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Caracterização da covid-19 como doença ocupacional

A doença profissional ou ocupacional é aquela que tem sua causa desencadeada pelo exercício do trabalho em determinada atividade, como, por exemplo, em funções exercidas com exposição continuada a agentes químicos como o chumbo.

10/12/2020

(Imagem: Arte Migalhas)

A lei 8.213/91, a qual dispõe sobre a Previdência Social, em seu artigo 19 descreve: “Acidente do trabalho é o que ocorre pelo exercício do trabalho a serviço de empresa ou de empregador doméstico ou pelo exercício do trabalho dos segurados referidos no inciso VII do art. 11 desta lei, provocando lesão corporal ou perturbação funcional que cause a morte ou a perda ou redução, permanente ou temporária, da capacidade para o trabalho.”.

Dessa forma, o acidente de trabalho ocorre quando um trabalhador sofre um acidente à serviço da empresa ou no deslocamento residência/trabalho/residência. Pode ser desde uma pequena torção gerada, por exemplo, por queda nas escadas do estabelecimento empresarial, até mesmo ao óbito por um grave infortúnio ocorrido com o maquinário da companhia.

Ainda, há aquelas situações que são equiparadas ao acidente de trabalho, quais sejam:

Art. 20. Consideram-se acidente do trabalho, nos termos do artigo anterior, as seguintes entidades mórbidas:

I - Doença profissional, assim entendida a produzida ou desencadeada pelo exercício do trabalho peculiar a determinada atividade e constante da respectiva relação elaborada pelo Ministério do Trabalho e da Previdência Social;

II - Doença do trabalho, assim entendida a adquirida ou desencadeada em função de condições especiais em que o trabalho é realizado e com ele se relacione diretamente, constante da relação mencionada no inciso I.

A doença profissional ou ocupacional é aquela que tem sua causa desencadeada pelo exercício do trabalho em determinada atividade, como, por exemplo, em funções exercidas com exposição continuada a agentes químicos como o chumbo, sendo que tal exposição pode causar moléstias como o saturnismo ou plumbismo, infecção causada justamente pela elevada exposição ao agente, a qual ocorre em profissões, por exemplo, como as de montagem e recuperação de baterias.

Para que se caracterize uma doença como profissional, esta deve estar elencada na relação confeccionada pelo Ministério do Trabalho e Emprego e da Previdência Social. São normalmente moléstias que não são súbitas, mas que se desenvolvem continuamente no organismo.

Neste contexto, a doença profissional é adquirida pela realização de um trabalho específico. Logo, o agente próprio é o responsável por desencadear ou piorar condições do organismo do funcionário.

Já a doença do trabalho é aquela adquirida ou desencadeada em função de condições especiais que o trabalho se relaciona ou realiza-se diretamente. A exemplo temos a surdez definitiva em quem labora em lugares ruidosos. Pode ter relação também com o ambiente de realização das funções.

Assim como os acidentes, para as doenças profissional e do trabalho podem ser requeridos os benefícios do auxílio-doença/acidente ou mesmo a aposentadoria por invalidez.

No caso dos acidentes do trabalho ou de trajeto, quando estes ocorrem a empresa é obrigada, em até um dia útil após o acidente, a comunicar o Órgão da previdência social, por meio de abertura de CAT (Comunicação De Acidente De Trabalho), nos termos do artigo 22, da lei 8.213/91. Em caso de óbito decorrente do acidente, tal comunicação deverá ser realizada imediatamente.

A não realização de CAT ou sua intempestividade sujeitará a empresa ao pagamento de multa nos termos dos artigos 286 e 336 do decreto 3.048/99. Lembrando que, em caso de reincidência nesta conduta, a multa será elevada em duas vezes.

Realizada a CAT, verificar-se-á a necessidade de afastamento médico do colaborador, sendo que a data do acidente será o início da incapacidade laborativa para o exercício da atividade habitual, ou o dia da segregação compulsória, ou o dia do diagnóstico.

