Migalhas de Peso

Antologia de Versos Jurídicos

Uma espécie de licença poética deve ser concedida aos profissionais do Direito e da Justiça durante o recesso forense. É o tempo para se desfrutar do lazer e da leitura em suas múltiplas possibilidades: na cidade, no campo, no mar, na montanha. E, também, no mundo maravilhoso da Arte e da Literatura em cujos universos infinitos navega o espírito humano

10/1/2007


Antologia de Versos Jurídicos

René Ariel Dotti*

Uma espécie de licença poética deve ser concedida aos profissionais do Direito e da Justiça durante o recesso forense. É o tempo para se desfrutar do lazer e da leitura em suas múltiplas possibilidades: na cidade, no campo, no mar, na montanha. E, também, no mundo maravilhoso da Arte e da Literatura em cujos universos infinitos navega o espírito humano.

É justamente nessa janela de abertura dos prazos e das petições que recebi a bem elaborada Antologia de Poesias Jurídicas, sob um sugestivo título: Lírica do Direito. São diversos poemas, geralmente em forma de sonetos, organizados por Miguel Matos e editados por Migalhas, a prestigiada revista eletrônica. O seu balanço de 2006 registra números extraordinários: 242 informativos, 795 artigos publicados, 1.012 livros sorteados, 1.271 eventos divulgados, 4.018 matérias produzidas, 8.896 cartas veiculadas, 19.360 migalhas e 89.815 novos leitores.

A Lírica do Direito contém textos de variados matizes e autores de diversas origens funcionais: juristas, advogados, juízes, professores, médicos, jornalistas, promotores públicos, escritores e, obviamente, poetas.

De Miguel Reale (1910-2006), por exemplo, chegam estas quadras:

“Com pés sangrando pelos tribunais,
olhos queimados com vigílias longas
em busca da justiça sem delongas
não me é possível ocultar meus ais.

Árduo labor, após tão duras lutas,
não sei o que é a justiça com certeza,
se vem da lei ou vem da natureza
para abrir as tenazes das disputas

Deusa encoberta, sirvo-a com denodo
entre nuvens de sonho ou incoformado,
com a alada confiança de um rapsodo,

contando não ouvir em meu caminho,
o lamento de Rui, desconsolado:
a última palavra é do meirinho."

Do imortal Tobias Barreto (1839-1889), certamente defendendo algum acusado de assédio sexual:

“Considerando que as flores
existem para o nariz,
e as mulheres para os homens,
na opinião do juiz;

considerando que as moças,
ariscas como a perdiz,
devem ter seu perdigueiro,
na opinião do juiz;

considerando que a gente
não pode viver feliz
sem fazer seu namorico,
na opinião do juiz;

amemos todos, amemos,
é Cupido quem o diz;
pois namoro não é crime,
na opinião do juiz”.

Não poderia faltar na boa seleção de temas e autores, a homenagem póstuma àquele que exerce a missão de distribuir justiça aos seres humanos. O professor de Direito Penal e ex-presidente do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, Adelmar Tavares da Silva Cavalcanti, simplesmente Adelmar Tavares (1888-1963) lembra o paradoxo de uma existência:

“Com a velha capa negra, desbotada
pelo tempo da dura profissão,
vi-o buscar a última pousada,
adormecido, e frio, em seu caixão.

Refletia na face fatigada
quanto em vida guardou no coração,
da rude faina mal recompensada,
das pedradas zurzidas sem razão.

Na comarca longínqua, ao desconforto,
viu passarem legiões que o preteriram...
a esse bom, a esse justo, e grande morto,

que humildemente vai, como viveu,
que deu Justiça a todos que pediram,
e que aos seus tristes dias ninguém deu”.

Vale a pena ler. Ler e sentir o milagre da palavra.

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Clique aqui para ver como foi o lançamento da obra.

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*Advogado do escritório Professor René Ariel Dotti

 

 

 

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