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Multa deve ser revista a qualquer tempo

Sempre que a multa coercitiva se apresentar insuficiente ou excessiva, o magistrado possui o poder/dever de adequá-la, se valendo dos princípios da razoabilidade e proporcionalidade.

15/4/2021

A Corte Especial do STJ (Superior Tribunal de Justiça), em sessão realizada no dia 7 de abril de 2021 e por maioria de votos, deu provimento ao recurso de Embargos de Divergência em Agravo de Recurso Especial 650.536 para permitir que as multas fixadas com base no artigo 537 do Código de Processo Civil possam ser revistas a qualquer momento processual, sob a ótica dos princípios da razoabilidade, proporcionalidade e da vedação de enriquecimento sem causa. O acórdão de relatoria do Ministro Raul de Araújo estabeleceu que a multa coercitiva (I) não possui caráter punitivo; (II) não está sujeita à coisa julgada, preclusão pro judicato ou estabilização; (III) deverá servir como instrumento de coerção para cumprimento de obrigações de fazer e não fazer e não como penalização e (IV) será sempre revista quando se mostrar insuficiente ou excessiva.

O julgamento em questão guarda coerência ao julgamento do Tema 706 de recursos repetitivos que já havia estabelecido que a decisão que fixa astreintes não preclui, devendo ser revista sempre que se mostrar inefetiva. A decisão que determina a imposição de multa pecuniária possui em sua constituição uma espécie de clausula rebus sic stantibus, possibilitando que o magistrado busque constante aderência da medida coercitiva à efetividade.

Assim, sempre que a multa coercitiva se apresentar insuficiente ou excessiva, o magistrado possui o poder/dever de adequá-la, se valendo dos princípios da razoabilidade e proporcionalidade. Até mesmo porque o Código de Processo Civil prevê uma série de outras medidas executivas, de sub-rogação e de coerção, que funcionam como um verdadeiro cardápio colocado à disposição dos magistrados para que efetivem a tutela específica requerida nos autos ou ao menos assegurem, em última alternativa, o equivalente resultado prático.

No caso específico que ensejou o recente pronunciamento do Superior Tribunal de Justiça, o acórdão constatou evidente desproporção entre os valores pleiteados no processo e o valor que seria alferido à título de multa. A multa fixada superava em 40 (quarenta) vezes à condenação principal. O posicionamento do Superior Tribunal de Justiça, além de corrigir uma inegável falta de razoabilidade no meio escolhido pelo Judiciário para assegurar efetividade às suas decisões, descortina uma série de outros caminhos executivos mais efetivos que poderiam ser eleitos pelos magistrados.

A entrega de uma tutela jurisdicional efetiva necessariamente deve observar a utilização do meio executivo mais adequado para obrigar o executado a cumprir decisões judiciais que gerem a satisfação da tutela específica do exequente. A multa, como instrumento lateral, não pode assumir o protagonismo da tutela jurisdicional.

Hugo Filardi
Bacharel em Direito pela UFRJ. Doutor e mestre em Direito pela PUC/SP. Sócio do escritório SiqueiraCastro.

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