Caso o trabalhador seja acometido por uma incapacidade superior a 15 dias, o funcionário poderá requerer os benefícios do INSS, a partir do 16º dia. A empresa ou o próprio colaborador poderá agendar a perícia, sendo que caso realmente seja constatada que a lesão o impede de exercer suas funções por tempo indeterminado ou determinado, este fará jus ao benefício do auxílio-doença ou auxílio acidente. A perícia que irá verificar o nexo entre o trabalho e o ocorrido.

Em perícia, o médico buscará ainda verificar se os trabalhadores que sofreram acidente do trabalho ou doença ocupacional tiveram limitação parcial causada por estas ocorrências. Detectado tal relação e concedido o auxílio acidente, este será no valor de 50% sobre o salário benefício, sendo devido até a aposentadoria do trabalhador.

Caso seja constatado e garantido seu afastamento via INSS, por auxílio acidente, o trabalhador, ao retornar de seu afastamento também terá estabilidade no emprego pelo período igual a 12 meses, conforme artigo 118 da lei 8.213/91.

Além disso, se o colaborador tiver seu afastamento superior a 15 dias, a empresa terá obrigação de continuar recolhendo o FGTS do funcionário por todo o período afastado. Nos casos em que o acidente levar a incapacidade total do obreiro, poderá ele entrar com ação competente para requerer aposentadoria por invalidez. Caso seja a incapacidade parcial, poderá pleitear aposentadoria especial.

No tocante aos casos em que o colaborador for a óbito, seus dependentes terão o direito de receber pensão por morte.

De toda forma, em casos de acidente ou doenças relacionadas ao labor, a empresa poderá ser civilmente responsabilizada, podendo ser condenada a indenizar o trabalhador. Frisa-se que o artigo 157 da CLT dispõe sobre a obrigação das empresas de cumprir e fazer cumprir com as normas de segurança e medicina do trabalho, além de instruir os trabalhadores através de ordens de serviço com a finalidade de evitar o acidente do trabalho.

No tocante a citada responsabilidade civil, em regra geral, temos que ela é subjetiva, porém, nos casos em que se trata de atividade de risco, esta poderá ser considerada objetiva. Desta forma, a maior parte da doutrina entende que para culpabilizar a empresa pela doença/acidente se faz necessário que esta tenha agido com culpa ou dolo, ocasionando tal infortúnio, com exceção, como dito, das atividades de risco. Há ainda de ser provado o nexo causal entre o ato praticado e o prejuízo causado ao trabalhador.

Frisa-se a importância das atitudes preventivas por parte das empresas. Segundo a OMS (Organização Mundial da Saúde), 96% dos casos de acidente de trabalho podem ser evitados. Assim, de extrema relevância que a empresa conduza medidas a fim de garantir tal prevenção.

Como exemplo de medidas, a utilização correta de EPI (Equipamento de Segurança), quando necessário, devendo a empresa não apenas fornecer, mas fiscalizar o uso por seus funcionários. Temos também que a cultura da prevenção pode e deve ser implantada na empresa, conscientizando todos os colaboradores, colocando em práticas medidas protetivas, como a manutenção de uma CIPA ativa e atuante que forneça instruções gerais e comunicados para que se evite acidentes.

Outra medida que deve ser utilizada rigorosamente na empresa é o PPRA (Programa de proteção a riscos ambientais), em que se avalia e reconhece todos os possíveis riscos empresariais, estabelecendo medidas de eliminação, redução ou controle deste risco. O PCSMO (Programa de controle médico de saúde ocupacional) é outro programa de caráter preventivo, que visa diagnosticar possíveis danos à saúde do empregado decorrente da atividade exercida.

O PCMSO tem como principal característica seu escopo de prevenção, para rastrear e diagnosticar precocemente doenças ocupacionais que possam ocorrer. Neste escopo, ele deverá levar em conta os aspectos individuais, mas também os coletivos dos ambientes de trabalho, demonstrando soluções com base nestes riscos encontrados.

E, por fim, cita-se o AET (Análise ergonômica do trabalho), a qual permite avaliar e prevenir contra possíveis doenças do trabalho, tais como a depressão, por meio de fornecimento de equipamentos adequados, com o levantamento de informações e organização do trabalho.

