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TRF-2 reconhece aproveitamento parasitário de elemento figurativo de marca da Xiaomi por ACX

O pano de fundo da discussão é a ação de nulidade proposta pela XIAOMI buscando anular registros marcários da empresa ACX, com base no inciso XXIII do artigo 124 da LPI.

24/9/2020

Via de regra, o registro de marca garante ao seu titular o direito de explorá-la exclusivamente em território nacional, impedindo terceiros de utilizá-la sem autorização. Com efeito, nos termos do artigo 129 da Lei de Propriedade Industrial – lei 9.279/96 (LPI) “a propriedade da marca adquire-se pelo registro validamente expedido, conforme as disposições desta Lei, sendo assegurado ao titular seu uso exclusivo em todo o território nacional”.

Ocorre que, se um terceiro obtiver um registro idêntico ao de marca alheia já utilizada e registrada anteriormente no exterior – mas ainda não registrada no Brasil – para identificar exatamente os mesmos serviços assinalados pela marca estrangeira, tal marca é passível de nulidade e seu uso pode ser coibido, nos termos do artigo 124, inciso XXIII da LPI.

Em recente acórdão proferido pela 1ª turma especializada do TRF-2ª região1, decidiu-se, de maneira unânime, por manter a decisão liminar que havia determinado a abstenção de uso e a suspensão de registros marcários de terceiro que reproduziam, integralmente, as marcas mistas da gigante de tecnologia XIAOMI, a despeito da anterioridade do registro do terceiro com relação aos registros da XIAOMI perante o INPI (link para a decisão).

O pano de fundo da discussão é a ação de nulidade proposta pela XIAOMI buscando anular registros marcários da empresa ACX, com base no inciso XXIII do artigo 124 da LPI2, que veda o registro de marca que reproduza marca anterior que o requerente não poderia deixar de conhecer em razão de sua atividade, mesmo que o titular seja empresa estrangeira.

Quase que concomitantemente com a ação de nulidade, a empresa ACX (que havia anteriormente notificado a XIAOMI) ingressou com ação na Justiça Estadual de São Paulo buscando impedir a XIAOMI de utilizar a sua marca no Brasil, com base na alegada anterioridade de um de seus registros no INPI para a marca figurativa MI, em configuração visual idêntica àquela utilizada pela empresa chinesa.

Na ação de nulidade proposta na Justiça Federal, foi concedida liminar em favor da XIAOMI3 e os efeitos dos registros marcários da ACX foram suspensos, assim como a ação de São Paulo4, que está suspensa até o desfecho da ação de nulidade.

No TRF-2ª região, o caso foi relatado pelo juiz Federal convocado Gustavo Arruda, tendo o Tribunal mantido a decisão liminar que suspendeu os registros marcários da ACX e determinou a abstenção do uso da marca figurativa MI pela referida empresa.

Entendeu-se que haveria risco de dano à XIAOMI – que poderia ser impedida de usar a sua própria marca – bem como que, apesar do registro anterior da ACX no Brasil – em 2012 –, a XIAOMI comprovou o uso e o registro de marca idêntica na China e em diversos outros países desde 2010 e que também já havia notícias na mídia brasileira mencionando as marcas da XIAOMI desde 2012.

O acórdão igualmente mencionou que a ACX não poderia alegar desconhecimento da marca da XIAOMI, pois, além do fato de as marcas serem idênticas (e não simplesmente semelhantes) em seu elemento figurativo, a XIAOMI seria conhecida internacionalmente e ambas as empresas atuam no mesmo segmento – venda de produtos eletrônicos:

Marca da XIAOMI utilizada desde 2010

Marca da ACX registrada no INPI

 

 

Na conclusão, a decisão menciona que o artigo 124, inc. XXIII da LPI, não exige a notoriedade da marca impeditiva na data do depósito tido como fraudulento, – o que seria a exigência do artigo 126 do mesmo diploma legal ao versar sobre marcas notoriamente conhecidas – mas sim a aferição da intenção de aproveitamento parasitário.

O acórdão em análise constitui um importante precedente para as empresas estrangeiras, principalmente do setor de tecnologia, que muitas vezes crescem em um ritmo exponencial. A XIAOMI é um claro exemplo de sucesso instantâneo que gera, como externalidade negativa, a atração de terceiros interessados em se apropriar de seus signos distintivos mundo afora. A decisão ora comentada demonstrou adequada sensibilidade a essa questão.

A interpretação do TRF2 com relação à aplicação do artigo 124, inc. XXIII, da LPI é muito importante para coibir que terceiros, de má-fé, depositem e obtenham marcas idênticas ou semelhantes, que já pertençam a empresas internacionais que, embora já conhecidas no país, possam não ter tido tempo hábil de proteger seus direitos de propriedade industrial, mas, nem por isso, devem ter suas marcas usurpadas por terceiros de maneira oportunista e, portanto, contrária à lei.

A XIAOMI é representada no Brasil pelo escritório Gusmão & Labrunie Propriedade Intelectual.

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1 TRF2. Agravo de Instrumento nº 5010145-71.2019.4.02.0000, Rel. Juiz Federal Convocado Gustavo Arruda Macedo, 1ª Turma Especializada, j. em 16/7/20.

2 Art. 124. Não são registráveis como marca: [...] XXIII - sinal que imite ou reproduza, no todo ou em parte, marca que o requerente evidentemente não poderia desconhecer em razão de sua atividade, cujo titular seja sediado ou domiciliado em território nacional ou em país com o qual o Brasil mantenha acordo ou que assegure reciprocidade de tratamento, se a marca se destinar a distinguir produto ou serviço idêntico, semelhante ou afim, suscetível de causar confusão ou associação com aquela marca alheia.

3 Em decisão da lavra da Dra. Caroline Somesom Tauk, da 31ª Vara Federal do Rio de Janeiro (Processo 5064006-92.2019.4.02.5101/RJ).

4 Em decisão exarada pela Dra. Renata Mota Maciel, da 2ª Vara Empresarial e de Conflitos de Arbitragem de São Paulo (Processo nº 1092241-06.2019.8.26.0100).

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*Marcos Chucralla Moherdaui Blasi é sócio do escritório Gusmão & Labrunie - Propriedade Intelectual.





*Jaddy Maria Alves Pereira Messias é advogada no escritório Gusmão & Labrunie - Propriedade Intelectual.

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