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O tormentoso tema do FUNRURAL no STF

Em relação ao FUNRURAL a que está sujeito a Pessoa Física empregadora, o que exclui, portanto, a figura do segurado especial, existem quatro ações no Supremo sobre esse tema e uma Resolução do Senado.

9/7/2020

Na atualidade, talvez o FUNRURAL seja um dos temas mais controvertidos no Supremo Tribunal Federal (STF). E são vários motivos que deixam a matéria confusa. Há diferentes leis que regulam a matéria e, nesse sentido, temos de ter em mente que cada nova lei cria um “Funrural novo”. Também existem diversos tipos de sujeitos passivos, seja na categoria de contribuinte, seja igualmente como responsável. Como contribuinte, precisamos separar as decisões do Supremo que tratam sobre o empregador rural pessoa física daquelas que tratam da Agroindústria e ainda daquelas outras que digam sobre o empregador pessoa jurídica. Cada um desses contribuintes do FUNRURAL possui regras e normativas específicas, de modo que a manifestação do STF em relação a eles é específica e diz respeito a este cenário igualmente particular que estão tratando. Normalmente, a decisão de um FUNRURAL não se aproveita na íntegra para os demais. Por isso, é muito importante essa divisão da matéria. O mesmo se diga para a figura do adquirente, colocado como substituto tributário, na hipótese de compra de produtos diretamente do produtor rural pessoa física (empregador ou segurado especial).

Em relação ao FUNRURAL a que está sujeito a Pessoa Física empregadora, o que exclui, portanto, a figura do segurado especial, existem quatro ações no Supremo sobre esse tema (RE 363.852, RE 596.177, RE 718.874 e ADIn 4.395) e uma Resolução do Senado (RS 15/17).

No RE 363.852 (Mataboi), decidido em 03.02.10, o STF julgou a inconstitucionalidade do FUNRURAL instituído pelo art. 1º da lei 8.540/92. Esse julgamento gerou efeito inter-partes, tornando-se apenas um precedente não-vinculativo para as demais ações em curso. Os efeitos vinculantes e erga omnes da inconstitucionalidade do art. 1º da lei 8.540/92 só aconteceram com a Resolução do Senado 15/17 de 12.09.17. Esse ato político conferiu aos termos decididos no RExt 363.852 status de lei, sendo vinculante para todos os órgãos do judiciário e da Administração Pública.

O RE 596.177, julgado em 01.08.11 no regime de Repercussão geral, teve como resultado a inconstitucionalidade do art. 1º da lei 8.540/92, ou seja, só tratando do FUNRURAL na pessoa física empregadora rural definido nesse dispositivo. A repercussão geral concedida trouxe efeito vinculativo aos recursos sobrestados. Essa decisão e seus efeitos de repercussão geral foram de extrema importância para regular o período entre 01.08.11 e 12.09.17, quando finalmente foi expedida a Resolução do Senado 15/17. Todavia, a repercussão geral, diferentemente da Resolução do Senado, só beneficiou os contribuintes que ingressaram com ação no judiciário, questionando o FUNRURAL do art. 1º da lei 8.540/92. A desnecessidade de ação judicial só se consolidou em 12.09.17 com os efeitos erga omnes da Resolução do Senado 15/17.

Já o “novo” FUNRURAL da lei 10.256/01 veio a ser considerado no RE 718.874 (Tema 669) e na ADIn 4.395.

No RExt 718.874, julgado em 12.09.18, em regime de Repercussão geral, a comunidade jurídica recebeu com surpresa a decisão pela constitucionalidade da lei 10.256/01, julgando admissível a cobrança do FUNRURAL nos moldes da lei 10.256/01. Sendo interposto por produtor rural, a importante questão da sub-rogação não foi tratada pelo Supremo, deixando uma lacuna e um cenário de insegurança jurídica. Vale lembrar que a lei 10.256/01 não tratou sobre o tema e o novo regime atual da lei 13.606/18 também permaneceu silente quanto a sub-rogação do FUNRURAL, existindo verdadeiro vácuo legislativo sobre a matéria.

