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Contrato oneroso de licença e a expiração do prazo de vigência da patente

A orientação é pela não incidência contratual de royalties após a expiração da patente.

5/4/2021

INTRODUÇÃO

Em um período no qual se discute a constitucionalidade do prazo mínimo de vigência das patentes – parágrafo único do artigo 40 da LPI - matéria da ADIn 55291, faremos uma abordagem de uma interessante questão transacional sobre esta espécie de direito.

Ainda sobre a ADIn, a presidência do STF chegou a antecipar o julgamento da matéria em função da atual conjuntura sanitária decorrente da pandemia do covid-192.

Dependendo do resultado do julgamento, caso o parágrafo único do artigo 40 da LPI seja decretado inconstitucional sem algum tipo de modulação, diversas patentes irão expirar causando um efeito fulminante nos contratos de licença referentes a estes direitos concedidos com observação dos prazos mínimos contidos no dispositivo.

E este será o ponto abordado. A temporariedade é um princípio basilar da proteção patentária e entenderemos melhor seus fundamentos no decorrer deste texto, mas e quando as partes firmaram contratos de licença e o direito foi extinto? Poderiam as partes contratar além do prazo da própria proteção?

A questão em análise se debruça pontualmente sobre a questão da prevalência ou não da autonomia da vontade contratual das partes versus direitos fundamentais, interesses públicos, e seus reflexos.

A priori, cumpri-nos salientar que o instituto do licenciamento de uso de patentes é um dos mecanismos que podem suprir o critério da finalidade social da Propriedade Intelectual.

Uma vez que nosso próprio sistema constitucional, através de cláusula finalística, sobrepõe o interesse social e o desenvolvimento tecnológico e econômico do país aos interesses dos próprios titulares dos direitos, a propriedade sobre uma patente gera o dever de usá-la, seja diretamente pelo próprio titular, seja indiretamente através de contratos onerosos ou não.

A patente é um direito conferido pelo Estado, de excluir terceiros da exploração de determinada tecnologia, que estaria justificado não só pelo direito natural à patente, mas também pela ideia de que a possibilidade do monopólio estimula a divulgação do conhecimento. Isto contribui com o desenvolvimento tecnológico da sociedade. (D. B. BARBOSA, 2020)

O sistema patentário faz muito sentido quando se entende que direitos imateriais, como é o caso dos conhecimentos tecnológicos, são bens não rivais (P. M. N. BARBOSA, 2016), e que é através do direito de exclusiva concedido pelo Estado, oponível contra todos (erga omnes), que o inventor tem a possibilidade de ser recompensado por sua criação e incentivado a imprimir novos esforços inovadores.

Importante destacar que este direito de exclusiva, apesar de bem fundamentado pela teoria da falha de mercado, afeta outros direitos constitucionais como o da livre concorrência, que deve ser a regra enquanto aquele a exceção. (D. B. BARBOSA, 2010)

Sendo assim, a concessão da exclusividade pelo Estado é uma forma de intervenção na livre iniciativa, uma vez que o mercado, por si só, desestimularia o investimento de longo prazo se não houvesse a repressão às cópias que são privilegiadas pelo menor esforço e grau de investimento.

Uma das questões mais relevantes para justificar o equilíbrio desta tensão constitucional é justamente a temporariedade do direito sobre a patente (D. B. BARBOSA, 2020), o que possui extrema relevância também para questões sobre seu licenciamento.

PATENTES, CONTRATOS DE LICENÇA E ROYALTIES

Encontramos o conceito positivo da patente no artigo 8ª da Lei da Propriedade Industrial, sendo patenteável “a invenção que atenda aos requisitos de novidade, atividade inventiva e aplicação industrial”. Na mesma carta, em seu artigo 40, temos que a patente de invenção vigorará pelo prazo de 20 (vinte) anos e a de modelo de utilidade pelo prazo de 15 (quinze) anos contados da data de depósito.

No Brasil a previsão constitucional de direitos de Propriedade Intelectual está no título “dos direitos e garantias fundamentais”, mais especificamente no inciso XXIX do artigo 5°.

Encontramos a previsão legal do contrato de licença de patentes no artigo 61 da LPI. A orientação é para que o contrato seja averbado no INPI - Instituto Nacional da Propriedade Industrial - para que produza efeitos em relação a terceiros, o que ocorre a partir de sua publicação (IDS, 2013). Artigos 62, 121 e 140 da lei 9279/96.

Sobre o prazo contratual para o pagamento dos royalties, a expiração da patente licenciada importa na extinção do contrato de licença (SANTOS & JABUR, 2007). Desta forma, é contra indicada a incidência de royalties após a vigência do direito, mesmo que estipulada contratualmente entre as partes.

Caso o titular do direito queira recebe royalties após a expiração da vigência da patente, a orientação é estipular como objeto do contrato a exploração da patente até o fim de sua vigência, sendo este o fato gerador do pagamento dos royalties, devendo apenas o pagamento ser diluído em pagamentos após o termino do direito.

