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Controle de constitucionalidade – Modulação de efeitos das decisões proferidas pelo STF em matéria tributária

Às vésperas do julgamento dos Embargos de Declaração de um dos casos tributários que mais impôs desgaste ao STF, a modulação dos efeitos das decisões proferidas pela corte volta a ficar em evidência.

27/4/2021

Por diversas oportunidades o Supremo Tribunal Federal – STF tem proferido decisões modulando os efeitos de suas decisões com base nos mais diversos fundamentos, financeiros, políticos e até mesmo para dar interpretação constitucional a certos dispositivos normativos.

Por esse caráter volátil, a modulação dos efeitos das decisões proferias pelo STF vêm sendo amplamente debatida e contestada, principalmente nos últimos anos.

Em um mundo ideal, a modulação dos efeitos de efeitos tem o intuito de garantir a segurança jurídica e proteger o interesse social e é adotada para determinar que uma decisão do STF tenha eficácia prospectiva ou a partir de uma data estabelecida pelo tribunal, quando um entendimento do STF modifica o posicionamento anterior do tribunal ou declara determinada lei inconstitucional.

Com o advento do CPC/15, a disciplina da modulação de efeitos consta no § 3º, do artigo 927, onde se lê que "na hipótese de alteração de jurisprudência dominante do STF e dos tribunais superiores ou daquela oriunda de julgamento de casos repetitivos, pode haver modulação de efeitos da alteração no interesse social e no da segurança jurídica". Importante registrar que, antes da edição do novo CPC, a positivação deste instituto previa a modulação de efeitos apenas na Ação Direta de Inconstitucionalidade e na Ação Declaratória de Constitucionalidade.

No que tange às questões tributárias, o STF tem lançado mão da modulação dos efeitos de suas decisões, inclusive com maior frequência registrada em 2020, em 21.1.21 foi veiculada notícia no jornal Valor Econômico1 indicando que, em meio à pandemia, os ministros do STF demonstraram estar mais sensibilizados com a situação das contas públicas e passaram a propor com mais frequência a modulação de efeitos para casos tributários, indicando que o instituto foi adotado em três casos já encerrados e proposto em outros três em andamento, causando preocupação aos contribuintes.

Conforme já amplamente divulgado e objeto de diversas notícias, artigos acadêmicos de opinião, talvez o julgamento mais emblemático da história recente envolvendo a temática foi incluso em pauta para julgamento no próximo dia 29 de abril, qual seja, os Embargos de Declaração opostos pela Advocacia Geral da União (AGU) no Recurso Extraordinário 574.706, que decidiu pela exclusão do Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) da base de cálculo do PIS – Programa de Integração Social e da  COFINS – Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social.

Por intermédio de oposição desses embargos, além de alegar erro material, omissão e obscuridade na decisão exarada, ] a Fazenda inovou ao requerer que os efeitos da declaração de inconstitucionalidade passem a valer apenas após o julgamento dos Embargos de Declaração opostos, o que traria uma situação de maior conforto financeiros à União, já que isso à autorizaria a não restituir os valores por ela exigidos, de maneira inconstitucional, sob a justificativa de grande impacto financeiro e orçamentário, além de supostas  dificuldades operacionais para a aplicação retroativa do entendimento.

Não é demasiado sustentar que o caso em questão talvez seja um dos casos tributários que mais impôs abrasão ao STF e a demora no desfecho da questão só o faz aumentar.

O instituto da modulação traz algumas questões que merecem certa atenção e que podem impactar o tal esperado julgamento, destaca-se algumas.

A primeira guarda relação com o disposto no § 3º, do artigo 927 do CPC, que, conforme já disposto mais acima, imputa aos Tribunais observar, na hipótese de alteração de jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal e dos tribunais superiores ou daquela oriunda de julgamento de casos repetitivos, a possibilidade de haver modulação dos efeitos da alteração no interesse social e no da segurança jurídica.

Referido dispositivo merece especial atenção ao presente caso, isto porque o RE 574.706, ao firmar entendimento excluindo o ICMS da base de cálculo do PIS/Cofins, não representou mudança de entendimento capaz de justificar, com base no § 3º do art. 927 do CPC, qualquer modulação de seus efeitos.

Muito pelo contrário, a posição exarada pelo STF no julgamento apenas veio confirmar um entendimento que o Tribunal Pleno havia adotado anteriormente ao julgar o RE 240.780, que, diferentemente do RE 574.706, não possuía repercussão geral reconhecida.

A segunda é com relação ao quórum necessário para julgamento destes Embargos de Declaração.

