1. Controle de constitucionalidade no Brasil
A Constituição Federal encontra-se no ápice da pirâmide normativa, devendo todas as leis e atos normativos serem compatíveis com ela.
1.1 Noções preliminares
A Constituição é o documento mais importante do Estado, pois é nele que se organizam seus elementos estruturais. Em razão de criar o Estado, a Constituição da República encontra-se no ápice da pirâmide normativa, devendo todas as leis e atos normativos serem compatíveis com ela.
Tendo em vista que a Constituição se encontra no topo da hierarquia das normas, as demais leis e atos normativos devem obediência a ela em razão de a Constituição ser o seu fundamento de validade. Assim, a Constituição de um Estado é a norma suprema, ou seja, fundamental, pois é nela que se busca o fundamento de validade de todas as normas existentes no ordenamento jurídico.
Neste sentido é a manifestação de Ricardo Rodrigues Gama:
Existe uma hierarquia das leis, onde a constituição ocupa o posto mais elevado, ficando as demais leis dela dependentes. Esta dependência é a submissão, ou seja, todas as leis não podem afrontar a Constituição. Existindo confronto entre a lei e a Constituição, esta tem prevalência, e aquela não tem validade.1
E também a posição de Regina Maria Macedo Nery Ferrari “Levando em consideração a hierarquia das normas jurídicas, a necessidade de sua adequação à norma hierarquicamente superior, podemos concluir que toda norma que não estiver de acordo com a Constituição é inválida”2.
Este fenômeno onde as leis e atos normativos infraconstitucionais devem obediência à Constituição Federal chama-se Princípio da Supremacia da Constituição, significando que a Constituição Federal se encontra no posto mais elevado do sistema jurídico do país conferindo validade a todos os poderes estatais, ou seja, é a lei superior do Estado.
A razão de a Constituição Federal estar no ápice e possuir supremacia é o fato de a constituição ser obra do poder constituinte originário, ou seja, poderes legislativos, executivos e judiciários. Outrossim, por ela dar fundamento à criação de normas, todas devem-lhe obediência. Sobre o princípio da supremacia da constituição manifesta-se Pedro Lenza, o qual cita o professor José Afonso da Silva:
[...], “significa que a constituição se coloca no vértice do sistema jurídico do país, a que confere validade, e que todos os poderes estatais são legítimos na medida em que ela os reconheça e na proporção por ela distribuídos. É, enfim, a lei suprema do Estado, pois é nela que se encontram a própria estruturação desde e a organização de seus órgãos; é nela que se acham as normas fundamentais de Estado, e só nisso se notará sua superioridade às demais normas jurídicas”. Desse princípio, continua o mestre, “resulta o da compatibilidade vertical das normas da ordenação jurídica de um país, no sentido de que as normas de grau inferior somente valerão se forem compatíveis com a norma de grau superior, que é a constituição. As que não forem compatíveis com ela são inválidas, pois a incompatibilidade vertical resolve-se em favor das normas de grau mais elevado, que funcionam como fundamento de validade das inferiores”.3
O controle de constitucionalidade é a verificação da adequação de um ato jurídico à Constituição, é o exame da adequação das normas à Constituição de maneira a oferecer harmonia e unidade a todo sistema, e, para que este controle exista necessário se faz a existência de uma Constituição rígida.
A rigidez constitucional decorre do fato de que, para que sejam alteradas as normas da Constituição, é necessário um processo mais difícil, marcado pela exigência de um quorum mais elevado.
Sem a rigidez, as normas constitucionais estariam na mesma linha da demais, não existindo a correspondente obediência, não teria sentido falar-se em controle de constitucionalidade. Então, o controle de constitucionalidade, só existe nas constituições dos Estados em que ela seja do tipo rígida.
Neste sentido o conceito de Pedro Lenza:
Uma constituição rígida é aquela que possui um processo de alteração mais dificultoso, mais árduo, mais solene do que o processo legislativo de alteração das normas não constitucionais. A CF brasileira é rígida, diante das regras diante das regras procedimentais solenes de alteração previstas em seu art. 60.4
Sendo assim infere-se que a Constituição é a ordem jurídica fundamental da coletividade, pois contém ideias básicas de Estado, estabelecendo limites e diretrizes ao conteúdo da legislação vindoura, oferecendo uma estabilidade, no sentido de dissolução da ordem constitucional. A Constituição desempenha relevante papel como instrumento de instabilidade, de racionalização do poder e de garantia da liberdade.5
1.2 Formas de Inconstitucionalidade
Busca-se saber quando uma norma infraconstitucional padecerá do vício de inconstitucionalidade. De forma genérica, a inconstitucionalidade analisar-se-á em caso de afronta à Constituição.6
1.2.1 Vício Formal
Os vícios formais atingem somente o ato normativo considerado, sem atingir o seu conteúdo, traduzindo um defeito de formação do ato normativo, referindo-se aos pressupostos e procedimentos relativos à formação da lei, seja no sentido da inobservância de principio de ordem técnica ou pelo procedimento ou pela violação de regras de competência.7
A inconstitucionalidade formal ocorre quando uma norma jurídica é elaborada em desconformidade com o procedimento legislativo estabelecido na Constituição, ou quando não observa as regras de competência. Pode ser por inconstitucionalidade formal, por violação do processo legislativo, ocasionada por vício formal subjetivo (vício na fase iniciativa) e por vício formal objetivo (demais fases).8
Algumas leis são de iniciativa exclusiva de alguma autoridade e se em alguma hipótese esta lei for tomada por iniciativa de outra pessoa senão aquela que tem legitimidade para isso se estará diante do vício formal subjetivo, gerando uma lei inconstitucional.
