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TR x IPCA-E x Selic: Afinal, o que está valendo com a nova posição do STF sobre atualização de créditos trabalhistas?

De acordo com o novo critério, a TR foi definitivamente afastada como indexador dos débitos provenientes de decisões da Justiça do Trabalho, dando lugar a um sistema híbrido de correção.

14/1/2021

(Imagem: Arte Migalhas)

De partida, é de se destacar que a polêmica entorno do índice de correção monetária a ser aplicado no crédito trabalhista é de longo datar, mormente a controversa aplicação do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) em detrimento de outros índices oficiais, como, por exemplo, a Taxa Referencial (TR).

Para melhor contextualizar a problemática envolvendo os critérios a serem adotados para a atualização dos débitos trabalhistas no país, não podemos perder de vista, inicialmente, o fato de que a correção monetária tem como objetivo a mera atualização do valor em razão do tempo transcorrido, ao passo que os juros moratórios decorrem do atraso no pagamento da obrigação.

O assunto, há muito, guarda previsão normativa. Neste sentido, a lei 8.177/91, em seu art. 39, caput, já estipulava expressamente que os “débitos trabalhistas de qualquer natureza, quando não satisfeitos pelo empregador nas épocas próprias assim definidas em lei, acordo ou convenção coletiva, sentença normativa ou cláusula contratual sofrerão juros de mora equivalentes à TRD acumulada no período compreendido entre a data de vencimento da obrigação e o seu efetivo pagamento”.

Embora o disposto alhures mencione a expressão “juros de mora” para se referir à aplicação da Taxa Referencial Diária (TRD), o comando legal supra diz respeito à correção monetária, e não a juros, os quais são disciplinados pelo § 1º do mesmo artigo, definindo que aos “débitos trabalhistas constantes de condenação pela Justiça do Trabalho ou decorrentes dos acordos feitos em reclamatória trabalhista, quando não cumpridos nas condições homologadas ou constantes do termo de conciliação, serão acrescidos, nos juros de mora previstos no caput, juros de um por cento ao mês, contados do ajuizamento da reclamatória e aplicados pro rata die, ainda que não explicitados na sentença ou no termo de conciliação”.

Pouco tempo após, mais especificamente em 1993, a TRD foi extinta, pela dicção do art. 2º da lei 8.660/93, sendo, a partir de então, substituída pela TR (art. 1º), que é o índice aplicado aos depósitos de poupança (art. 7º) e que tem como objetivo apenas a correção monetária, e não os juros.

Com o advento da lei 10.192/01, que dispôs sobre medidas complementares ao Plano Real, foi disciplinado em seu art. 15 que permaneceriam “em vigor as disposições legais relativas à correção monetária de débitos trabalhistas, de débitos resultantes de decisão judicial, de débitos relativos a ressarcimento em virtude de inadimplemento de obrigações contratuais e do passivo de empresas e instituições sob os regimes de concordata, falência, intervenção e liquidação extrajudicial”.

Contudo, no decorrer dos anos cresciam as discussões sobre a constitucionalidade da atualização de débitos trabalhistas com base no índice oficial de remuneração básica da caderneta de poupança (TR), de modo que, naturalmente, o tema acabou sendo objeto de decisão do STF, fazendo-o através do julgamento das Ações Diretas de Inconstitucionalidade 4.357, 4.372, 4.400 e 4.425. Em suma, o entendimento que prevaleceu foi no sentido de que a correção monetária pela TR é inconstitucional, de modo que, por segurança jurídica, foram modulados os efeitos de tal declaração, mantendo-se esse índice (TR) como fator de atualização monetária até 24/3/15, e o IPCA-E a partir de 25/3/15.

Ao julgar a ADIn 4.357, o STF havia declarado a inconstitucionalidade parcial do § 12 do artigo 100 da CR/88, que, por ter redação semelhante ao aludido dispositivo legal, arrastou para a inconstitucionalidade a nova redação do artigo 1º-F da lei 9.494/971, dada pela lei 11.960/09, com relação à correção monetária. Posteriormente, no julgamento de questão de ordem, o STF modulou os efeitos de sua decisão, para determinar que "fica mantida a aplicação do índice oficial de remuneração básica da caderneta de poupança (TR), nos termos da emenda constitucional 62/09, até 25/3/15, data após a qual (a)os créditos em precatórios deverão ser corrigidos pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial (IPCA-E)".

