Os reflexos da crise provocados pelo covid-19 recaíram sobre as diversas esferas da sociedade. Nesse contexto acarretou a insegurança jurídica de um modo geral e no que tange aos contratos educacionais estabelecidos entre pais ou universitários e as instituições educacionais, que ficaram bastante evidentes.
O ano letivo foi diretamente impactado pelo coronavírus. As aulas passaram a ser na modalidade à distância, porém, restou a dúvida acerca das mensalidades: quais direitos sobre esta situação? Nota-se que não há um consenso acerca dos contratos educacionais, e na ausência de uma regularização específica sobre a questão atual de pandemia. Escolas e consumidores precisam trabalhar o diálogo em busca de um acordo pautado na boa-fé objetiva, bom senso, razoabilidade e proporcionalidade fazendo uso dos meios consensuais de resolução de conflitos.
Há uma discussão ocorrendo acerca do que a pandemia representa; se caracteriza caso fortuito ou força maior, e que tais teorias emanadas do Código Civil pautassem a relação de consumo. Porém, com respeito aos juristas, que assim compreende, ouso discordar, vez que o art 393 do Código Civil prevê que não se responsabiliza o devedor pelos prejuízos advindos de caso fortuito ou força maior, quando expressamente não houver por eles responsabilizado. Isso significa que o caso fortuito ou força maior representam uma exclusão de responsabilidades.
Outro princípio que vem sendo utilizado para defender a tese é o da teoria da imprevisão, previsto no art. 317 do Código Civil em que assim discorre: “quando, por motivos imprevisíveis, sobrevier desproporção manifesta entre o valor da prestação devida e o do momento de sua execução, poderá o juiz corrigi-lo, a pedido da parte, de modo que assegure, quanto possível, o valor real da prestação”. De acordo com esta teoria, sua aplicação aos contratos seria viável caso o fato extraordinário e imprevisível gerador da desproporcionalidade não esteja afiançado objetivamente pelos riscos inerentes à contratação. Desse modo, a consequência dessa hipótese seria a possibilidade de uma revisão judicial do contrato.
Há ainda outra teoria que usada para respaldar os contratantes, ensejando a rescisão dos contratos, seria a teoria da onerosidade excessiva, amparada pelo art. 478 e seguintes também do Código de Processo Civil que assim determina: “Nos contratos de execução continuada ou diferida, se a prestação de uma das partes se tornar excessivamente onerosa, com extrema vantagem para a outra, em virtude de acontecimentos extraordinários e imprevisíveis, poderá o devedor pedir a resolução do contrato”.
Contudo, quando se trata de contrato educacional, deve-se lembrar que a atividade desempenhada por rede de ensino é caracterizada pela prestação de serviço com previsão no Código de Defesa do Consumidor e o CDC estabelece princípios norteadores das relações de consumo. Estes princípios resguardam o consumidor na condição de hipossuficiência atribuindo ao fornecedor a responsabilidade civil objetiva. Inclusive, prepondera o princípio da boa-fé objetiva, transparência e informação e proibição das cláusulas abusivas.
Ao CDC é relevante o fato gerador das alterações que sejam suficientes para provocar a modificação do ambiente econômico incialmente existente no ato do contrato. Se comprovada essa alteração, será adotada a teoria do rompimento da base objetiva no negócio jurídico.
Nesse contexto, cabe destacar um fato recente que se tornou precedente ocorrido no Estado de São Paulo, em que uma estudante interpôs agravo de instrumento contra decisão que indeferiu o pedido de tutela de urgência em que solicitava autorização junto à instituição de ensino que pagasse apenas o proporcional a 50% do valor da mensalidade escolar.
Diante desse caso, a Acadêmica alega que, em virtude da pandemia se encontra em crise financeira e defende a desproporcionalidade quando da exigência de pagamento integral das prestações mensais do contrato. O desembargador Campos Petroni, da 27ª Câmara de Direito Privado do TJ/SP, lhe concedeu tutela de urgência autorizando a redução de mensalidade de curso superior para a proporção de 30%. O desembargador analisou os fatos e reconheceu a desproporção entre o quatum mensal a que se obrigara a autora, quando foi celebrado o contrato de prestações de sérvios educacionais e o momento da execução.
Então, pautado pela boa-fé, percebe-se que a ausência na prestação de serviços de acordo com o que foi pactuado por parte das instituições de ensino, somado aos impactos econômicos provocados pela Pandemia aos consumidores, é devido à ambas as partes chegarem a um acordo que beneficie os dois lados. O desconto na mensalidade, portanto, é uma medida que deve ser adotada pelas instituições de ensino.
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*Jaime Pereira de Souza é parceiro do escritório DASA Advogados.