A Lei de Improbidade Administrativa (LIA) foi alterada pelo “Pacote anti-crime” (lei 13.964/19) no final de 2019, e passou a autorizar a autocomposição nas ações de improbidade, oficializando a possibilidade de celebração de acordos de não persecução cível. No dia 23/2/21, a 1ª turma do STJ (Superior Tribunal de Justiça) decidiu, por unanimidade, que é possível a celebração de acordo de não persecução cível no âmbito da ação de improbidade administrativa em fase recursal.
Foi tendo em vista que a regulamentação de tais acordos foi integralmente vetada pelo presidente da República à época da promulgação do pacote anti-crime, que temas essenciais ao procedimento da autocomposição ficaram sem definição expressa. Esse foi o caso do tema relativo ao momento da celebração do acordo de não persecução cível, recentemente julgado pelo STJ. Tudo isso em razão do veto presidencial ao § 2º do art. 17-A, que dispunha: “o acordo também poderá ser celebrado no curso de ação de improbidade”.
O STJ entendeu em sentido contrário às razões de veto ao art. 17-A, § 2º, que diziam: “A propositura legislativa, ao determinar que o acordo também poderá ser celebrado no curso de ação de improbidade, contraria o interesse público por ir de encontro à garantia da efetividade da transação e do alcance de melhores resultados, comprometendo a própria eficiência da norma jurídica que assegura a sua realização, uma vez que o agente infrator estaria sendo incentivado a continuar no trâmite da ação judicial, visto que disporia, por lei, de um instrumento futuro com possibilidade de transação.”
A lei 13.964/19 não introduziu o § 10-A ao art. 17 da LIA com o objetivo de estabelecer um momento processual específico para a celebração do acordo de não persecução cível, mas sim, para aumentar as possibilidades de uma autocomposição por meio da interrupção do prazo para contestação. Com a determinação da suspensão processual, as partes poderiam se focar nas tratativas necessárias à celebração do acordo a fim de ampliar a chance de sucesso da negociação:
Art. 17 [...] § 10º Havendo a possibilidade de solução consensual, poderão as partes requerer ao juiz a interrupção do prazo para a contestação, por prazo não superior a 90 (noventa) dias.
Assim, note-se que a lei 13.964/19 não determinou um momento processual específico para a celebração do acordo de não persecução cível. Nesse cenário, como resposta ao vazio normativo, ficou a cargo do STJ trazer respostas para as lacunas relativa à aplicação da nova lei.
STJ e recurso repetitivo
No julgamento da 1ª turma do STJ do dia 23/2/21, o ministro Benedito Gonçalves, Relator do AREsp 1.314.581/SP em que fixada a tese em sede de recurso repetitivo, entendeu que o fato de não poder ser determinada a suspensão processual com vistas à celebração do acordo em sede recursal – vez que tal pedido só pode ser formulado até a apresentação de contestação – não impede a celebração da avença nessa fase processual.
Nessa linha, o ministro relator entendeu por homologar o acordo celebrado entre as partes, a fim de extinguir o feito, com resolução de mérito, nos termos do art. 487, III, "b", do CPC/15.
Conclusões
O julgamento do AREsp 1.314.581 definiu relevante questão que se punha na aplicação da lei 13.964/19: a partir das conclusões do julgado, o acordo de não persecução cível no âmbito da ação de improbidade administrativa pode ser levado a cabo a qualquer tempo, encontrando barreira apenas no trânsito em julgado da sentença condenatória. O entendimento do STJ se deu em atenção ao fato de que não há nenhum limitador na lei 13.964/19 capaz de gerar a conclusão de que tal expediente só seria admitido até algum específico momento processual. Ademais, verificou-se similitude conceitual entre o entendimento consolidado pelo STJ e os termos do artigo 139, V, do CPC que autorizam a autocomposição a qualquer tempo.