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Venda direta de etanol hidratado combustível (EHC) por produtores para postos revendedores: Desafios e impactos para o setor

Pela atual legislação, a tributação da comercialização do EHC pelo PIS/COFINS é concentrada nos produtores, distribuidores e importadores, com o recolhimento dessas contribuições sendo realizado por metro cúbico comercializado.

23/4/2021

A Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado Federal realizou uma audiência pública em 6 de abril de 2021, com o objetivo de discutir a venda direta de etanol hidratado combustível (EHC) no Brasil. A Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) e o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE) participaram do debate. Na ocasião, os parlamentares abordaram a possiblidade de não apenas distribuidores, mas também produtores, de EHC comercializarem o produto diretamente com postos revendedores. A ideia foi trazer soluções que permitam um maior dinamismo para o setor, buscando reduzir custos e gargalos logísticos. O Senado Federal tem um projeto de decreto legislativo com o objetivo de suspender a regulamentação da ANP que hoje restringe a comercialização direta do EHC.

Durante o evento, o diretor-geral da ANP, Sr. Rodolfo Henrique de Saboia, se mostrou favorável à liberação da venda direta – hoje vedada nos termos da Resolução ANP 43/09. Vale destacar que a Superintendência de Distribuição e Logística (SDL) da ANP já havia se posicionado de forma semelhante. Na Nota Técnica 2/20, a SDL havia concluído que o mercado de combustíveis seria amplamente beneficiado com a liberação da venda direta, trazendo benefícios aos consumidores finais.

O diretor-geral destacou, contudo, que a eventual retirada da restrição regulatória para que produtores possam comercializar diretamente com revendedores deve ser precedida de ajustes na legislação tributária. Vale mencionar que essa restrição é um desdobramento da política fiscal adotada pelo Governo Federal para os combustíveis em geral. Pela atual legislação, a tributação da comercialização do EHC pelo PIS/COFINS é concentrada nos produtores, distribuidores e importadores, com o recolhimento dessas contribuições sendo realizado por metro cúbico comercializado. As vendas de EHC realizadas por revendedores varejistas, portanto, estão hoje desoneradas do PIS/COFINS. O objetivo dessa estrutura atual concentrada de tributação é facilitar a fiscalização e combater a sonegação de tributos na comercialização de combustíveis – na medida em que reduz a quantidade de empresas sujeitas ao pagamento do PIS/COFINS.

Além da mudança nas formas de fiscalização e recolhimento, a admissão da venda direta também poderia ocasionar dois efeitos adicionais. Primeiro, uma potencial perda de arrecadação, na medida em que operações hoje intermediadas por distribuidores deixariam de ser realizadas, e não poderiam ser compensadas com o aumento da carga tributária dos produtores – que também estão sujeitos a limitação na legislação tributária. Segundo, um ganho competitivo desbalanceado para aqueles revendedores que conseguissem adquirir o EHC diretamente do produtor em relação àqueles que, por questões logísticas, só conseguissem continuar adquirindo de distribuidores.

Nesse contexto, a ANP propôs uma solução paliativa alternativa, que independeria da mudança na legislação tributária em vigor: a criação da figura do “Distribuidor de Etanol Vinculado”. Essa nova entidade seria uma pessoa jurídica nova, controlada pelo produtor de EHC, e com autorização de comercializar o EHC junto à rede varejista. Pela proposta da ANP, esse Distribuidor de Etanol Vinculado poderia adquirir o produto apenas do seu produtor controlador, e não precisaria cumprir todos os requisitos exigidos de um distribuidor geral de combustíveis. Do ponto de vista tributário, contudo, ele estaria sujeito à mesma tributação aplicável aos demais distribuidores de combustíveis líquidos. Essa alternativa, se implementada, portanto, não deveria representar impacto negativo na arrecadação ao longo da cadeia produtiva.

A proposta alternativa da ANP, contudo, não atende a todos os anseios de mudança. Na prática, ela acaba criando um novo intermediador entre o produtor e o revendedor varejista, o que talvez possa não atender ao objetivo inicial de simplificar a cadeia de comercialização do EHC.

As discussões deverão seguir nas próximas semanas. Nós continuaremos acompanhando. 

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*Este artigo foi redigido meramente para fins de informação e debate, não devendo ser considerado uma opinião legal para qualquer operação ou negócio específico. 

 

© 2020. Direitos Autorais reservados a PINHEIRO NETO ADVOGADOS

Raphael Moraes Paciello
Advogado. Sócio de Pinheiro Neto Advogados.

Felipe Bernardelli
Advogado. Associado de Pinheiro Neto Advogados.

Carlos Tomaz Ribeiro
Advogado. Associado de Pinheiro Neto Advogados

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