O Tribunal Superior do Trabalho (TST), por sua vez, em julgamento plenário realizado no dia 5 de agosto de 2015, examinou a arguição de inconstitucionalidade suscitada à época pela 7ª turma (autos do AIRR 479-60.2011.5.04.0231) e pronunciou a inconstitucionalidade por arrastamento do artigo 39 da lei 8.177/91, especificamente a expressão “equivalentes à TRD” contida no caput do referido dispositivo, adotando como fundamento a ratio decidendi empregada pelo STF no julgamento das ADIns 4.357, 4.372, 4.400 e 4.425. Por consequência, determinou a adoção do IPCA-E para atualização dos créditos trabalhistas, em substituição à TRD.

Na ocasião, havia sido determinada a modulação dos efeitos da decisão a fim de que os créditos trabalhistas alvos de execuções judiciais fossem corrigidos pelo IPCA-E a contar de 30 de junho de 2009, observada, porém, a preservação das situações jurídicas consolidadas resultantes dos pagamentos efetuados nos processos judiciais, em andamento ou extintos, em virtude dos quais foi adimplida e extinta a obrigação, ainda que parcialmente. Contudo, o Pleno do TST, ao analisar os embargos de declaração que se seguiram2, decidiu fixar novos parâmetros para a modulação dos efeitos da decisão, adotando a modulação insculpida pelo STF e definindo o dia 25/3/15 como o marco inicial para a aplicação da variação do IPCA-E como fator de atualização, mantendo-se a aplicação da TR para os débitos trabalhistas devidos até o dia 24/3/15.

Não obstante as decisões do STF e do TST sobre a matéria, sobreveio então a lei 13.467/17 (Reforma Trabalhista), incluindo o parágrafo 7º ao art. 879 da CLT, reafirmando que a atualização dos créditos decorrentes de condenação judicial trabalhista seria feita pela Taxa Referencial (TR), divulgada pelo Banco Central do Brasil, conforme a lei 8.177, de 1º de março de 1991.

Sem embargo, fato é que após a alteração legislativa promovida pela lei 13.467/17, a discussão sobre os critérios de atualização de débitos foi reavivada no âmbito dos Tribunais Trabalhistas, que já vinham há muito discutindo o assunto, sendo que a jurisprudência majoritária do Tribunal Superior do Trabalho (TST) e dos Tribunais Regionais, como visto, já se direcionava no sentido da ratificação da inconstitucionalidade da aplicação da TR, mantendo o posicionamento anterior à Reforma Trabalhista, uma vez que a base constitucional e o entendimento do STF não foram alterados.

Ou seja, seria o caso, por força da redação conferida pela lei reformista, que os débitos trabalhistas voltassem a ser corrigidos pela TR. Sucede, porém, que o TST passou a entender que o parágrafo 7º do artigo 879 da CLT nasceu "natimorto", ou seja, não tinha nenhuma eficácia normativa em razão da decisão do Tribunal Pleno.

A par disso, por força do cenário jurisprudencial que se formou pela aplicação do IPCA-E, o Excelso Pretório recebeu as ADCs 58 e 59, ajuizadas, respectivamente, pela Confederação Nacional do Sistema Financeiro (CONSIF), pela Confederação Nacional da Tecnologia da Informação e Comunicação (CONTIC) e outras duas entidades de classe. Nestas demandas são abordados os dispositivos relativos aos índices de atualização dos débitos e depósitos trabalhistas. O objetivo à época era de que o STF declarasse a constitucionalidade dos artigos 879, parágrafo 7º, e 899, parágrafo 4º, da CLT, que definiam a TR como índice oficial de correção dos valores decorrentes das condenações trabalhistas e do depósito recursal. As ADCs foram distribuídas por prevenção ao ministro Gilmar Mendes, então relator da ADIn 5.867 (e posteriormente da ADIn 6.021), onde a Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), em sentido contrário, pedia a declaração da inconstitucionalidade dos mesmos dispositivos.

