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Likes nas redes sociais e sua relação com a proteção de dados pessoais

O like praticado nas redes sociais em princípio pode parecer uma atitude inocente e sem importância, mas com olhar atento, observa-se o legítimo objetivo.

16/12/2020

(Imagem: Arte Migalhas)

Buscando espaço no mundo moderno-digital, inúmeras pessoas utilizam, cotidianamente meios tecnológicos para se expressarem, de forma profissional, pessoal, explicitando interesses, inclinações, pensamentos e opiniões, deixando à disposição os rastros da sua persona digital em todas as movimentações realizadas na rede.

Nesse ambiente virtual não há barreiras, considera-se então, limites zero, porque diante da comunicação facilitada, o tráfego das informações torna-se acelerado e desnudado. Dito isso, surge o like com significado de métrica da vaidade (segundo o marketing digital), que através dos algoritmos demonstra que determinada ação teve visibilidade.

Mas, qual a real importância de um simples like na rede social? Popularidade ou apenas simbolizar que usuários gostaram do conteúdo postado? O resultado do like é mais significativo e profundo, reflete a própria pessoa natural.

Nesse encadeamento de ideias, é manifesto que os dados pessoais sempre existiram, mas foi com a contemporaneidade que o uso descontrolado abriu portas para o conhecimento profundo do perfilamento das pessoas. O volume de dados pessoais em trânsito é gigantesco e ocorre de forma voluntária todos os dias. Analisados por um prisma, os dados são muito mais que input, quando relacionados com outras informações e contextos, são aplicados e manuseados para publicidades direcionadas, venda de produtos e oferecimento de serviços específicos, conforme a aplicação dos likes.

Isto posto, nesta situação é evidente que o like incluso em um cenário, pode remeter-se a um dado pessoal, em razão de identificar ou tornar identificável uma pessoa natural. Apesar de ainda haver no Brasil uma insuficiência relativa à proteção de dados, deve-se atentar para a decisão da Corte Constitucional Alemã (1983) que entendeu "no contexto do processamento eletrônico de dados, não existe mais dados insignificantes", decisão abraçada pelo Supremo Tribunal Federal. Afinal, se o dado pessoal faz parte da personalidade da pessoa natural, logo, é a própria pessoa natural.

Assim, os dados, anteriormente considerados neutros não existem mais, considerável mencionar que os dados pessoais são relacionados aos indivíduos, por consequência identificam ou tornam identificáveis a pessoa natural, em razão disso, merecedores de proteção.

De outro lado, a existência de ferramentas de Big Data, Analytics e Inteligência Artificial demonstram que o fluxo dos dados pessoais cresceu. Assim, concomitantemente com o seu crescente valor. Dessa forma, visando a proteção durante o manuseio dos dados pessoais, a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais determinou regras para sua utilização, sendo necessário observá-la para realização de tratamento de dados pessoais.

Abordagem adicional, o like também realiza direcionamento de comportamento, e quando vinculado à criança e adolescente, torna-se mais delicado, uma vez que são seres altamente sugestionáveis pelo fato de estarem em desenvolvimento físico, intelectual, emocional e social, sendo certo que a utilização dos seus dados pessoais pode ser nociva e sem recuperação.

Os likes adicionados nas redes sociais mudam comportamentos da sociedade, alteram consumos de informação e, principalmente interferem na privacidade dos usuários. Lembrando que o direito à privacidade está ligado diretamente ao direito da personalidade humana, protegido no artigo 5º, X, da Constituição Federal, “sa~o inviola'veis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenizac¸a~o pelo dano material ou moral decorrente de sua violac¸a~o”.

O Código Civil, em seu artigo 21, dispõe que “a vida privada da pessoa natural e' inviola'vel, e o juiz, a requerimento do interessado, adotara' as provide^ncias necessa'rias para impedir ou fazer cessar ato contra'rio a esta norma”.

Já o Marco Civil da Internet, em seu artigo 3º, disciplina o uso da internet no Brasil e tem os seguintes princípios: II - proteção da privacidade; III - proteção dos dados pessoais, na forma da lei.

A Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais, nº. 13.709/18 “dispõe sobre o tratamento de dados pessoais, inclusive nos meios digitais, por pessoa natural ou por pessoa jurídica de direito público ou privado, com o objetivo de proteger os direitos fundamentais de liberdade e de privacidade e o livre desenvolvimento da personalidade da pessoa natural”. E em seu artigo 2º pondera sobre a privacidade e inviolabilidade da intimidade, da honra e da imagem.

A Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948, em seu artigo 12 também protege a privacidade, “ninguém será sujeito a interferências em sua vida privada, em sua família, em seu lar ou em sua correspondência, nem a ataques à sua honra e reputação. Todo ser humano tem direito à proteção da lei contra tais interferências ou ataques”.

A Lei de Crimes Cibernéticos 12.737/12, tipifica criminalmente delitos informáticos como divulgação de informações privadas.

Diante do apresentado, necessária a atenção com os likes praticados, já que vinculados à personalidade do ser humano, costumes, preferências, revelam sua intimidade e estendem a privacidade do indivíduo para o mundo.

Ana Carolina Migliorini
Advogada. Especialista em Direito Constitucional pela PUC/Campinas. Pós-Graduada em Compliance Digital e Gestão de Proteção de Dados Pessoais pela PUC-Campinas. Pós-Graduada em Proteção de Dados e Novas Tecnologias pela EMERJ.

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