Migalhas de Peso

O uso de anabolizantes reprova em concurso público?

Para alcançar à nomeação nas carreiras policiais, dentre as várias fases do certame, o candidato será submetido ao exame toxicológico e a investigação social.

19/11/2020

(Imagem: Arte Migalhas)

O serviço público sempre atrai os cidadãos, seja pela nobreza do serviço desempenhado, seja pela estabilidade financeira. Porém, em algumas carreiras, especificamente as Polícias em geral, é a vocação que mais motiva os candidatos.

Em outra perspectiva, há aqueles que além do cargo público, almejam um corpo mais avantajado, e, para tanto, consomem os esteroides e anabolizantes.

Ocorre que, para alcançar à nomeação nas carreiras policiais, dentre as várias fases do certame, o candidato será submetido ao exame toxicológico e a investigação social.

Desse modo, é necessário esclarecermos as possibilidades que poderão surgir da realização dessas fases do concurso em contraste com o uso ou até comercialização de tais substâncias.

Nessa linha, várias dúvidas surgem dos candidatos, sendo comum a seguinte indagação:

O uso de esteroides, anabolizantes ou substância congênere é capaz de retirar o “concurseiro” do seu sonho?

A resposta mais adequada para essa pergunta é depende! Na maioria dos concursos de carreira policial, o exame toxicológico visa verificar o consumo de drogas ilícitas, como: maconha, cocaína, crack, lança perfume dentre outras, sendo assim, não abrangendo o álcool, a ritalina e os anabolizantes.

Contudo, nada impede que o edital do concurso estabeleça uma aferição mais abrangente de modo a investigar o consumo de esteroide, anabolizantes e afins.

É importante distinguir a figura do indivíduo que apenas consome as drogas em apreço daqueles que, em algum momento, foi pego com referido material, sem a autorização para uso.

Isso porque, embora o uso do anabolizante, por exemplo, a depender do edital e em homenagem ao princípio da alteridade, por si só, não tem o condão de retirar o candidato do concurso público.

Ocorre que, na fase atinente à investigação social é possível advir um obstáculo no certame do candidato, como narrar o art. 273 do Código Penal, senão vejamos:

Art. 273 – Falsificar, corromper, adulterar ou alterar produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais: 

Pena – reclusão, de 10 (dez) a 15 (quinze) anos, e multa

§ 1º – Nas mesmas penas incorre quem importa, vende, expõe à venda, tem em depósito para vender ou, de qualquer forma, distribui ou entrega a consumo o produto falsificado, corrompido, adulterado ou alterado.

§ 1º-A – Incluem-se entre os produtos a que se refere este artigo os medicamentos, as matérias-primas, os insumos farmacêuticos, os cosméticos, os saneantes e os de uso em diagnóstico.

§ 1º-B – Está sujeito às penas deste artigo quem pratica as ações previstas no § 1º em relação a produtos em qualquer das seguintes condições:

I – Sem registro, quando exigível, no órgão de vigilância sanitária competente

II – Em desacordo com a fórmula constante do registro previsto no inciso anterior;

III – Sem as características de identidade e qualidade admitidas para a sua comercialização;

IV – Com redução de seu valor terapêutico ou de sua atividade;

V – De procedência ignorada;

VI – Adquiridos de estabelecimento sem licença da autoridade sanitária competente;

Como é sabido os esteroides e anabolizantes são dotados de fins medicinais, sendo a comercialização restrita a aqueles que preencherem os requisitos legais, logo, a venda não é proibida, mas realizá-la sem a autorização do órgão de vigilância sanitária é infração penal.

Nessa linha, a prática da conduta acima caracteriza crime, e, além disso, é considerado um delito hediondo, conforme o art. 1º inciso VII-B da lei 8.072/90.

Portanto, a prática do crime supramencionado é capaz de impedir o ingresso na carreira policial, desde que, seja o candidato devidamente condenado em sentença transitada em julgado, é dizer, decisão que não comporta recurso.

Desse modo, não podendo as ações penais em tramite ser o fundamento para não recomendar o candidato, reprovando-o, por ocasião da investigação social.

Noutro giro, é importante destacar a possibilidade de interferência do uso de anabolizantes e esteroides quando da realização do Teste de Aptidão Física-TAF.

Isso ocorre diante da possibilidade dos editais preverem a realização de exame antidoping antes da realização da prova, isto é, caso haja o consumo de esteroides, anabolizantes, bem como substância que potencialize o desempenho humano, o referido exame poderá identificar, e, sendo positivo o resultado, a exclusão do concorrente será fatal.

Apesar da instabilidade e da impossibilidade de prever as substâncias que cada edital buscará identificar na realização do exame antidoping, podemos partir da existência do Código Mundial de Antidopagem de 2015, o qual estabelece a reprovação por uso de anabólicos dos atletas.1

Contudo, mesmo diante do Código aludido é o edital do concurso público que irá nortear o atleta, lembrando que existe um lapso temporal em que o candidato deverá estar “limpo” das substâncias proibidas.

Assim, conclui-se que o consumo de esteroides e anabolizantes pelo candidato, precipuamente nas carreiras policiais, pode ser impeditivo para alcançar o tão sonhado cargo. Porém, é necessário acompanhar e verificar o edital sobre a possível realização de exame antidoping ou saber o nível de abrangência do exame toxicológico.

Em todas essas hipóteses é preciso analisar o edital e a lei que rege o cargo e as circunstâncias para possível anulação de ato judicial que extrapole a ilegalidade.

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*Thárik Uchôa Luz advogado, pós-graduado lato sensu pela Escola Superior de São Paulo, especialista em causas envolvendo concursos públicos e servidores públicos. Capitaneia o escritório Uchôa Advocacia.

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