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Vacinação obrigatória de empregados: Direito ou abuso do poder diretivo?

Trocando em miúdos, enquanto não se tratar de uma política obrigatória por lei ou expressamente determinada por autoridade competente, em caso de recusa do empregado, a prerrogativa do empregador está na dispensa sem justa causa.

3/2/2021

(Imagem: Arte Migalhas.)

Uma das discussões mais ricas em tempos de academia encontra-se no estabelecimento dos limites do direito coletivo e suas intersecções com as garantias individuais. O assunto, por sua abrangência constitucional, costumeiramente, é tema de todas as áreas do direito, não sendo diferente no direito do trabalho. Um exemplo atual é no estudo do fato do príncipe, no qual o principal fundamento para sua não aplicação aos casos de responsabilidade estatal pelo fechamento de empresas em razão dos decretos de suspensão da atividade econômica se deveu ao fato de se tratar de ato que visava o bem coletivo se sobrepondo, inclusive, ao todo poderoso direito patrimonial.

Esta análise relacional está novamente em voga, quando se pretende responder à questão: pode o empregador exigir a vacinação do empregado, sob pena de aplicação das punições disciplinares, podendo, inclusive, culminar em rescisão por culpa do trabalhador?

Sobre a vacinação contra a COVID-19, sabe-se que o Brasil segue o Plano Nacional de Imunização, ou seja, pela rede pública e de forma voluntária. Não houve, por parte do governo federal a iniciativa de torná-la de caráter obrigatório. Por outro lado, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do ARE 1267879, decidiu pela constitucionalidade da vacinação obrigatória, desde que o imunizante esteja devidamente registrado por órgão de vigilância sanitária, esteja incluído no Plano Nacional de Imunização (PNI), tenha sua obrigatoriedade incluída em lei ou tenha sua aplicação determinada pela autoridade competente.

Ao fundamentar a decisão, o relator destacou que, embora a Constituição Federal proteja o direito de cada cidadão de manter suas convicções filosóficas, religiosas, morais e existenciais, os direitos da sociedade devem prevalecer sobre os direitos individuais. Em conclusão, o Estado pode, em situações excepcionais, proteger as pessoas, mesmo contra sua vontade - como, citando como o exemplo o uso de cinto de segurança.

Em resumo, a vacinação não é obrigatória no Brasil, e mais especificamente, no Estado de Goiás, no qual foi promulgada lei que proíbe a vacinação obrigatória. Entretanto, a Suprema Corte brasileira já deixou evidências por onde caminhará seu entendimento.

Assim, o que se precisa responder é se o empregador pode tornar a medida obrigatória para seus trabalhadores. A resposta é positiva. Existe a prerrogativa de que a vacinação se torne política da empresa, sendo incluída em seu Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional (PCMSO), existindo um universo de justificativas jurídicas para isto, dentre elas: ser obrigação constitucional da empresa a manutenção da saúde e segurança no ambiente de trabalho, aliado ao fato de ser a imunização a única medida capaz de combater definitivamente a pandemia.

Mas atenção, a vacinação pode ser medida obrigatória no âmbito da empresa, o que não leva a conclusão imediata de que os empregados que se recusem possam ser dispensados por justa causa. A medida não é legalmente obrigatória, e como o próprio STF ressaltou, pode até vir a ser, caso a obrigatoriedade seja incluída em lei ou tenha sua aplicação determinada pela autoridade competente.

Até lá, o empregador pode utilizar de seu poder discricionário e não manter em seus quadros o empregado que se recusa a cumprir a política de saúde da empresa, entretanto, torna-se demasiadamente arriscado utilizar do poder punitivo em razão de ato do qual o cidadão encontra-se civilmente desobrigado. Trocando em miúdos, enquanto não se tratar de uma política obrigatória por lei ou expressamente determinada por autoridade competente, em caso de recusa do empregado, a prerrogativa do empregador está na dispensa sem justa causa.

Patricia Miranda Centeno
Advogada trabalhista, gestora jurídica do escritório Miranda Arantes Advogados. Professora em cursos de extensão e pós-graduações e articulista.

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