Migalhas de Peso

Alterações na lei de recuperação judicial e falência brasileira: Apresentação de plano alternativo pelos credores

A novidade da reforma consiste na possibilidade de os credores apresentarem um Plano Alternativo, sem necessidade de concordância da Recuperanda e sem vinculação ao Plano de Recuperação Judicial originariamente proposto.

13/4/2021

No dia 24/12/20, foi sancionado, com vetos, pelo presidente da República, o PL 4.458/20, convertido na lei 14.112/20, a qual trouxe significativas alterações na Lei de Recuperação Judicial e Falência, lei 11.101/05, as quais passaram a viger no dia 23/1/21. No presente artigo abordaremos a inovação na legislação brasileira, quanto à possibilidade de apresentação de um Plano de Recuperação Judicial pelos credores, aqui denominado de Plano Alternativo.

Parte do procedimento em relação ao Plano de Recuperação Judicial se manteve, ainda com as alterações. A novidade da reforma consiste na possibilidade de os credores apresentarem um Plano Alternativo, sem necessidade de concordância da Recuperanda e sem vinculação ao Plano de Recuperação Judicial originariamente proposto.

Essa possibilidade se fará presente em dois momentos: (I) caso o Plano de Recuperação Judicial da Recuperanda seja negado na assembleia geral de credores sem possibilidade de cramdown; ou (II) caso transcorra o stay period– que, após a reforma, poderá ser estendido uma única vez (artigo 6º, §§ 4º e 4º-A da lei 11.101/05) – sem que o Plano de Recuperação Judicial da Recuperanda tenha sido aprovado.

A Recuperanda, então, permanece com iniciativa prioritária de apresentar o Plano de Recuperação Judicial, mas não mais exclusivo como antes da reforma.

A apresentação do Plano Alternativo pelos credores, em qualquer hipótese, dará início a um novo stayperiod de 180 dias, conforme previsão do artigo 6º, §§ 4º e 4º-A da lei 11.101/05.

Assim, no prazo de 30 dias, os credores deverão apresentar o Plano Alternativo; caso o Plano Alternativo tenha sido precedido por uma assembleia geral de credores suspensa para deliberação, o que será a hipótese mais comum, então o Plano Alternativo deverá ser posto em votação no prazo de 90 dias, contados da data em que a assembleia geral de credores tiver sido instalada e suspensa.

Para que o Plano Alternativo apresentado pelos credores seja posto em votação, será necessário o preenchimento dos requisitos previstos nos incisos I, II e III do art. 53, os quais consistem na discriminação dos meios de recuperação que serão empregados, a demonstração da viabilidade econômica da Recuperanda, o laudo econômico-financeiro e o laudo de avaliação dos bens e ativos da Recuperanda.

Parece-nos que os credores poderão se valer das informações prestadas no Plano de Recuperação Judicial da Recuperanda, fazendo as adaptações necessárias para o Plano Alternativo.

Entretanto, nos casos que a Recuperanda não apresentar Plano de Recuperação Judicial ou estes requisitos não estejam devidamente preenchidos no seu Plano de Recuperação Judicial – hipótese não comum na praxe forense – os credores terão certamente dificuldade para preencher tais requisitos no Plano Alternativo sem cooperação da Recuperanda.

Além disso, para que o Plano Alternativo dos credores seja posto em votação,será necessário que este venha instruído com uma declaração de apoio por escrito dos credores que representem mais de 25% de todos os créditos sujeitos à recuperação ou,ao menos, 35% dos créditos dos credores presentes na AGC, na qual se deliberou pela apresentação do Plano Alternativo.

Mais que isso, os credores que anuírem e votarem favoravelmente ao Plano Alternativo deverão isentar as garantias pessoais prestadas por pessoas naturais em relação aos créditos sujeitos à Recuperação Judicial (artigo 56, §6º da lei 11.101/05).