Nesse interim, antes do julgamento das ADCs e ADIs acima mencionadas, questionado pela Federação Nacional dos Bancos (FENABAN), o STF suspendeu liminarmente a eficácia de decisão do TST que afastou a aplicação da TR em detrimento do IPCA e, em fevereiro de 2018, julgou improcedente a Reclamação Constitucional movida pela Federação, nos seguintes termos:

RECLAMAÇÃO. APLICAÇÃO DE ÍNDICE DE CORREÇÃO DE DÉBITOS TRABALHISTAS. TR. AUSÊNCIA DE IDENTIDADE MATERIAL ENTRE OSFUNDAMENTOS DO ATO RECLAMADO E O QUE FOI EFETIVAMENTE DECIDIDO NAS ADIS 4.357/DF E 4.425/DF. NÃO CABIMENTO DA RECLAMAÇÃO. ATUAÇÃO DO TST DENTRO DO LIMITE CONSTITUCIONAL QUE LHE É ATRIBUÍDO. RECLAMAÇÃO IMPROCEDENTE.

I – A decisão reclamada afastou a aplicação da TR como índice de correção monetária nos débitos trabalhistas, determinando a utilização do IPCA em seu lugar, questão que não foi objeto de deliberação desta Suprema Corte no julgamento das Ações Diretas de Inconstitucionalidade

4.357/DF e 4.425/DF, não possuindo, portanto, a aderência estrita com os arestos tidos por desrespeitados.

II - Apesar da ausência de identidade material entre os fundamentos do ato reclamado e o que foi efetivamente decidido na ação direta de inconstitucionalidade apontada como paradigma, o decisum ora impugnado está em consonância com a ratio decidendi da orientação jurisprudencial desta Suprema Corte.

III – Reclamação improcedente.” (STF – Reclamação 22.012/RS – 2ª turma – rel. ministro Dias Toffoli – Publicação: DJE 27/2/18)

Por seu turno, o TST, que outrora já havia declarado a inconstitucionalidade do artigo 39 da lei 8.177/91 (que versa sobre correção monetária pela TR na Justiça do Trabalho), em maio de 2018, ao julgar o Recurso de Revista 7- 17.2016.5.04.0641, reafirmou e fixou o entendimento de que deve ser mantida a aplicação da TR para os débitos trabalhistas devidos até o dia 24/3/15, de modo que, a partir do dia 25/3/15, a correção deve ser realizada pelo IPCA-E, o que já havia sido firmado também no julgamento do RR 479-60.2011.5.04.0231. Assim constou do mencionado acórdão do TST:

RECURSO DE REVISTA REGIDO PELA LEI 13.015/2014 - EXECUÇÃO. CORREÇÃO MONETÁRIA. ATUALIZAÇÃO. ÍNDICE APLICÁVEL.

1. O Pleno do TST, no julgamento do processo ArgInc-479 - 60.2011.5.04.0231, DEJT 14/8/2015, declarou a inconstitucionalidade do art. 39 da Lei 8.177/1991 e, em consequência, determinou a adoção do IPCA-E para atualização dos créditos trabalhistas, em substituição à TRD.

2. Ao analisar os embargos de declaração que se seguiram (ED-ArgInc - 479-60.2011.5.04.0231, DEJT 30/6/2017), o Tribunal Superior do Trabalho decidiu fixar novos parâmetros para a modulação dos efeitos da decisão, definindo o dia 25/3/2015 como o marco inicial para a aplicação da variação do Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial (IPCA-E) como fator de atualização.

