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Visual Law e a efetividade da comunicação em petições e documentos jurídicos

Esta disrupção no mercado, embora de não fácil compreensão e seguimento pelos profissionais, vem sendo pauta de reuniões internas de departamentos jurídicos e até mesmo pelos tribunais para que haja a devida adaptação ao novo cenário.

23/3/2021

(Imagem: Arte Migalhas)

A advocacia está passando por grandes transformações, muito em razão da tecnologia estar modificando a natureza do trabalho em diversos setores, havendo uma exigência dos profissionais de um conjunto de habilidades até então não sobrelevadas.

A pandemia, por conseguinte, está acelerando os estágios de interação dos advogados com tecnologia, demandando de muitos profissionais da área do direito uma readequação no formato de trabalho de modo que a prática de atos processuais e comunicação com os clientes tem se dado de maneira virtual em larga escala e com uso de ferramentas ágeis para obtenção de resultados.

Esta disrupção no mercado, embora de não fácil compreensão e seguimento pelos profissionais, vem sendo pauta de reuniões internas de departamentos jurídicos e até mesmo pelos tribunais para que haja a devida adaptação ao novo cenário com o redirecionamento de times para esta finalidade.

É bastante comum, em áreas de atuação historicamente mais formais e regradas, a negativa dos impactos das novas tecnologias, recusa à mudança de atuação e o desprezo a soluções oferecidas por lawtechs e legal techs.  Esta negação, todavia, se não rapidamente detectada e superada, acaba por trazer um risco à perda de oportunidade.

Advogados, portanto, que ainda atuam somente como cumpridores de prazos e que se voltam apenas para estratégias processuais voltadas pura e simplesmente para a legislação, acabam por enfrentar maiores desafios nesta transformação digital vertiginosa.

De outra banda, advogados que enxergam a tecnologia como oportunidade potencializadora de resultados tem conseguindo transitar com relativa tranquilidade para este cenário disruptivo, tornando esta prática um diferencial competitivo na sua atuação.

Hoje vivemos numa economia de experiência, não bastando apenas entregar produto, mas sim experiência ao cliente. Muitos advogados entregam um ótimo trabalho com qualidade técnica e cumprimento dos prazos. Entregar uma boa experiência passa pela percepção do que o cliente precisa. Isso também é um diferencial competitivo.

É preciso entender como que o cliente se relacionou com o produto entregue. O advogado que se volta apenas para questões processuais e técnicas pode involuntariamente reduzir a sua atenção para pessoas envolvidas na sua atuação e do que elas buscam efetivamente. Por vezes, a propósito, se faz necessária uma interação multidisciplinar buscando uma maior efetividade para esta finalidade.

Tornar o produto e entrega desejável pelo cliente e fáceis de compreensão se torna uma necessidade, devendo começar e terminar observando como as pessoas interagem com os produtos e serviços, criando, ainda, pontes entre as pessoas e as tarefas que elas querem desempenhar.

E como a tecnologia contribui para esta finalidade?

Pediria permissão para ir um pouco além da tecnologia para construção deste debate no presente momento. Permita-me falar sobre o legal design como solução criativa, pertencente a este novo cenário disruptivo derivado das inovações tecnológicas.

Trata-se, o legal design, de uma forma diferente de entregar direito aos indivíduos, muito mais pautado na compreensão das pessoas envolvidas. Ultrapassa-se, com isso, a visão mais fechada e centralizada do lidador do direito como mero identificador de problemas, com objetivo de resolvê-los segundo a sua percepção. O legal design vem propor, portanto, a busca por soluções que também sejam confortáveis ao cliente, através do próprio design.

E como se daria este mecanismo e a sua aplicação?

A ideia do uso do legal design é encontrar padrões para criar jornadas através de técnicas voltadas ao próprio usuário, mediante o conhecimento da ferramenta, através, ainda, da busca constante por inspirações e com a prática efetiva advinda do uso deste mecanismo.

Tudo ainda parece muito genérico, não é mesmo? Pois bem. Vamos melhor esclarecer.

É indubitável que as pessoas interagem com os documentos produzidos pelos advogados. Prova do exposto é quando o juiz lê uma petição, ele também se comunica com as partes por meio de uma interface.

Essa interação do juiz com a petição gera uma experiência.

Do mesmo modo os clientes interagem com os documentos jurídicos como pareceres, contratos e termos de uso decorrendo disso diversas experiências.

O design, então, vem para auxiliar nessa relação para que as experiências obtidas sejam positivas e, além disso, efetivas. Do que adianta um termo de uso não lido, questionado e um conflito, decorrente disso, gerado?

Ainda no que diz respeito ao juiz, sabe-se que este estuda direito, mas a matéria basilar precisa ser explicada de forma mais clara, principalmente na parte técnica e de provas e é nisso que o legal design pode contribuir de maneira significativa.

