06, dedicado em capítulos para usuários e traficantes, sendo que para os primeiros, a pena será a advertência de um juiz, prestação de serviços à comunidade e medidas educativas, já para o segundo, a pena será de 5 a 15 anos de reclusão e pagamento de 500 a 1.500 dias-multa, sendo encontrados na sequência, dos artigos 28, incisos, I, II e III e art. 33, caput, da referida lei.
O que ocorre em nosso país é que seguimos o modelo de encarceramento dos Estados Unidos da América, os dados surpreendem o número de 900.000 pessoas presas, sendo a taxa de 30% dos encarcerados por tráfico de drogas, muitos deles, usuários, pobres, de baixa renda, que são vítimas do Estado coercitivo.
A lei de drogas é uma lei que encarcera um determinado estereótipo já estabelecido, sendo um estigma fundamental para interpretação dos fatos concretos. O estereótipo do usuário de “Cannabis” no Brasil decorre de duas vertentes, o dependente como um jovem de classe média, apático e doente, já o traficante, como o individuo de baixa renda, preto, como o criminoso. O que, por própria ignorância do espectro social da sociedade, faz com que mais da metade da população brasileira seja “observada com outros olhos” pelo Estado.
A reflexão pretendida com o artigo é movimentar o senso crítico da sociedade, sendo que a maconha é a droga ilícita mais consumida do mundo, após as drogas lícitas, como o álcool e o tabaco. O mercado da “Cannabis” movimentaria a economia do país, como demonstram os países que hoje já legalizaram, com margens de lucro, empregabilidade e diversidade sustentável no mercado.
Cada vez mais estaremos inclinados ao assunto, sendo que a Descriminalização da Maconha no Brasil é um tema comum de discussões, sendo próxima a sua legalização. O que não podemos deixar de lado é como vamos proceder com a sua descriminalização, e também, a reparação histórica quanto à população preta do país.
O incentivo voltado às políticas públicas relacionadas ao tema sobre drogas no país é precário e carecedor de dados científicos. O Estado Democrático de Direito é personalidade “abstrata” que representa o Poder do Povo, dentro da República Democrática. A conjunção de leis e normas deve observar ao espectro da necessidade de uma composição jurídica para garantir direitos e deveres às necessidades da sociedade e, o tema pretendido não seria uma pauta que deveria ser tratada com responsabilidade e normatização?
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Artigo “A face oculta da droga”, Rosa del Olmo – editora Reavan – ano 1990
Artigo/Dissertação: “Tráfico de drogas: percepções e concepções de seus agentes na cidade de Ribeirão Preto, Ana Lúcia Guimarães – ano 2004
Disponível aqui.
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