3. Em suma, nos termos da decisão proferida pelo Pleno do TST no julgamento do processo ArgInc-479-60.2011.5.04.0231, deve ser mantida a aplicação do índice oficial de remuneração básica da caderneta de poupança (TRD) para os débitos trabalhistas devidos até o dia 24/3/15, e, após, a partir do dia 25/3/15, a correção deve ser realizada pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial (IPCA-E). Recurso de revista conhecido e provido.” (TST - RR - 7-17.2016.5.04.0641 – 2ª turma – rel. ministra Delaíde Miranda Arantes – Publicação: DJE 25/5/18) (grifo nosso)

Seguindo tal entendimento, muitos Tribunais Trabalhistas continuaram a condenar empregadores a corrigirem os débitos pelo IPCA, a exemplo do TRT da 15ª Região, com a edição de sua Súmula 118 em 19/07/2018, assim disposta:

118. ARGUIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE - LEI Nº 8.177/91 - ARTIGO 39, CAPUT - EXPRESSÃO 'EQUIVALENTES À TRD ACUMULADA' - ARTIGO 5º, INCISOS XXII e XXXVI, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988. É inconstitucional a expressão 'equivalentes à TRD acumulada', contida na cabeça do artigo 39 da Lei no 8.177/91, por conflitar com o art. 5º, XXII e XXXVI, da CF/88, violando as garantias fundamentais de proteção integral do patrimônio e de inviolabilidade da coisa julgada, uma vez que o referido índice foi criado para remunerar o capital aplicado em investimentos financeiros, pelo que não serve à recomposição do valor da moeda depreciada pela inflação." (RESOLUÇÃO ADMINISTRATIVA 12/18, de 18 de julho de 2018 - Divulgada no D.E.J.T. - Caderno Judiciário de 19/7/18, págs. 01- 02; DEJT. de 20/7/18, pág. 01; DEJT. de 23/7/18, pág. 01)

E nada obstante todo esse complexo cenário é que, em meio a tantas discussões sobre o assunto, a temática do índice de correção monetária dos débitos trabalhistas foi objeto de nova mudança legislativa, dessa vez promovida pela medida provisória 905, de 11 de novembro de 2019 (MP 905/19), conhecida por “MP do Contrato Verde e Amarelo”, ou por “minirreforma trabalhista”, que teve como aparente objetivo servir de complemento à Reforma Trabalhista advinda da lei 13.467/17, promovendo algumas alterações na legislação trabalhista, previdenciária e fiscal em vigor. Dentre as principais modificações, é de se destacar que, em sentido diametralmente oposto à lei 13.467/17, a MP passou a prever a aplicação do IPCA-E em detrimento da TRD, alterando-se novamente os critérios para atualização dos débitos trabalhistas, com a inserção de nova redação aos arts. 879, § 7º e 883 da CLT, bem como ao art. 39 da lei 8.177, de 1º de março de 1991, dispositivos estes que até então regiam tais critérios processuais na Justiça do Trabalho.

Todavia, a MP 905/19 não foi convertida em lei, e seu período de vigência foi de 12/11/19 a 20/4/20, de modo que muitas decisões judiciais levam em consideração tal período e o teor da MP como critério de atualização monetária (com base no IPCA-E).

Voltando-se à ADI 5867 (Processo 0015797-34.2017.1.00.0000) e às ações a ela apensas e dependentes (ADC 58, ADC 59 e ADI 6021), no final de junho de 2020, o relator das ações, ministro Gilmar Mendes, determinou a suspensão nacional de todos os processos no âmbito da Justiça do Trabalho em que o tema seja discutido. No plenário, o julgamento teve início em 29 de junho, oportunidade em que houve a leitura do relatório e a sustentação oral das partes e dos amicus curiae.

O julgamento teve início em agosto do último ano, tendo o ministro relator Gilmar Mendes votado pela inconstitucionalidade da TR para a correção monetária de débitos trabalhistas e de depósitos recursais no âmbito da Justiça do Trabalho, e pela utilização do mesmo critério de juros e correção monetária aplicado nas condenações cíveis em geral: o IPCA-E, na fase pré-judicial, e, a partir da citação, a taxa Selic.

O voto do referido relator, em julgamento finalizado no dia 18/12/20, foi acompanhado pelos ministros Alexandre de Moraes, Luís Roberto Barroso, Cármen Lúcia, Dias Toffoli e Nunes Marques.