Isso porque,todos os credores que assinarem a declaração de apoio ao Plano Alternativo ou daqueles que votarem favoravelmente ao Plano de Recuperação Judicial em questão, deverão renunciar às suas garantias fidejussórias em relação aos coobrigados, pessoas naturais.Ao nosso ver, este é um dos pontos sensíveis da reforma, o qual poderá desencorajar os credores de tomarem a iniciativa de apresentação do Plano Alternativo ou apoiá-lo.

Além disso, consta ainda na reforma da lei 11.101/05 que o Plano Alternativo apresentado pelos credores poderá prever a capitalização dos créditos, inclusive com alteração do controle da sociedade da Recuperanda, permitindo o exercício do direito de retirada pelo sócio da Recuperanda (§ 7º do art. 56 da lei 11.101/05).

Pode-se observar que o Legislador, ainda que de maneira tímida, trouxe dispositivos visando a otimizar a negociação entre Devedor e credores.

A possibilidade de apresentação do Plano Alternativo pelos credores, ainda que acompanhada de alguns ônus, certamente ampliará o horizonte de negociações entre credores e Devedor e poderá ser interpretado como um equalizador de forças entre eles, pois aquele Devedor que não buscar seus credores para adequar os termos de seu Plano de Recuperação Judicial, estará suscetível não tão somente à convolação de sua recuperação judicial em falência, o que já existia na lei 11.101/05, mas também à apresentação do Plano Alternativo pelos seus credores.

Aliás, nos EUA, já foi observado que os números de Plano Alternativos e Involuntary Petition não são elevados, o que não quer dizer que tais institutos não sejam úteis ao procedimento de reorganização financeira americano. Entende-se que apenas a mera possibilidade de apresentação de Plano Alternativo e de Involuntary Petition, incentivam os devedores a negociar os melhores termos possíveis com os seus credores, para que não percam o controle do seu processo de reestruturação.

Vale destacar dois pontos não esclarecidos pela reforma: (I) a possibilidade de apresentação de mais de um Plano Alternativo pelos credores; e (II) a possibilidade de aprovação do Plano Alternativo por cramdown.

Seja como for, a alternativa trazida pela lei 14.112/20 de apresentação do Plano Alternativo pelos credores, em caso de rejeição do Plano de Recuperação Judicial, é de grande valia para o procedimento e para o alcance do ponto de equilíbrio dos interesses das Partes.

Desta forma, são notórias as diversas alterações trazidas pela lei 14.112/20 às disposições já existentes envolvendo o plano de soerguimento das Recuperandas, com destaque à possibilidade de apresentação do plano de recuperação judicial pelos credores, bem como à flexibilização das formas de votação para aprovação do Plano de Recuperação Judicial, as quais trazem à lei brasileira uma modernização e um cenário com maior paridade de forças entre de credor e Recuperanda.

Vitor Lopes
Sócio diretor do escritório Villemor Amaral Advogados, com atuação na área contenciosa e consultiva em Direito Civil, Empresarial, Bancário, Falências e Recuperações Judiciais. Mestre em processo civil pela UERJ.

Fernando Lima Amaral
Sócio do escritório Villemor Amaral Advogados, com atuação na área contenciosa e consultiva em Direito Civil, Empresarial, Bancário, Falências e Recuperações Judiciais. Mestre e Doutorando em direito comercial pela PUC/SP.

Isadora Pereira
Associada do escritório Villemor Amaral Advogados, com atuação na área contenciosa em Direito Civil, Empresarial, Falências e Recuperações Judiciais.

Veja mais no portal
cadastre-se, comente, saiba mais

Artigos Mais Lidos

Decisão importante do TST sobre a responsabilidade de sócios em S.A. de capital fechado

20/12/2024

Planejamento sucessório e holding patrimonial: Cláusulas restritivas societárias

20/12/2024

As perspectivas para o agronegócio brasileiro em 2025

20/12/2024

A sua empresa monitora todos os gatilhos e lança as informações dos processos trabalhistas no eSocial?

20/12/2024

O futuro dos contratos: A tecnologia blockchain e o potencial dos smart contracts no Brasil

20/12/2024