Dentre os inúmeros prejuízos econômicos suportados por empresas contratadas pela Administração Pública no decorrer da pandemia da covid-19, verifica-se a grande oscilação da variação cambial (do dólar, em particular) impactando no preço de produtos e serviços que sofram consequências da oscilação da moeda americana. Nos últimos meses, a cotação do dólar tem aumentado de forma significativa e alcançado valores recordes, tendo atingido patamar próximo aos R$ 6,00 (seis reais).
Para que o ônus dessa variação cambial não seja suportado somente pela parte contratada, impõe-se a avaliação das hipóteses nas quais seja possível a revisão de tais contratos administrativos com fundamento na variação cambial, para que seja reestabelecido o equilíbrio econômico-financeiro.
O reequilíbrio do contrato administrativo poderá ser pleiteado pela parte interessada com base na Constituição Federal de 1988, artigo 37, inciso XXI, e artigo 65, inciso II, alínea d, da lei 8.666/1993. Para que se justifique o reequilíbrio econômico-financeiro, as alterações de custo deverão ser supervenientes à assinatura do contrato, imprevisíveis, portanto, no ato da assinatura.
Nesse sentido, para que seja cabível o pleito de reequilíbrio econômico-financeiro pelo contratado, conforme entendimento do TRF-4 - apelação cível 5009519-68.2015.404.7200 - exige-se o preenchimento cumulativo dos seguintes requisitos: a) elevação dos encargos do particular; b) ocorrência de evento posterior à apresentação da proposta; c) vínculo de causalidade entre o evento ocorrido e a majoração dos encargos da empresa; e d) imprevisibilidade da ocorrência do evento.
Especificamente em relação à variação cambial, há de se ter em mente que, dentro de um regime de câmbio flutuante (como ocorre atualmente no Brasil), é o mercado que fixa, livremente, o valor da taxa de câmbio. Por isso, é natural haver oscilações que devam ser suportadas pelas partes, visto que oscilações usuais são inerentes ao risco da atividade empresarial, não servindo de fundamento para reequilíbrio.
Dessa forma, o TCU, conforme entendimento exposto no acórdão 1431/2017, decidiu que a mera variação de preços ou flutuação cambial não é suficiente para a realização de reequilíbrio econômico-financeiro do contrato, ou seja, não pode ser considerada suficiente para, isoladamente, fundamentar a necessidade de reequilíbrio econômico financeiro do contrato, salvo casos excepcionais.
Assim, entendeu o TCU que, para haver a adequação contratual com base em variação cambial, é necessário que a oscilação imponha onerosidade excessiva a uma das partes e impeça a execução do serviço contratado ou advenha de um fato com consequências incogitáveis. Infere-se que, cumpridas tais condicionantes, a variação cambial possa embasar a aplicação da teoria da imprevisão e a consequente possibilidade de se reestabelecer o equilíbrio financeiro do contrato.
Por fim, a 1º turma do STJ, em 20 de fevereiro de 2018, julgou o REsp 1433434/DF e reconheceu que o incontestável desequilíbrio decorrente de imprevisível variação cambial configura situação econômica extraordinária e extracontratual de que trata o art. 65, II, d, da lei 8.666/93.
Com isso, em tais hipóteses excepcionais, a variação cambial pode, sim, servir de fundamento para que partes contratadas que foram excessivamente oneradas devido à grande oscilação cambial causada pela pandemia realizem pleitos de reequilíbrio de contratos administrativo. Isso com respaldo tanto da legislação aplicável quanto nas jurisprudências apontadas.
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*Fábio de Possídio Egashira é integrante do Trigueiro Fontes Advogados.
*Rodrigo da Fonseca Chauvet é integrante do Trigueiro Fontes Advogados.
*Ivana Eduarda Dias Arantes é integrante do Trigueiro Fontes Advogados.
*Vinícius Loureiro Anselmé é integrante do Trigueiro Fontes Advogados.