Em relação a covid-19, temos que esta trata-se de uma doença causada pelo vírus SARS-CoV-2, o qual tem levado o país e o mundo a um elevado estado crítico de calamidade pública.           

No âmbito trabalhista e previdenciário, a doença trouxe sérias adaptações tanto para o empregado, quanto para o empregador. Algumas empresas, com base na lei 14.020, de 06 de julho de 2020, adotaram suspensões e reduções das jornadas e salários de seus funcionários. Outras adotaram o teletrabalho ou ainda estão trabalhando presencialmente, de acordo com as legislações específicas de seu estado e município.

Por analogia ao artigo 21 da lei 8.213/91, havendo a comprovação da patologia foi contraída em razão do trabalho, ou seja, a exposição dentro das dependências da empresa, esta poderia ser considerada como acidente de trabalho.

Em relação ao coronavírus, a então MP 927/20, em seu artigo 29, especificou que esta não poderia ser considerada uma doença ocupacional, o que foi derrubado pelo tema 932/STF, RE 828.040. No mais, por ausência de votação, a Medida já foi derrubada.

Em 1º de setembro de 2020, o Ministério da Saúde atualizou a Lista de Doenças Relacionadas ao Trabalho (LDRT), através da portaria 2.309/20. Porém, após grande pressão das empresas, a norma foi derrubada.

Desta forma, a situação para que seja caracterizada como moléstia ocupacional há necessidade de que se comprove nexo com as condições de trabalho. Não se exclui, ainda, a possibilidade de responsabilização objetiva, ou seja, independente de culpa ou dolo, para casos de atividades de risco. Neste sentido, é essencial que as empresas que optarem o trabalho presencial sejam responsáveis com as medidas de saúde e segurança para evitar contaminação.

Entre estas medidas podemos citar o uso obrigatório de itens de segurança para todos os colaboradores, incluindo, máscaras, álcool em gel 70%, face shield e/ou barreiras de proteção acrílica entre os funcionários. Obrigatória também a disponibilização de sabão, folhas de papel e água para constante higienização pessoal dos obreiros.

Além disso, a empresa pode tomar atitudes de segurança como auferir temperatura de todos aqueles que adentrarem a empresa, realizar treinamentos sobre prevenção, adotar política de afastamento de casos suspeitos ou confirmados da doença, ou, ainda, afastar funcionários que trabalharem próximos de eventual caso confirmado de covid.

A utilização e implementação de todos os equipamentos de segurança, bem como a fiscalização entre os funcionários para o uso correto, leva destaque importantíssimo para a prevenção da propagação da doença. É essencial que todas estas medidas sejam documentadas pela empresa.

Os funcionários têm um papel importante para a manutenção da higiene pessoal, conscientização e respeito, mas a empresa, por sua vez, deve garantir a todos o direito à saúde, bem estar, informação, organização e prevenção.

Desta forma, a Empregadora deve utilizar-se de todos os meios disponíveis no mercado, para a segurança de seus funcionários, de modo que caso opte pelo trabalho presencial, garanta que sejam realizados os procedimentos corretos para a prevenção da propagação da doença, documentando suas ações. Tal conduta poderá auxiliar em eventual defesa trabalhista ou previdenciária, referente a ausência de nexo causal entre o labor e a contaminação por covid-19 por um de seus funcionários.

Julia Silva Bottignon Kosaka
Auxiliar de Processos Jurídicos do Grupo Pasquali. Graduanda do curso de Direito na UNAERP.

Jéssica Galloro Lourenço
Gerente de relações Trabalhistas do Grupo Pasquali. Graduada pela Faculdade de Direito de Franca. MBA em Gestão Empresarial pela FGV. Graduada em Compliance, pela Legal, Ethics and Compliance. Mestranda pela UNAERP.

Ricardo Calcini
Mestre em Direito pela PUC/SP. Professor de pós-graduação em Direito do Trabalho da FMU. Palestrante e instrutor de eventos corporativos "in company" pela empresa Ricardo Calcini | Cursos e Treinamentos.

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