Dispõe a lei 9.868, de 10 novembro de 1999, no capítulo IV, que trata da decisão na ação direta de inconstitucionalidade e na ação declaratória de constitucionalidade em seu artigo 27 que, ao declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo, e tendo em vista razões de segurança jurídica ou de excepcional interesse social, poderá o STF, por maioria de dois terços de seus membros, restringir os efeitos daquela declaração ou decidir que ela só tenha eficácia a partir de seu trânsito em julgado ou de outro momento que venha a ser fixado.

Ou seja, para restringir os efeitos da declaração inconstitucionalidade ou decidir que ela só tenha eficácia a partir de seu trânsito em julgado ou de outro momento que venha a ser fixado, é necessário um quórum qualificado para que essa decisão seja tomada.

Uma preocupação que tem sido constantemente lembrada neste complexo contexto do julgamento dos aclaratórios fazendários, muito em parte pela mudança na composição da corte, é a possível invocação de um entendimento exarado em uma questão de ordem apresentada no RE 638.115, na qual o STF decidiu que o quórum de maioria absoluta de 6 votos para a modulação dos efeitos de decisões proferidas em sede de recurso extraordinário é suficiente e não o quórum qualificado de 8 votos.

Contextualizando, a controvérsia inicial do RE 638.115 versava sobre a constitucionalidade (ou não) da incorporação de quintos decorrente do exercício de funções comissionadas no período compreendido entre a edição da lei 9.624, de 2 de abril de 1998, e a Medida Provisória (MP) 2.225-45, de 04 de setembro de 2001, em razão da ausência de lei que a amparasse.

Quando do julgamento de mérito do recurso, o STF determinou a cessação do pagamento dos valores já incorporados em todas as hipóteses. Contra essa decisão, foram opostos diversos embargos de declaração que requeriam a modulação dos efeitos para resguardar o direito dos servidores que já possuíam títulos decorrentes de processos judiciais transitados em julgado, decisões administrativas proferidas há mais de cinco anos ou demandas ainda em curso.

Ao julgar um destes embargos de declaração, o Plenário do STF reconheceu indevida a cessação imediata do pagamento dos quintos quando fundado em decisão judicial já transitada em julgado. Quanto às verbas percebidas em razão de decisões administrativas e de decisão judiciais sem trânsito em julgado, modulando os efeitos para que o pagamento seja mantido até a futura absorção integral por reajustes futuros.

Essa modulação de efeitos foi confirmada pelo STF no julgamento do sétimo e último embargos de declaração opostos. Contudo, neste julgamento, o presidente da corte à época, ministro Dias Toffoli, defendeu que, ao contrário do que ocorre no julgamento de súmulas vinculantes e ações de controle abstrato, o caráter vinculante da decisão em recurso extraordinário, com repercussão geral em que não se declara inconstitucionalidade de ato normativo alcançará somente o Poder Judiciário e que não vincularia os demais poderes e instituições, o que faria com que não se aplicasse a esses casos o quórum qualificado de oito votos exigido nas ADIns e ainda pontou que tampouco o CPC no já citado art. 927, § 3º, traria tal exigência.

Assim,  por maioria de votos, a Corte acolheu a proposta trazida pelo presidente de que, para a modulação dos efeitos de decisão em julgamento de recursos extraordinários repetitivos, com repercussão geral, nos quais não tenha havido declaração de inconstitucionalidade de ato normativo, basta o quórum de maioria absoluta (seis votos) dos membros do STF.

Porém, a controvérsia inicial do RE 638.115 versava sim sobre a constitucionalidade (ou não) dos quintos decorrentes do exercício de funções comissionadas no período compreendido entre a edição da lei 9.624, de 02 de abril de 1998, e a Medida Provisória (MP) n. 2.225-45, de 4 de setembro de 2001, em razão da ausência de lei que a amparasse e o STF consignou entendimento de que o quórum reduzido para a modulação em sede de recurso extraordinário só se aplicaria diante da (a) inexistência de uma declaração de inconstitucionalidade e (b) se a decisão tomada repercutir seus efeitos apenas sobre o Sistema de Justiça, num natural pacificação ou orientação jurisprudencial.  

Acontece que ao declarar a necessidade de exclusão do ICMS na base de cálculo do PIS/Cofins, o STF declarou a inconstitucionalidade de uma prática executada pela Administração Tributária, abrindo espaço para questionamentos neste sentido.

Não há como prever o desfecho que o STF dará à questão, em que pese os sinais apontarem para uma possível derrota dos contribuintes, a pressão imposta ao órgão é imensa e, a nós, cabe apenas aguardar o dia 29 de abril para ter uma visão concreta dos impactos aos contribuintes, ao fisco e como a modulação será trabalhada neste caso.

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Priscilla Caroline Coelho
Associada do escritório Ayres Ribeiro Advogados. Pós-graduada em Direito Tributário Empresarial e Processo Tributário pela PUC/PR. Membra efetiva da Comissão Especial de Contencioso Tributário da OAB/SP e da Câmara de Comércio França - Brasil.

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