Divergindo do voto do relator tivemos os ministros Edson Fachin, Rosa Weber, Ricardo Lewandowski e Marco Aurélio. Seus votos divergentes foram no sentido de acompanhar o relator para afastar o uso da TR como índice de atualização das dívidas trabalhistas. No entanto, entenderam que o índice que deve ser utilizado é o IPCA-E, assim como o TST decidiu em 2015. Segundo a divergência, os cidadãos trabalhadores que procuram a JT, e são partes vencedoras, devem receber os valores que lhe são devidos do valor mais próximo real da moeda. O uso da TR como índice de correção não corrobora com a justa remuneração do trabalho humano, devendo ser utilizados critérios de correção monetária que expressem a recomposição diante da real desvalorização da moeda: "IPCA-E ou INPC são aqueles que refletem a inflação acumulada e devem ser adotados como índice de correção".

O ministro Luiz Fux, presidente do Supremo, declarou-se impedido e não participou do julgamento.

Dessa forma, na sessão do Tribunal Pleno realizada por videoconferência no último dia 18/12/20, foi proclamada a seguinte decisão:

Decisão: O Tribunal, por maioria, julgou parcialmente procedente a ação, para conferir interpretação conforme à Constituição ao art. 879, § 7º, e ao art. 899, § 4º, da CLT, na redação dada pela Lei 13.467 de 2017, no sentido de considerar que à atualização dos créditos decorrentes de condenação judicial e à correção dos depósitos recursais em contas judiciais na Justiça do Trabalho deverão ser aplicados, até que sobrevenha solução legislativa, os mesmos índices de correção monetária e de juros que vigentes para as condenações cíveis em geral, quais sejam a incidência do IPCA-E na fase pré-judicial e, a partir da citação, a incidência da taxa SELIC (art. 406 do Código Civil), nos termos do voto do Relator, vencidos os Ministros Edson Fachin, Rosa Weber, Ricardo Lewandowski e o Ministro Marco Aurélio, que, preliminarmente, julgava extinta a ação, sem apreciação da matéria de fundo, ante a ilegitimidade ativa da requerente, e, vencido, acompanhava, no mérito, o voto divergente do Ministro Edson Fachin. Por fim, por maioria, o Tribunal modulou os efeitos da decisão, ao entendimento de que (i) são reputados válidos e não ensejarão qualquer rediscussão (na ação em curso ou em nova demanda, incluindo ação rescisória) todos os pagamentos realizados utilizando a TR (IPCA-E ou qualquer outro índice), no tempo e modo oportunos (de forma extrajudicial ou judicial, inclusive depósitos judiciais) e os juros de mora de 1% ao mês, assim como devem ser mantidas e executadas as sentenças transitadas em julgado que expressamente adotaram, na sua fundamentação ou no dispositivo, a TR (ou o IPCA-E) e os juros de mora de 1% ao mês; (ii) os processos em curso que estejam sobrestados na fase de conhecimento (independentemente de estarem com ou sem sentença, inclusive na fase recursal) devem ter aplicação, de forma retroativa, da taxa Selic (juros e correção monetária), sob pena de alegação futura de inexigibilidade de título judicial fundado em interpretação contrária ao posicionamento do STF (art. 525, §§ 12 e 14, ou art. 535, §§ 5º e 7º, do CPC) e (iii) igualmente, ao acórdão formalizado pelo Supremo sobre a questão dever-se-á aplicar eficácia erga omnes e efeito vinculante, no sentido de atingir aqueles feitos já transitados em julgado desde que sem qualquer manifestação expressa quanto aos índices de correção monetária e taxa de juros (omissão expressa ou simples consideração de seguir os critérios legais), vencidos os Ministros Alexandre de Moraes e Marco Aurélio, que não modulavam os efeitos da decisão. Impedido o Ministro Luiz Fux (Presidente). Presidiu o julgamento a Ministra Rosa Weber (Vice-Presidente). Plenário, 18.12.2020.” (STF – ADIn 5.867/DF, ADIn 6.021/DF, ADC 58/DF, ADC 59/DF – Tribunal Pleno – relator min. Gilmar Mendes – Sessão realizada por videoconferência em 18/12/20 – resolução 672/20 – STF) (g.n.)

