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Cuidados que as instituições de ensino devem adotar nos contratos de trabalho

Com a imperiosidade do home office durante a pandemia, escolas e faculdades precisam tomar alguns cuidados para evitar problemas trabalhistas

26/8/2020

O impacto socioeconômico causado pela pandemia de covid-19 é inédito para o mundo. Com base nesse novo e “normal” cenário, é preciso que as instituições de ensino sigam algumas dicas importantes relacionadas aos contratos de trabalho de professores para se prevenir de futuros problemas trabalhistas.

É preciso considerar, de início, que o trabalho de professores por meio de plataformas virtuais, trabalho remoto e/ou em home office deverá observar os parâmetros e fundamentos da disciplina do uso da Internet, previstos no artigo 2º da lei 12.965/14 (Marco Civil da Internet). Além disso, vale lembrar que a duração do trabalho permanece não superior a oito horas diárias e quarenta e quatro semanais.

Contrato

É de suma importância que essa relação seja formalizada preferencialmente por meio de negociação coletiva, acordo coletivo e por contrato de trabalho aditivo, com prazo determinado, prevendo especificamente sobre a responsabilidade pela aquisição, manutenção ou fornecimento dos equipamentos tecnológicos e da infraestrutura do trabalho remoto, bem como o reembolso de eventuais despesas a cargo do empregado, nos termos do art. 75-D da CLT, e demais aspectos contratuais pertinentes a esse tipo de prestação de serviços.

Equipamentos e infraestrutura

Será necessário também observar que os parâmetros de ergonomia física e condições de trabalho previstos na norma regulamentadora 17 (NR 17) sejam observados, em especial quanto aos equipamentos, mesas, cadeiras, a postura física, oferecendo ou reembolsando os valores dos bens necessários à garantia da integridade física.

Importante acrescentar que, ao corpo de docentes e alunos com deficiência sejam garantidos o acesso a todos os equipamentos, recursos de tecnologia assistiva e acessibilidade para que tenham condições plenas para aplicar e/ou acompanhar métodos e técnicas pedagógicas.

Adequação das atividades pedagógicas

Em relação à jornada contratual dos professores, deve ser observada a adequação das atividades pedagógicas à modalidade de teletrabalho e às plataformas virtuais, considerando tanto as atividades realizadas pelo meio digital, quanto o período de capacitação, adaptação ao novo modelo de trabalho, preparação do material a ser utilizado e de orientação e avaliação do aluno, de modo a não permitir jornadas de trabalho excessivas.

Na medida do possível, a instituição de ensino deve incentivar o aumento dos intervalos para repouso, seja na extensão do período ou na quantidade de intervalos, possibilitando, preferencialmente, um intervalo entre cada aula ministrada, devendo respectivos períodos de intervalo serem considerados como tempo de serviço para todos os efeitos.

Na hipótese de aulas gravadas, garantir remuneração equivalente àquela das aulas presenciais, observando-se a proporção de horas-aula na mesma proporção das aulas presenciais.

Direitos autorais

Para difusão do conteúdo em plataformas abertas, extracurriculares, em que sejam utilizados dados pessoais (imagem, voz, nome) ou material pedagógico produzido pelo profissional, é preciso que as instituições de ensino consigam consentimento prévio e expresso de professores para a reprodução das atividades.

Será necessário também alertar alunos, professores, responsáveis, supervisores e demais pessoas que tenham acesso à aula ou ao material dela decorrente da proibição de fotografar, gravar, registrar, compartilhar ou divulgar, por qualquer outro meio, a imagem ou a voz ou qualquer outro conteúdo autoral do professor, evitando o uso indevido de seus direitos autorais.

Horários para atendimento

As instituições devem orientar alunos, responsáveis, supervisores e diretores quanto aos horários que os professores poderão se dedicar a atender as questões relacionadas ao curso. É necessário assegurar os repousos legais, o direito à desconexão do corpo docente e a compatibilidade entre a vida familiar e profissional.

Para isso, as instituições devem estipular horários fixos, preferencialmente dentro do período da própria aula virtual, ou em plantão de dúvidas com horário específico e determinado, devidamente remunerado, evitando o uso de aplicativos como whatsapp, telegram, comunicação por celular, ou meios alternativos e sem horários definidos para atendimento dos alunos.

Cuidados com a saúde física e mental

Os empregados também precisam ser alertados, de maneira expressa, clara e objetiva, quanto às precauções que devem tomar, a fim de evitar doenças ocupacionais, físicas e mentais e acidentes de trabalho relacionados ao trabalho remoto.

Todos esses cuidados são importantes para evitar que este momento tão delicado e impactante economicamente acabe, no futuro, desencadeando um passivo trabalhista de grande monta.

Não é demais relembrar que a situação e a necessidade sejam analisadas individualmente, caso a caso, e que todas as alterações do trabalho presencial para o trabalho remoto e vice-versa sejam formalizadas por meio de Aditivo ao Contrato de Trabalho, o qual deverá prever e garantir a segurança jurídica necessária para o empregador.

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*Sérgio Ricardo do Nascimento Cardim é advogado do escritório Morais Andrade. Expert em relações sindicais e atua há 21 anos na área trabalhista, tanto no contencioso estratégico quanto no consultivo. Atende grandes empresas dos setores petrolífero, midiático, têxtil, logístico e de construção civil. É pós-graduado na PUC/SP em Direito e Processo do Trabalho.

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