As ações por danos morais em decorrência de diagnósticos não confirmados tem ocorrido com maior frequência. Vários motivos podem ser elencados: proliferação de clínicas que realizam exames com profissionais sem a devida qualificação, equipamentos obsoletos, pouco tempo despendido no exame, falta de treinamento, limitações do próprio exame, baixíssima remuneração, entre outros.
É preciso ressaltar que inexiste até o momento exame com 100% de precisão diagnóstica. O médico ao analisar um teste deve correlacionar os achados com o quadro clínico do doente e a epidemiologia pertinente ao caso. Há que se destacar que todo método diagnóstico tem tecnicamente sensibilidade, especificidade, valor preditivo e acurácia diagnóstica. É fundamental que o profissional conheça essas variáveis ao solicitar determinado exame complementar para uma análise global do caso, e em caso de dúvidas requisitar outro método para o devido esclarecimento.
A título de ilustração podemos citar o exame de eletrocardiograma (ECG): cerca de 50% dos pacientes com infarto agudo do miocárdio não apresentam alterações típicas no 1º exame; todavia se o doente apresentar dor no peito e tiver a alteração típica (elevação ST), a especificidade do exame (probabilidade de uma pessoa avaliada e normal ter seu ECG negativo) é de 91%, e a sensibilidade (probabilidade de um indivíduo avaliado e doente ter seu teste alterado) somente de 46%. Exames seriados de ECG reduzem a probabilidade de não realizar o diagnóstico de infarto entre 10 a 20%.
Em outro exemplo, o teste molecular de secreções da nasofaringe coletadas por swab para covid-19 (RT-PCR) está indicado preferencialmente entre o 3º e o 7º dia após o início dos sintomas. Lembrando que esse teste identifica o RNA do vírus, depois do 7º dia de sintomas há tendência de diminuir a quantidade de partículas virais no organismo e, assim reduz a chance de encontrar o vírus na amostra.
Daí a importância de toda a literatura pertinente ao exame e à enfermidade nas disciplinas de epidemiologia e saúde pública; em termos de gestão dos serviços médicos, além de médicos experientes, os serviços se beneficiam de protocolos e treinamentos relativos à Medicina baseada em evidências, além das atualizações de cada especialidade.
Infelizmente as áreas pública e privada do setor de saúde no Brasil treinam muito pouco os seus profissionais; a maioria tem que custear do próprio bolso cursos, especializações, congressos, mestrado e doutorado, sem qualquer tipo de apoio. Soma-se a isso o caos crônico em decorrência da má gestão da área.
Portanto a tendência é de aumento desse tipo de ação; ao profissional cabe zelar ao máximo e documentar no prontuário do paciente o laudo do teste complementar e a sua avaliação dos resultados dos exames médicos diagnósticos e condutas decorrentes dos achados.
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Arq. Bras. Cardiol. vol.87 no.2 São Paulo Aug. 2006
Medicina Baseada em Evidências: a arte de aplicar o conhecimento científico na prática clínica A. A. LOPES Área de Concentração em Epidemiologia Clínica do Curso de Pós-Graduação em Medicina da Faculdade de Medicina da Universidade Federal da Bahia, Salvador, BA.
Os protocolos e a decisão médica: medicina baseada em vivências e ou evidências? Severina Alice da Costa UchôaI; Kenneth Rochel de Camargo JrII I Departamento de Saúde Coletiva, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, RN.