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A reforma da lei 11.101/05 e a recuperação da sociedade empresária em crise

De forma geral, entende-se que a reforma foi positiva e apresenta às empresas em recuperação judicial um avanço em suas chances de êxito no processo.

17/12/2020

(Imagem: Arte Migalhas)

A lei 11.101/05, que regula a recuperação judicial, a extrajudicial e a falência do empresário e da sociedade empresária, promulgada no ano de 2005, consolidou-se como uma alternativa viável às sociedades que buscam a reestruturação de suas dívidas e estrutura empresária com o objetivo de viabilizar a manutenção de suas atividades e superação da crise econômica.

Nos 15 anos de vigência da lei de falências e recuperações judiciais, a prática demonstra ao mercado que a via da reestruturação da dívida por intermédio do processo de recuperação judicial tem se tornado cada vez mais segura aos que dela se socorrem, considerando o engajamento dos profissionais inseridos nesse contexto, bem como a evolução na interpretação da legislação pela doutrina e jurisprudência.

Isso porque, a lei 11.101/05 deixou de ser analisada segundo o seu conteúdo literal, com exame de artigos e cláusulas contratuais isoladas e passou a ser analisada segundo seus princípios norteadores especialmente em busca do seu objetivo de recuperar a sociedade em crise. Assim, a legislação passou a ser interpretada como um "sistema recuperacional", o que abriu espaço para o debate e flexibilização de conceitos rígidos presentes na legislação, de forma que muitos dos seus regramentos foram relativizados para alcançar o objetivo maior da lei – a recuperação da sociedade empresária.

Em que pese a evolução de interpretação doutrinária e jurisprudencial da legislação, visando o alcance do seu objetivo, a legislação passará por uma reforma, que visa conferir ao processo maior celeridade, segurança jurídica, reequilíbrio do poder dos credores e modernização do procedimento, com a inclusão de diversas novidades e inovações legais.

O procedimento de reforma da LRF foi iniciado com o PL 6.225/05, de relatoria do deputado Hugo Leal que, após amplo debate na Câmara dos Deputados foi aprovado e seguiu para aprovação no Senado Federal. No Senado Federal o projeto de lei tramitou sob o 4.458/20 sob a relatoria do Senador Rodrigo Pacheco e foi aprovado em 25/11/20, seguindo à sanção presidencial.

São diversas as alterações e novidades em relação à redação original da lei 11.101/05, dentre as quais estão disposições sobre insolvência transnacional, maior proteção do patrimônio do devedor e previsão da competência do juízo recuperacional para suspender atos constritivos sobre bens essenciais à sociedade empresária, incentivos à mediação, possibilidade de aprovação do plano de recuperação judicial por termo de adesão firmado pelos credores, possibilidade de extensão do prazo para quitação do passivo trabalhista, encerramento da recuperação judicial após a aprovação do plano, dentre outras tantas inovações.

Essas alterações refletem entendimentos já pacificados pela jurisprudência e incorporados ao processo de recuperação judicial, bem como inovações que trazem segurança ao processo. De forma geral, entende-se que a reforma foi positiva e apresenta às empresas em recuperação judicial um avanço em suas chances de êxito no procedimento recuperacional, garantindo maior liberdade criativa para negociar e angariar fundos.

Dentre os temas que já estavam pacificados pela jurisprudência, está a possibilidade de prorrogação do stay period, cuja redação original indicava o prazo improrrogável de 180 dias de suspensão de ações e execuções em face do devedor. Pela nova redação, é possível prorrogar o prazo por 180 dias adicionais. Há, ainda, a possibilidade de um segundo prazo de suspensão de 180 dias, caso os credores optem por apresentar um plano de recuperação judicial alternativo – o que é mais uma das inovações da reforma da LRF.

Ponto importante relativo às suspensões das execuções é a previsão de suspensão das execuções trabalhistas, inclusive contra os responsáveis solidários e subsidiários à dívida da recuperanda.

Da mesma forma, a lei passa a prever a competência do juízo da recuperação judicial para determinar a suspensão de atos constritivos contra bens de capital, essenciais ao soerguimento da atividade empresária, inclusive relativas a créditos não sujeitos à recuperação judicial possibilitando, ainda, que o juízo recuperacional substitua atos constritivos determinados em execução fiscal.

Nas hipóteses de alienação de Unidades Produtivas Isoladas, a reforma da legislação amplia ainda mais a blindagem e ausência de sucessão de quaisquer responsabilidades em face do adquirente da UPI, explicitando que ele não assumirá dívida de qualquer natureza, seja ela ambiental, regulatória, administrativa, tributária, penal, trabalhista ou derivada de normas anticorrupção.

Importante inovação da legislação diz respeito à possibilidade de financiamento (tomada de empréstimos – dip financing) da empresa em recuperação judicial o que, pela regra anterior, implicava um grande risco ao investidor. Com a nova regulamentação, o investidor se reveste de garantias e conta com uma regulamentação clara e objetiva, que contribuirá para o aumento da oferta desta modalidade de investimento nas empresas em recuperação judicial.

Com relação aos débitos trabalhistas, as alterações permitem ao devedor o alongamento do prazo para quitação do passivo trabalhista para um prazo de até dois anos (redação original limitava o pagamento ao prazo de 1 ano) sem qualquer ressalva quanto a aplicação de deságio, especialmente para a hipótese do caput do art. 54 da LRF, de quitação do passivo no prazo de 1 ano.

Por fim, há expressa permissão para que o produtor rural peça a sua recuperação judicial, inclusive na pessoa física.

Em que pese a boa impressão acerca das alterações e suas motivações, é importante acompanhar a interpretação jurisprudencial destas novas regras. A prática demonstra um natural e reiterado enfrentamento a entendimentos e posicionamentos que visam criar rigidez e dificuldade negocial, de forma que são esperadas novas flexibilizações às normas previstas na reforma da lei 11.101/05, sempre no intuito de se alcançar os objetivos previstos na legislação.

É de grande importância que haja um equilíbrio em relação aos interesses de credores visando a proteção do crédito. No entanto, é imperiosa a busca pela manutenção da atividade empresarial em atendimento ao art. 47 da LRF buscando a manutenção de sua função social e estímulo à atividade econômica com geração de empregos, renda, tributos e bem estar social.

As alterações promovidas pela reforma da lei 11.101/05, apresentadas em quadro comparativo aqui.

Fernando Luiz Tegge Sartori
Especialista em Direito e Processo do trabalho e Direito Empresarial, sócio do escritório Sartori Sociedade de Advogados.

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