Assim demonstra o exemplo de Pedro Lenza:
O vício formal subjetivo verifica-se na fase de iniciativa. Tomamos um exemplo: algumas leis são de iniciativa exclusiva (reservada) do Presidente da República, com as que fixem ou modifiquem os efetivos das Forças Armadas, conforme art. 61 da CF/88. Iniciativa privativa, ou melhor, exclusiva ou reservada, significa, no exemplo, ser o Presidente da República o único responsável para deflagrar, dar início ao processo legislativo da referida matéria, Em hipótese contrária (ex.: um deputado federal dando início), estaremos diante de um vício formal subjetivo e será a lei inconstitucional.9
Já o vício formal objetivo, será assim designado quando este vício for verificado nas demais fases do processo legislativo, posteriores à fase de iniciativa. Como exemplo Pedro Lenza discorre que “uma lei complementar sendo votada por quorum de maioria relativa. Existe um vício formal objetivo, na medida em que a lei complementar, por força do art. 69 da CF/88, deveria ser aprovada por maioria absoluta”.10
1.2.2 Vício Material
Caracteriza-se a inconstitucionalidade material quando uma norma jurídica é elaborada em desacordo com o conteúdo material consagrado na lei fundamental, ou seja, a norma constitucional agasalha um conteúdo que é desrespeitado pelo legislador ordinário11
Os vícios materiais originam-se de um conflito de regras ou princípios estabelecidos na Constituição e dizem respeito ao próprio conteúdo ou ao aspecto substantivo do ato.12
Quando a lei ou ato normativo afrontar alguma matéria da Lei Maior, ou seja, se o conteúdo estiver em desacordo com a Constituição, haverá um vício material, devendo ser declarado inconstitucional. Este vício, diz respeito à matéria do ato normativo.13
De outra parte, o desembargador Kildare considera que este controle pode transformar o Judiciário num superpoder, pois a interpretação constitucional levaria a vontade do Juiz a substituir a vontade do legislador ou governo, com violação do princípio da separação dos poderes.14
A inconstitucionalidade material abrange não só o contraste direto do ato legislativo como parâmetro constitucional, como também a aferição do desvio de poder ou do excesso de poder legislativo. E este se constitui um dos mais tormentosos temas do controle de constitucionalidade hodierno, pois afere a compatibilidade da lei com os fins constitucionalmente previstos, consagrando assim o princípio da proporcionalidade, ou seja, a apreciação da necessidade e a adequação da providencia legislativa.15
2. Considerações finais
A Constituição possui supremacia, é o documento mais importante do país, assim, as leis e atos normativos devem obediência a ela. O controle de constitucionalidade ao analisar se uma norma infraconstitucional padecerá de vício de inconstitucionalidade, verifica-o em relação à Lei Maior, de modo a oferecer harmonia a todo o sistema.
______________
1 GAMA, Ricardo Rodrigues. Manual de direito constitucional. 3. ed. Curitiba: Juruá, 2004. p. 57.
2 FERRARI, Regina Maria Macedo Nery. Efeitos da declaração de inconstitucionalidade. 5. ed. rev. atual e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004. p. 74.
3 SILVA, José Afonso da apud LENZA, Pedro. Direito constitucional esquematizado. 10. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Editora Método, 2006. p. 93-94.
4 LENZA, Pedro. Direito constitucional esquematizado. 10. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Editora Método, 2006. p. 93.
5 MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de direito constitucional. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 1002/1003.
6 LENZA, 2006, p. 98-99.
7 MENDES, 2008, p. 1013.
8 MACHADO, 2005, p. 293.
9 LENZA, 2006, p. 99.
10 Ibid.
11 MACHADO, 2005, p. 283.
12 MENDES, 2008, p. 1015.
13 LENZA, 2006, p. 100.
14 CARVALHO, 2004, p. 243.
15 MENDES, 2008, p. 1015-1017.