Ainda está pendente de julgamento a ADIN 4395, com relatoria do Min. Gilmar Mendes, faltando apenas o pronunciamento do Ministro Dias Toffoli. Os Ministros Edson Fachin, Rosa Weber, Ricardo Lewandowski e Celso de Mello votaram pela procedência da Ação, para declarar a inconstitucionalidade, com redução de texto, dos seguintes dispositivos: (I) art. 1º da lei 8.540/92, em relação à expressão “da pessoa física”, na parte em que altera o art. 25 da lei 8.212/91; (II) art. 1º da lei 9.528/97, relativamente à expressão “empregador rural pessoa física” na parte em que altera o artigo 25 da lei 8.212/91; e à expressão “da pessoa física de que trata a alínea ‘a’ do inciso V do art. 12”, nas partes em que alteram o artigo 30, IV e X, da lei 8.212/91; (III) art. 1º da lei 10.256/01, no que se refere à expressão “do empregador rural pessoa física, em substituição à contribuição de que tratam os incisos I e II do art. 22”, na parte em que altera o art. 25 da lei 8.121/91; e (IV) art. 9º da lei 11.718/08, no tocante à expressão “produtor rural pessoa física”, na parte em que altera o art. 30, XII, da lei 8.212/91; e do voto do ministro Marco Aurélio, que assentava a inconstitucionalidade do artigo 25 da lei 8.212/91, na redação conferida pela lei 10.256/01.

Contudo, o Supremo não se pronunciou quanto a subrrogação prevista nas leis 8.540/92 e 9.528/97, ambas sobre o art 30, IV, da lei 8.212/91, e revogadas nos julgamentos dos RExts 363.852 e 596.177. Da exegese dessa “colcha de retalho”, sobrou apenas a redação original do Art. 30, IV, da lei 8.212/91 que trata apenas do segurado especial, não se podendo falar, portanto, na sub-rogação do FUNRURAL da pessoa física empregadora rural, seja com base no art. 30, IV, da lei 8.212/91, seja ainda com base nas leis 10.256/01 e 13.606/18, que não trataram sobre o tema.

Com relação ao FUNRURAL devido pelas pessoas jurídicas e Agroindústrias, nenhuma das quatro decisões acima citadas lhes são aplicáveis. Esse tema no Supremo foi tratado em duas únicas ações, a saber, a ADIn 1.103/96 e o RExt 700.922 (tema 651).

Na ADIn 1.103/96, houve a declaração da inconstitucionalidade do art. 25, §2º, da lei 8.870/94, tratando sobre o FUNRURAL devido pelas Agroindústrias. Logo, o caput do art. 25, da lei 8.870/94, sobre o FUNRURAL da pessoa jurídica empregadora, ficou de fora da inconstitucionalidade declarada. Enquanto ADIN, a decisão ali tomada teve efeito erga omnes, vinculando judiciário e administração pública.

Finalmente, o RE 700.922 (Tema 651) de relatoria do min. Marco Aurélio, ainda em andamento, tratou do art. 25, inc. I e II, da lei 8.870/94. Ou seja, decidirá quanto ao FUNRURAL instituído por esta lei para a PJ empregadora rural. Teve sua repercussão geral reconhecida em 09.05.13.

Assim, verifica-se que os FUNRURAIS das leis 10.256/01 e 8.870/94 ainda estão em debate tanto na ADIn 4.395 (em relação à PF empregadora) quanto no RExt 700.922 (Tema 651) (em relação à PJ empregadora). Não existe ação em curso junto ao Supremo quanto ao FUNRURAL da lei 13.606/18.

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*Florence Cronemberger Haret Drago é pós-doutora pela USP. Sócia fiscal do escritório Nogueira, Haret, Melo e Maroli Advogados (NHM Advogados).

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