Migalhas de Peso

Crimes tributários em tempos de pandemia

O crime tributário só existe quando há intenção de se beneficiar indevidamente, reduzindo, suprimindo ou se eximindo de pagamento de tributo de maneira fraudulenta ou de outra forma ilícita.

7/7/2020

É inegável que os problemas de saúde pública gerados pela covid-19 culminaram em uma crise econômica, atingindo diversos setores. A queda de faturamento das empresas faz com que sejam procuradas alternativas para que se mantenham funcionando. Além de medidas trabalhistas que permitem, por exemplo, a suspensão de contratos de trabalho ou redução de salários, analisa-se a possibilidade de postergação de pagamentos de obrigações tributárias, como se verifica da resolução CG SN 154/20 da Receita Federal Brasileira, que permite tal medida no Simples Nacional. Sendo assim, as dificuldades financeiras causadas pela pandemia poderiam justificar o inadimplemento tributário e afastar a responsabilidade penal de seus administradores? A resposta aparenta ser positiva.

O crime tributário só existe quando há intenção de se beneficiar indevidamente, reduzindo, suprimindo ou se eximindo de pagamento de tributo de maneira fraudulenta ou de outra forma ilícita. Dessa forma, caso a ausência de pagamento se dê porque existe uma crise financeira real sendo enfrentada – e esta deve ser devidamente comprovada – parece que não existe intenção de lesionar o fisco, inexistindo elemento necessário para configurar o crime. Ainda, não é novo o entendimento nos Tribunais de que em situações extremas, quando o pagamento do tributo pode ter por consequência o fechamento em definitivo da empresa (o que exige comprovação), o inadimplemento não caracteriza crime por inexigibilidade de conduta diversa. Nesse sentido: “as graves dificuldades financeiras enfrentadas pela pessoa jurídica para adimplir a obrigação tributária constituem causa excludente de culpabilidade por inexigibilidade de conduta diversa, desde que comprovadas nos autos”1. O momento de fragilidade econômica enfrentado em razão da pandemia, portanto, parece se enquadrar nessa hipótese – desde que, repita-se, devidamente comprovada nos autos a situação concreta do contribuinte.

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1 TRF4, Apelação Criminal 5003124-10.2017.4.04.7000, 8ª T., Rel. João Pedro Gebran Neto, J. 26.09.18, DJe 28.09.18.

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*Victoria de Barros e Silva é advogada e membro do Escritório Professor René Dotti.

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