Desde 1999 a Taxa Referencial - TR vem apresentando percentuais reduzidos de correção, por vezes menores que 1% (um por cento) ao ano, distanciando-se expressivamente dos índices de inflação, IPC-Fipe ou IPCA-IBGE. Por isso, o índice TR não pode ser equiparado à real inflação.
Por força do art. 13 da lei 8.036/90, os depósitos efetuados nas contas vinculadas ao FGTS são corrigidos pela TR. Consequentemente, os depósitos no FGTS vêm, ano a ano, perdendo seu valor econômico.
Segundo a Corte Especial do STJ, a correção monetária é um mecanismo de manutenção do poder aquisitivo da moeda. Corrigir o valor nominal da obrigação representa manter, no tempo, o seu poder de compra original, alterado pelas oscilações inflacionárias positivas e negativas ocorridas no período. (REsp 1.265.580/RS).
Considerando que a TR não reflete a real inflação e, por isso, não mantem o poder aquisitivo da moeda, não pode ser utilizada como índice de correção monetária, especialmente em se tratando de depósitos vinculados ao FGTS.
A manutenção da TR como índice de correção do FGTS e a consequente perda do seu poder aquisitivo causa duplo prejuízo à sociedade: de um lado, reduz a cobertura dos trabalhadores no caso da perda de emprego e, de outro, reduz o capital disponível para realização de políticas públicas, como o financiamento imobiliário.
Há alguns anos os trabalhadores brigam na Justiça pela mudança do índice que corrige monetariamente o FGTS.
Em 2018, o STJ jogou um balde de água fria sobre a pretensão dos trabalhadores. Ao julgar o processo representativo da matéria – REsp 1.614.874, o STJ entendeu que tendo o legislador estipulado a TR como o índice legal de remuneração das contas vinculadas ao FGTS, o Poder Judiciário não poderia substituir tal índice por outro. Tal providência estaria inserida no âmbito de atuação do Poder Legislativo. A troca do índice pelo Judiciário implicaria invasão na competência do Legislativo e afrontaria o princípio da Separação dos Poderes.
Em 2019, o STF suspendeu todos os processos em tramitação que discutem a correção das contas do FGTS, até o julgamento do processo representativo da matéria – ADIn 5.090.
Então, no último julgamento do STF antes do recesso, uma nova esperança de mudança surgiu para os trabalhadores.
No julgamento da ADC 58, em 18/12/20, o STF declarou inconstitucional o uso da TR para corrigir monetariamente as dívidas trabalhistas. O Supremo entendeu que a TR não mais reflete a variação do poder aquisitivo da moeda, por isso, sua utilização como índice de correção monetária reduz materialmente o valor a ser recebido pelo trabalhador, o que implica afronta ao direito de propriedade.
A decisão se soma a outras da Corte Maior, que também declararam a inconstitucionalidade da utilização da TR como índice de correção monetária em situações específicas. Com efeito, em 2013, no julgamento da ADI 4357, o STF afirmou que a Taxa não está apta a balizar a atualização do poder aquisitivo da moeda, porque seus valores são muito aquém da real inflação, razão pela qual não poderia servir de fator de correção dos precatórios. Em 2017, no julgamento do RE 870947, declarou que a TR “não se qualifica como medida adequada a capturar a variação de preços da economia”, sendo inidônea para servir de índice de correção monetária. Em 2019, no julgamento da ADI 5348, a ministra Carmen Lucia destacou que a utilização da TR configura restrição desproporcional ao direito fundamental de propriedade, uma vez que é manifesta e abstratamente incapaz de mensurar a variação do poder aquisitivo da moeda.
Diferentemente dos demais julgamentos, em 18/12/2020 surgiu um elemento novo relevante, que deixa a mudança da correção do FGTS mais próxima de ocorrer: contrariando o entendimento do STJ, o STF, ao apreciar a inconstitucionalidade da utilização da TR para atualização de débitos trabalhistas, entendeu que não poderia simplesmente declarar a inconstitucionalidade do índice de correção monetária, e concordou que, enquanto não há deliberação do Congresso sobre a matéria, é papel do Judiciário estabelecer qual cenário é constitucional; o que não implica invasão de competência do Legislativo, nem violação do princípio da separação de poderes.
Segundo o Ministro Gilmar Mendes, não basta ao STF afastar a TR, é preciso dizer qual é o índice a ser seguido. Assim, declararam que a correção das dívidas trabalhistas deve ser feita pelo IPCA-E na fase pré-judicial e, a partir da citação, pela taxa Selic.
Em outras palavras, ao contrário do entendimento do STJ, para o STF, uma vez declarada a inconstitucionalidade da lei que define a TR como índice de correção monetária, cumpre ao Poder Judiciário preencher a lacuna e estabelecer qual o índice deverá ser utilizado, até deliberação do Congresso Nacional sobre a matéria.
Pois bem. Já definidos todos os elementos necessários para o julgamento da ADI 5090, leading case da correção do FGTS, espera-se que a Corte Maior coloque a ação em pauta para julgamento o mais breve possível.
Por fim, deve ser alertado que, para verem a aplicação retroativa do novo índice de correção monetária nas contas de FGTS pessoais, os trabalhadores devem ir à Justiça, pois poderá o STF determinar que o novo índice de correção seja aplicado apenas para o futuro e impedir que novas ações sejam ajuizadas.