Estudos demonstram que adotar elementos visuais em textos e apresentações contribui para a compreensão e retenção do conteúdo apresentado, além de aumentar a credibilidade e as chances de persuasão dos espectadores. A University of Minnesota, através de levantamento realizado, ponderou que apresentações com recursos visuais são até 43% mais persuasivos. Da mesma forma, a Rhodes University revelou que documentos com símbolos são até 95% melhor compreendidos.

Repisa-se que legal design não é tecnologia. Isso porque tecnologia não se volta para as necessidades do usuário. Já o design é inovação voltada na compreensão da necessidade do usuário e o contexto em que ele vai usar o que está sendo empregado. Obviamente que legal design e tecnologia podem andar juntas e é isso que será disposto mais adiante.

Ainda sobre o legal design e de modo a se ter uma visão cada vez mais clara de sua conceituação, pode-se ter este como a proposta do direito centrado no usuário. Através deste, busca-se, também, melhorar a comunicação jurídica, com uso de elementos visuais e fundamentos do design.  Em outras palavras, uma das ideias do uso do legal design é obter uma produção de documentos claros, utilizando elementos gráficos para esta finalidade. O legal design, ainda, busca trazer metodologias ágeis para o meio jurídico, como Kanban. Scrum, Design Thinking, assuntos estes que poderão ser abordados em debates posteriores.

Especificamente em relação à comunicação mais assertiva nos documentos jurídicos, tem-se o visual law. Ou seja, o visual law é uma subárea do legal design que volta-se exclusivamente para esta comunicação mais assertiva, e é sobre este instituto que se busca tecer maiores comentários no presente artigo.

Mas aqui vale uma ressalva, para aplicar o legal design e, mais precisamente, o visual law, é preciso entender, basilarmente, qual mensagem quer ser passada, qual destinatário e em que contexto essa informação será acessada. Importante que para cada contexto, para cada público, para cada usuário exista uma necessidade diferente do uso dessa ferramenta. E, de acordo com a necessidade de uso, haverá uma adequação de legal design a ser implementado.

Outro detalhe muito importante e que é alvo de bastante confusão quando do contato inicial dos profissionais da área do direito com a temática é que visual law não é meramente a ornamentação da peça. O que se busca com o visual law não é deixar o documento mais bonito e simplesmente não é a substituição dos textos por imagens.

Aqui, a propósito, valem também umas considerações, já que é outra temática de bastante confusão entre os advogados. As imagens devem ser usadas na medida das necessidades para não distrair o destinatário e tirar o foco do conteúdo. A ideia do uso desses elementos é tornar o conteúdo mais claro e didático e não o contrário.

Linguagem clara e peças organizadas, com informações objetivas e resumidas, portanto, são bem-vistas pelo Judiciário e esse tem sido o grande desafio da advocacia contemporânea. Texto eficiente é aquele que é compreendido na primeira leitura. Para esta finalidade, portanto, que se faz de grande valia o uso de recursos do visual law.

Na prática, e aqui, sim, a tecnologia será uma grande aliada, o visual law pode ser implementado através da inserção de vídeos, por meio de Qr Codes, em petições, servindo estes como complemento dos petitórios. Através destes, é possível, sintetizar os itens principais do caso, evidenciar os pontos controvertidos, explanar, de maneira mais didática e simplória, teses ou argumentos que normalmente ocupariam diversas laudas, pode, ainda, substituir uma transcrição da prova oral, por exemplo.

Outra ferramenta passível de uso é o fluxograma. Sua utilidade é de grande pertinência para ilustrar, por exemplo, uma variedade de recursos existentes no processo, para explicar, ademais, o funcionamento de procedimentos do cliente delimitando a sua responsabilidade, ou ainda, para evidenciar uma sequência de fatos, correlacionando-os com as provas produzidas.

Os infográficos, ademais, fortalecem argumentos e teses com apresentação de dados relevantes e gráficos, despertando a empatia do julgador. Estes também podem trazer uma abordagem cronológica para contar uma síntese de eventos ou sucessão de acontecimentos de atos que desencadearem determinado fato, além de possibilidade da realização de comparações entre dois elementos, destacando divergências e semelhanças, incluindo decisões paradigmas almejadas como referências para aplicação aos casos concretos.

A jurimetria, ademais, tem auxiliado os advogados, através da análise preditiva de casos judiciais, a ter uma percepção mais apurada de cenários os auxiliando na tomada de decisões, podendo esta também ser utilizada nos documentos jurídicos, facilitando a comunicação de modo a demonstrar a movimentação do Poder Judiciário sobre a matéria.

Outras modalidades de elementos visuais utilizadas são o storytelling/linha do tempo, sendo esta uma forma de contar a história de maneira clarividente, com uma sequência lógica, que prenda a atenção do leitor. Existe, ainda, a ideia do one page. Através desta é possível reunir em única página os principais pontos da peça, como preliminares, pedidos, subsídios, tudo em palavras-chave de modo que norteie o magistrado a ter uma visão ampla do que será abordado. Por fim, mas não menos importante, existe ainda a aplicação de bullet points. Estes permitem trazer resumidamente as principais teses abordadas de maneira bastante direta e objetiva para fácil percepção do resumo da peça.