Em suma, a TR foi definitivamente afastada como indexador dos débitos provenientes de decisões proferidas pela Justiça do Trabalho. Em seu lugar, o STF adotou um sistema híbrido de correção: da data da constituição do crédito (momento em que o empregado se torna credor de algum pagamento), até o ajuizamento da reclamação trabalhista correspondente (fase pré-judicial), a correção a ser aplicada é a da variação do IPCA-E. Após a propositura da ação, a partir da citação do réu (fase judicial), incidirá a taxa Selic para atualização do débito.

Como já aconteceu em julgamentos anteriores sobre o tema, os efeitos da decisão foram modulados, agora da seguinte forma:

Não obstante, do resultado proclamado, há um ponto que tem sido questionado pela comunidade jurídica por aparente obscuridade e/ou omissão. Trata-se da determinação de manutenção, ou não, nas decisões condenatórias proferidas pela Justiça do Trabalho, dos juros de mora de 1% ao mês, contados do ajuizamento da ação até a data do efetivo pagamento (art. 39, § 1º, da lei 8.177/91).

Isso porque, em uma primeira análise, o voto do ministro Gilmar Mendes permitiria concluir que, aplicada a taxa Selic para a correção monetária, não haveria espaço para incidência concomitante dos juros de mora – lembrando-se aqui que a taxa Selic se trata de índice que já contempla juros pelo atraso no pagamento (juros moratórios), os quais possuem a mesma natureza daqueles previstos na lei 8.177/91, mais o índice de inflação estimada para o período, ou seja, correção monetária.

Diante da aparente obscuridade e omissão na decisão tomada pelo Pleno do STF em 18/12/20, a qual possui efeito erga omnes e força vinculante, há uma grande probabilidade de que, após a devida publicação, contra ela sejam opostos embargos de declaração, fazendo com que uma solução definitiva ao tema somente exsurja após o devido saneamento e efetivo aclaramento de tais pontos, máxime acerca da aplicação dos juros de mora.

Ou seja, embora nos pareça que na recente decisão esteja claro que os juros de mora de 1% ao mês não serão mais computados a partir do ajuizamento da ação (considerando que a SELIC a ser aplicada conceitualmente contempla os juros de mora), teremos que aguardar eventuais esclarecimentos sobre essa e outras questões para uma resolução definitiva da celeuma que há anos gera tanta discussão.

Portanto, por hora, o que é fato é que o STF adotou um sistema híbrido de correção: da data da constituição do crédito (momento em que o empregado se torna credor de algum pagamento), até o ajuizamento da reclamação trabalhista correspondente (fase pré-judicial), a correção a ser aplicada é a da variação do IPCA-E; e após a propositura da ação, a partir da citação do réu (fase judicial), incidirá a taxa Selic para atualização do débito; sendo que com relação aos juros de mora, teremos que aguardar posicionamento explícito da nossa Suprema corte para alcançarmos qualquer conclusão definitiva.

Processos: ADIn 5.867/DF, ADIn 6.021/DF, ADC 58/DF, ADC 59/DF

_________

1 No mesmo sentido, em 20/9/2017, quando do julgamento de repercussão geral oriunda do RE 870947, o STF manteve orientação de declarar a inconstitucionalidade do art. 1º-F da lei 9.494/97, com a redação dada pela lei 11.960/09, na parte em que disciplina a atualização monetária das condenações impostas à Fazenda Pública segundo a remuneração oficial da caderneta de poupança, ao fundamento de que ele impõe restrição desproporcional ao direito de propriedade (CRFB, art. 5o, XXII).

2 Processo no ED-ArgInc - 479-60.2011.5.04.0231, publicação: DEJT 30/6/17.

Eduardo de Oliveira Cerdeira
Mestre e doutorando, atuante no Direito Trabalhista e Sindical em defesa de multinacionais e sócio do escritório Cerdeira Rocha Vendite e Barbosa Advogados e Consultores Legais.

Carlos Barbosa
Advogado atuante em causas complexas trabalhistas e sócio do escritório Cerdeira Rocha Vendite e Barbosa Advogados e Consultores Legais.

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