Para Denis Borges Barbosa, a questão deve ser analisada sob a ótica da possibilidade de arguição de abuso de direito, independentemente, inclusive, de questões de infração de ordem econômica (concorrenciais – antitruste – lei 12.529/11). (D. B. BARBOSA, 2010)

Como o regime de patentes é uma exceção ao princípio da liberdade de mercado, seu uso não deve exceder o necessário para satisfação de sua finalidade imediata. A imposição de royalties depois da expiração da patente pode caracterizar, dentre as formas de abusos existentes, abuso por excesso de poder jurídico. (D. B. BARBOSA, 2020)

A nível de informação, também encontramos questões relativa à previsão de abusos de direitos de Propriedade Intelectual nos artigos 8.2, 40.1 e 40.2 do TRIPS, anexo 1.C do Tratado de Marraqueche, que inclusive determinou a criação da Organização Mundial do Comércio (OMC).

De forma prática, a incidência de royalties além do prazo de vigência da patente pode caracterizar abuso e ser um relevante argumento de defesa por parte de quem os deve, podendo incidir, ainda, reflexos indenizatórios de responsabilidade civil (art. 187 do Código Civil).

A continuidade e renovação da inovação no mercado são propiciados pelas exceções e limitações aos direitos de Propriedade Intelectual. A aptidão concorrencial deve ser ampliada por estes limites, por isto estão previstos em legislação doméstica e internacional (POLIDO, 2013). Existe um interesse público da concorrência e a limitação temporal não deve ser desrespeitada.

Denis Barbosa cita José Inácio Franceschini apontando o aspecto dinâmico do abuso de poder econômico. Isso ocorre se uma licença é feita em termos anticoncorrenciais. (D. B. BARBOSA, 2020)

De acordo com o inciso V do artigo 13 da Resolução 199/173 do INPI, o prazo máximo da averbação dos contratos de licença do direito de propriedade industrial não poderá ultrapassar a vigência dos direitos de propriedade industrial no Brasil. Sendo assim, um contrato que extrapola a vigência da patente encontrará problemas, inclusive, se for necessária sua averbação no Instituto, seja para ter força erga omnes, seja para a remessa de royalties para o exterior, conforme o artigo 9 da lei 4.131/62.

Na Jurisprudência americana existe o caso Brulotte x Thys Co, 1964, onde a cobrança de royalties após a expiração da patente foi considerada abuso de direito e a inoponibilidade foi decretada até mesmo durante a vigência da patente. Este entendimento foi mantido pela Suprema Corte americana em 2015 no caso Kimble et Al. x Marvel Entertainment, LLC.4

CONCLUSÃO

Nossa Corte Superior já julgou pela impossibilidade de extensão de direitos de propriedade industrial, tendo como exemplo o caso da MONSANTO no Recurso Especial 731.101-RJ (2005/0036085-3)5.

Apesar de alguns autores acharem que só deveriam se analisados casos de abusos quando ocorre infração de ordem econômica, a tendência é que no Brasil se consiga a caracterização de determinadas práticas abusivas ainda que não se tenha poder de mercado ou questões de direito concorrencial envolvidas. Isso ainda não é uma questão decidida em nosso país, sendo sua incidência analisada no “caso a caso” pelos juízes.

Desta forma, toda cautela e preocupação deve ser adotada na formulação de um contrato de Licenciamento de Patente e a orientação é pela não incidência contratual de royalties após a expiração do direito patentário.

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1 (BARBOSA, Pedro), Encontrado em: clique aqui) acessado em 22/11/20.

2 Saiba mais em: clique aqui . Acessado em 13/3/21.

3 Encontrado em clique aqui, acessado em 13/12/20.

4 (Barbosa, Denis) Encontrado em clique aqui, acessado em 13/12/20.

5 (Barbosa, Denis) Encontrado em clique aqui, acessado em 13/12/20.

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BARBOSA, D. B. (2010). Uma introdução propriedade intelectual. 2. ed. Rio de Janeiro: L. Juris, 2010.

BARBOSA, D. B. (2020). Tratado da Propriedade Intelectual - Patentes. 2. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2020.

BARBOSA, P. M. N. (2016). Direito Civil da Propriedade Intelectual. 3. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2016.

IDS, I. D. S. de E. J. e T.-. (2013). Comentários á lei de propriedade Intelectual. 3. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2013.

POLIDO, F. B. P. (2013). Direito Internacional da Propriedade Intelectual - Fundamentos, Princípios e Desafios. 1. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2013.

SANTOS, M. J. P. dos, & JABUR, W. P. (2007). Contratos de Propriedade Intelectual e Novas tecnologias. 1. ed. São Paulo: Saraiva, 2007.

Juliano Regattieri Oliveira
Advogado, especialista em propriedade intelectual, Presidente da Comissão de Propriedade Intelectual da OAB-ES; membro da Comissão de Startup, Proteção de Dados e Inovação da OAB-ES, conselheiro do CONECT - Conselho de Economia Criativa da Federação das Indústrias do Espírito Santo - FINDES.

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