Pois bem, é perceptível a pertinência do tema envolto ao visual law e é latente a necessidade de adequação a este novo cenário. Neste sentido, tem-se visto uma movimentação do Poder Judiciário para uso desta ferramenta. Prova do exposto é a elaboração da resolução CNJ 347/20 que dispõe sobre a Política de Governança das Contratações Públicas no Poder Judiciário, uma vez que o referido documento elenca os recursos de Visual Law como sendo essenciais para tornar os documentos mais claros, usuais e acessíveis.

Outros exemplos corroboram a importância desta temática e seu uso no âmbito do Poder Judiciário. A Vara de Acidente do Trabalho de Porto Alegre (RS), 3ª Vara Criminal de Natal (RN), 6ª Vara Federal da JFRN, 1ª Vara de Presidente Dutra (MA) e 2ª Vara Criminal de Petrolina (PE) desenvolveram, com as devidas adequações à realidade dos ritos e procedimentos, guias informativos visuais, através da reunião de ícones, ilustrações e um Qr Code.  para orientar as partes sobre o funcionamento das audiências virtuais, facilitando o acesso das partes e testemunhas às plataformas de videochamadas, permitindo, ainda, que as partes tenham conhecimento sobre os próximos passos do processo.

O MPRJ, por sua vez, está adotando elementos visuais em suas ações civis públicas e a Corregedoria-Geral da Justiça do TJRS está implementando técnicas de Visual Law em seus ofícios circulares.

STF decidiu inovar no projeto gráfico, adotando recursos audiovisuais para facilitar a compreensão dos leitores com ícones para acessar o vídeo do julgamento ou escutar o áudio do texto em seus informativos.

Os Tribunais de Goiás, Bahia, Rio Grande do Sul, Ceará, Distrito Federal, Paraná, assim como a Justiça Federal de São Paulo e o Supremo Tribunal Federal estão investindo em laboratórios de inovações para conduzir pesquisas, estudos e desenvolvimento de novas soluções.

O que se busca, diante de todo o exposto, com o visual law é transformar a informação jurídica em algo que qualquer pessoa seja capaz de entender através do uso de elementos visuais. A sua implementação, todavia, não é tão simples quanto parece, sendo importante uma atuação conjunta entre advogados e designer. A partir, a propósito, de uma sinalização por parte dos advogados, dos pontos cruciais da peça , com a sinalização do que pode ser melhor explicitado é que o designer conseguirá desenvolver um bom trabalho.

O designer, portanto, precisa saber quais textos precisam de elementos visuais, onde inserir ícones, para que a peça tenha efetividade. Os dois precisam entender um pouco da área do outro para que tudo rode bem, devendo o trabalho ser coletivo.

Esse exercício não pode ser estático. Assim sendo, o ideal é que haja a montagem de grupo de estudo contínuo para que advogados conversem entre si e alinhem pontos de melhoria da informação a ser passada. O que não está claro para o juiz, que prova precisa ser apresentada melhor. Apenas a inserção de elemento visual por colocar talvez não faça diferença e só polua a peça.

Uma boa técnica é que haja um levantamento dos principais objetos de maior recorrência de atuação dos advogados envolvidos no projeto, levante-se os principais subsídios utilizados com a devida correlação com a peça inicial ou tese de defesa, estude-se os principais argumentos que levam ao êxito das ações, estude-se os principais pontos de maior compreensão dos magistrados, haja um levantamento de banco de dados de decisões favoráveis, bem como material técnico didático complementar e criação de vídeos didáticos com explicação da matéria.

Em seguida, que sejam as peças compartilhadas com demais advogados que não tenham habitualidade com o referido objeto e apure-se se os pontos levantados com os questionamentos anteriores estão sendo percebidos por estes que estão fora da operação.

Após o confronto de informações, restará evidente quais textos podem ser melhor compreendidos, com o uso dos dados já disponibilizados pelo setor para que sejam pensados e trabalhados com a equipe de designers, e, assim, seja o visual law devidamente implementado.

O ser humano naturalmente, quando se depara com a necessidade de mudanças, tende a visualizá-la como algo ruim ou não necessário. Todavia, como debatido no presente artigo, a tecnologia e o emprego do visual law, quando adequadamente empregados, poderão gerar frutos positivos, sendo necessárias para manutenção do indivíduo no ambiente ao qual está inserido. Importantíssimo, desta feita, que os advogados estejam atentos a essa necessidade de adaptação.

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Clique aqui. Acessado em 15/3/21;

Clique aqui. Acessado em 16/3/21.

Visual Law: Como os Elementos Visuais Podem Transformar o Direito, Revista dos Tribunais, OLIVEIRA, Bernardo de Azevedo e Ingrid Barbosa.

Rodrigo Coutinho
Sócio do escritório Urbano Vitalino Advogados.

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