A situação, incontestavelmente, é a refletida no artigo 62 da nossa Constituição Federal. Estamos diante de caso de relevância e urgência, apto à adoção de medidas provisórias, com força de lei. Aliás, o fato que ampara a aplicação do referido artigo constitucional (a pandemia da covid-19) causou um estrago tremendo. Precisamos, contudo, avançar.
Os esforços foram feitos por todos. Erros e acertos foram cometidos, típicos do enfrentamento de algo novo. Dentro do pacote de medidas do Governo Federal, o denominado ‘auxílio emergencial’ movimentou e movimentará algo em torno de 1 trilhão de reais.
Contudo, o pacote tende à ir esvaziando. E a economia precisa se recuperar.
Eis que, mais uma vez, surge a válvula de escape do ‘crédito consignado’, agora por intermédio da medida provisória 1.006, de 1/10/20, que ampliou o percentual de 30% para 35%, para a modalidade de empréstimo consignado, durante um pequeno – mas importantíssimo - período.
O crédito consignado, vale historiar, já estava presente na lei 1.046/50, foi aprimorado pelas leis 8.112/90, 8.213/91 e 10.820/03, mas já reside nos lares brasileiros desde os idos de 1930. Na época, o presidente Enrico Gaspar Dutra externava sua preocupação com o que poderia acontecer aos elegíveis à tal linha de crédito. Temia pela ausência de controle na forma de contratação e nos reflexos que isso poderia gerar às famílias, com o endividamento.
O que se mostrou na prática, com o passar dos anos, foi relativamente diferente. O controle foi muito bem feito pelas instituições financeiras e o próprio percentual de 30% evitou o superendividamento.
O crédito consignado se tornou uma mola de crescimento e circulação de riquezas da economia, culminando na criação de uma nova modalidade: o cartão de crédito consignado, por intermédio da lei 13.172/15 (acresceu-se 5% à mais, na margem consignável e à título exclusivo, para o uso com o cartão). Esse, permitindo um fôlego extra para quem necessita de mais crédito, com juros baixos, podendo, então e por meio de saque incentivado pelo Legislador, quitar/amortizar dívidas mais altas. Sem falar na possibilidade de que uma parcela da sociedade, que não tinha acesso à cartão de crédito, passasse à tê-lo. Um destaque: nesse produto, as dívidas não se tornam uma bola de neve.
Antes das edições de cada uma das citadas leis acima, os fundamentos que as alicerçavam versavam acerca do objetivo de promover o crescimento sustentado da economia sem comprometer o equilíbrio e a responsabilidade fiscal, bem como de lidar com a contração do mercado de crédito, sempre cautelosos em não onerar demasiadamente os tomadores e de não trazer riscos demasiados para as instituições financeiras.
Não foram momentos históricos fáceis.
Eis que, novamente, o crédito consignado surge como uma alternativa importante para superar um momento difícil. A referida medida provisória possibilitou que os elegíveis tenham acesso à um pouco mais de recursos (agora são 40%, ao invés de 35%, sendo que 5% continuam, exclusivos, para compras ou para saques por meio de cartão de crédito), com juros baixíssimos.
A ampliação da margem consignável, muito embora com data-limite para terminar (31/12/20), não somente possibilitará que o crédito desejado chegue com mais facilidade, mas também injetará recursos na economia, na luta pela retomada. A expectativa é que inúmeros Contratos sejam refinanciados e que novos surjam, movimentando esse mercado tão importante dentro da nossa realidade.
Deve-se, contudo, ter atenção para o fato de que ultrapassada a data-limite de vigência dessa margem de 35% temporária (31/12/20), novas contratações ficam vedadas, até que se tenha alguma brecha de margem, dentro do percentual original de 30%. O percentual de desconto, entretanto, continuará sendo aplicado com base nos 35%, até a conclusão dos empréstimos (refinanciados ou novos) lastreados na medida provisória.
O curioso é que a edição de tal medida provisória vai na contra-mão de uma série de desastrosas edições de leis estaduais e municipais (a grande maioria delas derrubadas pelo Poder Judiciário) que tentavam simplesmente criar o caos. Tentavam fazer com que os pagamentos dos empréstimos não acontecessem. De se imaginar o quão drástico poderia ter sido esse final.
Agora a intenção percorre a trilha do inverso.
Ao invés de uma moratória compulsória (destacando que algumas leis versavam que a suspensão dos pagamentos deveria perdurar enquanto a pandemia perdurasse – ou seja, sem prazo definido), os elegíveis (e invariavelmente estes não sofreram tanto os impactos da crise, eis que seus salários/proventos continuaram intactos) podem ter acesso à mais crédito. São os bons ventos, aparentemente, de volta.
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